Título: A China vai quebrar?
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Fonte: O Globo, 20/12/2011, Economia, p. 27
Considere o seguinte cenário: o crescimento recente foi sustentado pelo tremendo boom do setor da construção civil, estimulado pelos preços crescentes do mercado imobiliário, e com os sinais clássicos de uma bolha. Houve um rápido crescimento da oferta de crédito — com parte desse crescimento sendo realizado não por meio do sistema bancário tradicional, mas por um sistema nebuloso, sem supervisão ou garantias oficiais. Agora, a bolha estourou — e há razões concretas para se temer uma crise financeira e econômica.
Isso parece uma descrição do Japão do fim dos anos 1980? Ou dos EUA em 2007? Até poderia ser. Mas, neste momento, estou me referindo à China, que emerge como uma nova ameaça a uma economia mundial que realmente não precisa passar por isso.
Relutei em pesar a situação chinesa, em parte porque é muito difícil saber o que realmente está acontecendo. Toda estatística econômica é, na melhor das hipóteses, uma forma singular de ficção científica enfadonha, mas os números chineses são mais ficcionais que os da maioria. Busquei especialistas em China, mas não há dois deles com a mesma percepção.
Mesmo assim, os números oficiais são perturbadores — e as notícias mais recentes são suficientemente dramáticas para soar o alarme.
A coisa mais extraordinária sobre a economia da China na última década foi a forma como o consumo das famílias, embora crescente, ficou atrás do crescimento geral. Neste momento, os gastos dos consumidores são apenas 35% do PIB (Produto Interno Bruto), cerca de metade do nível dos EUA.
Então, quem está comprando os produtos e os serviços que a China produz? Parte da resposta é: nós estamos. À proporção que a fatia do consumo na economia caía cada vez mais, a China se apoiava em superávits comerciais para sustentar sua indústria. Mas a grande história do ponto de vista da China são os investimentos, que saltaram para quase metade do PIB.
A questão incontornável é: com a demanda do consumidor relativamente baixa, o que motivou todo aquele investimento? E a resposta é: a inflacionada bolha do mercado imobiliário. Os investimentos no setor imobiliário praticamente dobraram em relação ao PIB desde 2000, representando mais da metade do aumento total em investimento. E o resto do aumento veio de firmas que expandiram para vender para o emburguesado setor da construção civil.
O caso exibe todos os sinais de uma bolha: não apenas pelos preços em alta, mas também pelo tipo de febre especulativa bem familiar à experiência americana de anos atrás. Agora, a bolha está visivelmente explodindo. Qual será o tamanho do prejuízo que ela causará à economia chinesa — e mundial?
Analista dizem que não há motivo para preocupação, que os líderes chineses farão o que for necessário para lidar com o problema. Espero estar sendo alarmista. Mas é impossível não se preocupar: o caso chinês soa muito familiar a colapsos que já tivemos.
PAUL KRUGMAN é colunista do “New York Times”. Tradução de Paulo Thiago de Mello