Título: Cartão vermelho para coronel
Autor:
Fonte: O Globo, 20/12/2011, Rio, p. 14

Ex-árbitro da Fifa, comandante do batalhão de São Gonçalo é preso acusado de corrupção

O CORONEL Djalma Beltrami, à paisana, é levado à sede da Divisão de Homicídios de Niterói em carro da Corregedoria Interna da Polícia Militar

Ana Cláudia Costa, Célia Costa e Herculano Barreto Filho granderio@oglobo.com.br

Há apenas três meses à frente do comando do 7º BPM (São Gonçalo), o coronel Djalma Beltrami foi preso ontem acusado de receber propina de bandidos para não reprimir o tráfico de drogas no Morro da Coruja, em São Gonçalo. O oficial substituiu em agosto passado o tenente-coronel Cláudio Luiz Silva de Oliveira com a missão de moralizar o batalhão de São Gonçalo, de onde eram os dez PMs denunciados pela morte da juíza Patrícia Acioli, ocorrida em agosto. Oliveira foi preso em setembro em acusado de ser o mentor do assassinato da magistrada. Beltrami, que recebeu voz de prisão no batalhão, negou todas as acusações.

Além de Beltrami — que fez carreira como árbitro profissional da CBF e da Fifa — a operação Dezembro Negro desencadeada durante a manhã pela Divisão de Homicídios (DH) de Niterói, com o apoio da Corregedoria Geral Unificada (CGU) e do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público Estadual, prendeu outros seis PMs do batalhão de São Gonçalo e nove suspeitos de tráfico, um deles menor de idade. Um dos presos é Bruno Rafael Viviane da Silva, o vocalista dos grupos de pagode Sempre Razão e Samba Diferente — que se apresentam em Niterói e São Gonçalo.

Polícia Militar demonstra cautela

O secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, disse ter ficado aborrecido com o fato, mas cobrou investigação:

— Nenhuma instituição pública do Rio está cortando mais na própria carne do que a polícia. Não importa se o desvio de conduta foi cometido por um servidor militar ou civil. Tudo precisa ser investigado.

A Polícia Militar, por sua vez, preferiu não se pronunciar sobre a prisão do comandante do 7º BPM. Por meio de nota, explicou que deixará “de se posicionar” sobre Beltrami “até que sejam esclarecidas as circunstâncias e a motivação da prisão temporária”. A PM informou ainda que a corregedoria da corporação vai pedir cópias da documentação e dos grampos telefônicos divulgados ontem pela imprensa.

De acordo com o delegado titular da DH de Niterói, Alan Luxardo, há provas contundentes, após escutas telefônicas autorizadas pela Justiça, de que o coronel Djalma Beltrami tinha ciência da corrupção e recebia propinas de traficantes. Segundo o delegado, foi gravado um telefonema em que militares do batalhão conversam com o chefe do tráfico no Morro da Coruja, em São Gonçalo, identificado como Gaguinho. Luxardo conta que os militares na gravação pediam R$10 mil que seriam entregues ao “zero um” — maneira como se referem ao comandante do batalhão, segundo a investigação — e o restante para os integrantes do Grupamento de Ações Táticas, o GAT. Ao todo, segundo o delegado, os PMs recebiam até R$160 mil por mês do tráfico de drogas.

As investigações começaram há sete meses. Segundo o promotor Marcelo Arsênio, do Gaeco, a droga era levada das favelas Parque União, Nova Holanda e Manguinhos, no Rio, para o Morro da Coruja, que funcionava como um entreposto. Dessa comunidade, o entorpecente era enviado, segundo a DH, para São Pedro da Aldeia, de onde é distribuído para Búzios, Cabo Frio e Arraial do Cabo. Durante as investigações, descobriu-se a ligação de PMs com traficantes do Morro da Coruja.

Ao todo foram expedidos 13 mandados de prisão para PMs e 11 para traficantes de São Gonçalo. Entre os policiais que tiveram a prisão expedida, dois já estavam na cadeia. Todos estão com prisão temporária de 30 dias e responderão por tráfico de drogas, associação para o tráfico e corrupção. Segundo o delegado Alan Luxardo, várias negociações feitas pelo GAT do 7º BPM foram feitas em setembro, quando o comandante da unidade já era o coronel Beltrami:

— Eles pediam dinheiro para o coronel utilizando outros telefones que não os deles. Mas, mesmo assim, conseguimos comprovar a participação de policiais no recebimento de propinas, inclusive com a localização de viaturas no morro através do GPS.

A ação policial começou por volta das 6h e contou com cerca de cem policiais civis. No Morro da Coruja, foram apreendidos material para embalardroga, maconha, cocaína e um revólver. O coronel Djalma Beltrami foi preso logo no início da manhã, assim que chegou ao batalhão. Ele saiu do quartel sem farda e foi levado para a Divisão de Homicídios de Niterói em um carro da Corregedoria da PM.

O advogado de Beltrami, Marcos Espínola, informou que entrará com o pedido de revogação da prisão por considerar que não há indícios do envolvimento do coronel.

oglobo.com.br/rio