Título: No lado externo, déficit maior da História
Autor: Tavares, Mônica
Fonte: O Globo, 21/12/2011, Economia, p. 29

Resultado surpreende BC. Empresas elevam remessas para compensar prejuízos lá fora

BRASÍLIA. Os números de novembro das contas externas, apurados pelo Banco Central (BC), deixam claro que a crise financeira global já chegou ao Brasil. Com o recrudescimento da turbulência, empresas e investidores estrangeiros instalados no país se viram obrigados a enviar mais dinheiro ao exterior para cobrir seus prejuízos lá fora. Só as remessas de lucros e dividendos mais que dobraram em relação a novembro de 2010, totalizando US$4,2 bilhões, um recorde para o período. A crise também se reflete no comércio exterior, que já está mais fraco e sinaliza que, em 2012, as exportações serão vilãs do balanço de pagamentos.

Estes são os principais fatores por trás do déficit de US$6,8 bilhões nas chamadas transações correntes - o saldo das operações realizadas com o exterior em comércio, serviços e investimentos - no mês passado, o pior desempenho para novembro desde 1947. O indicador surpreendeu o próprio BC, que esperava um saldo negativo 20% menor para o período.

O movimento não se restringiu a lucros e dividendos. Na conta de capital do balanço, que registra o fluxo de investimentos produtivos e financeiros no Brasil e forma com a conta corrente o balanço de pagamentos, também houve saques significativos. Foi o caso do US$1,7 bilhão obtido no mercado de ações e títulos de renda fixa e dos US$2,7 bilhões do retorno dos investimentos diretos no setor real da economia, respectivamente 192,7% e 71,5% superiores às remessas dessas rubricas no mesmo período de 2010.

As viagens internacionais também prejudicaram o resultado das contas externas em novembro. Embora o ritmo de crescimento tenha diminuído nos últimos meses, os brasileiros continuam gastando como nunca no exterior. No mês passado, foram US$977 milhões, levando o acumulado de 2011 a US$13,2 bilhões, 41% a mais que no ano passado.

Esse saldo prejudica a conta de serviços, já pressionada pelos gastos do país com o aluguel de máquinas, equipamentos e veículos trazidos do exterior para ampliar a indústria nacional. O Brasil importa cada vez mais serviços do que exporta. Só este ano, o déficit na conta de serviços bateu, até novembro, US$34 bilhões. No ano todo de 2010, foram US$30 bilhões.

- Houve um aumento importante de máquinas, equipamentos e veículos, principalmente do setor da indústria de extração mineral - disse o chefe do Departamento Econômico do BC, Tulio Maciel.

Em novembro, os investimentos estrangeiros diretos (IED) não conseguiram cobrir o rombo mensal, ao somarem US$4 bilhões, deixando o balanço de pagamentos no vermelho. No ano, porém, continuam robustos e cobrindo a conta corrente com folga: US$60 bilhões, recorde na série histórica iniciada em 1991 e praticamente o dobro do mesmo período de 2010.

A entrada desses recursos deve somar em 2011 US$65 bilhões, e não mais os US$60 bilhões estimados anteriormente. O BC passou a contar, ao contrário, com um déficit nas transações correntes menor: US$53 bilhões, no lugar de US$54 bilhões.

Para 2012, o cenário é bem menos animador. O BC estima que o déficit corrente cresça US$12 bilhões, atingindo US$65 bilhões. O principal responsável pela deterioração nas contas externas devem ser as exportações. Pelas contas do BC, a balança teria um superávit de US$23 bilhões em 2012, US$5 bilhões abaixo do previsto para este ano. As exportações devem somar US$267 bilhões, contra US$256 bilhões de 2011.

Para a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) o cenário é ainda mais sombrio. Sua projeção de superávit é de apenas US$3 bilhões, 88,7% menos que este ano. As exportações devem ficar em US$236,580 bilhões, uma redução de 7,2%.

Tombini espera mais crescimento e menos inflação no ano que vem

Apesar do cenário das contas externas, o presidente do BC, Alexandre Tombini, afirmou que espera em 2012 mais crescimento e menos inflação. Em audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, ele afirmou que a inflação já está em patamares compatíveis com a meta central de 4,5%:

- Depois de termos aquela parede inflacionária de outubro de 2010 a abril de 2011, com média mensal de 0,77%, essa inflação já se reduz em maio, e a média está em campo mais compatível (com a meta), na faixa de 0,38%, o que é 4,6%, 4,7% anualizado.

Tombini disse ainda que o crescimento deve se acelerar, especialmente no segundo semestre de 2012. Ele acredita que, apesar do cenário internacional de crise, o Brasil pode "transitar nesse ambiente sem sacrificar o crescimento sustentável nos próximos anos".

Apesar de esperar queda do IPCA, ele não quis ser taxativo sobre se isso abre espaço para quedas maiores dos juros daqui para frente. Tombini disse ainda que uma "desaceleração suave" da economia chinesa deve até fazer bem ao Brasil, já que a pressão sobre os preços das commodities será menor.