Título: Passaporte para encontro da elite em Davos pode custar mais de US$500 mil
Autor: Scofield Jr., Gilberto
Fonte: O Globo, 18/12/2011, Economia, p. 42

Apesar da força do Fórum, Brasil mandará poucos executivos de alto escalão

A "MONTANHA Mágica" de Davos: sob um frio de 20 graus negativos, reuniões de trabalho e dezenas de estudos de caráter econômico

SÃO PAULO. No próximo dia 25 de janeiro, quando os principais representantes das maiores corporações, governos, universidades, institutos de pesquisa e organizações não governamentais do planeta se reunirem para o encontro anual do Fórum Econômico Mundial (FEM), na pequena cidade de Davos, na Suíça, muita gente se mostrará ávida para saber o que pensa a elite mundial - ironicamente reunida no coração da Europa - sobre a viabilidade do euro ou como a União Europeia enfrentará os desafios de governos deficitários. Pela região, manifestantes farão barulho chamando a atenção para o imperativo das primaveras que se espalharam da Praça Tahir a Wall Street, pedindo mais inclusão e empregos.

Esta é a face mais visível do encontro, que acontece aos pés da "Montanha Mágica", de Thomas Mann. Mas sob um frio que muitas vezes chega aos 20 graus negativos, a movimentação em Davos é bem menos óbvia. Durante os quatro dias do encontro, cafés da manhã, almoços e jantares se tornam o momento ideal para fechar parcerias de negócios. Nas cerca de 30 salas do Centro de Convenções, estudos exclusivos circulam entre privilegiados. Mesas redondas espalhadas pela cidade reúnem especialistas e empresários, que buscam antecipar macrotendências. E até nas disputadas festas - as chamadas night caps - redes de contatos (no jargão dos executivos, o networking) são cuidadosamente tecidas.

Exatamente por isso, dizem os executivos e empreendedores brasileiros que há anos participam do encontro, o pesado investimento para ser um Davoman se justifica em cada centavo. Afinal, Davos não é uma reunião de gerentes de fábrica, mas de presidentes, vice-presidentes, presidentes de conselho de administração e seus braços direitos, pessoas com os lemes das corporações nas mãos. O economista alemão Klaus Schwab, de 73 anos, fundador e presidente do FEM, costuma dizer que, para uma empresa ser um membro do FEM (não há membros ou parceiros pessoas físicas), é preciso que fature ao menos US$5 bilhões.

Empresários com negócios nebulosos ficam de fora

Na prática, esse é um patamar para países ricos. Entre os emergentes, a exigência é flexibilizada. Além disso, um grupo de organizadores regionais do FEM - gente que ajuda a selecionar as personalidades locais que vão participar dos encontros - influencia a decisão de Schwab e sua equipe (são 400 no total) no convite a este ou aquele empresário local. Não chega a carregar a subjetividade fútil das bolas pretas de convescotes em clubes fechados, como o Country, no Rio, ou o Paulistano, em São Paulo. Mas empresários de negócios nebulosos ou gente encrencada na Justiça são sutilmente desconvidados.

- Nos anos 90, os organizadores nos enviaram um lista de nomes que incluía o do controverso usineiro Jorge Wolney Atalla, ex-presidente da Copersucar. Nós vetamos - diz um antigo colaborador de Schwab.

Mas quanto custa ser um Davoman? Para ser membro, a empresa tem de desembolsar 50 mil francos suíços por ano (US$53,4 mil). O valor equivale à taxa de associação (US$34,1 mil) e mais 18 mil francos suíços (US$19,2 mil) por passe para reuniões gerais do Fórum. Estes valores incluem o acesso às reuniões plenárias em Davos, aos encontros regionais (há vários, inclusive na América Latina) e a todos estudos e eventos especiais do Fórum. Se o executivo deseja fazer parte das reuniões setoriais e se encontrar com executivos top de empresas concorrentes ou parceiras no setor, deve se tornar uma "indústria associada" e pagar quase US$160 mil.

Todos os membros que desejam levar um acompanhante à reunião devem mudar o nível de associação para "indústria parceira". O valor novo da associação é US$266,7 mil, com os dois passes necessários para entrar nas reuniões gerais. Por fim, se a empresa quer levar um grupo de até cinco executivos, terá que mudar o tipo de associação para "parceiro estratégico". Isso custa US$533 mil. Estes dois últimos níveis dão um privilégio a mais: as empresas podem sugerir temas que gostariam de ver debatidos nos encontros.

Executivos têm ônibus à disposição nos hotéis

Os valores não incluem despesas com hospedagem e alimentação, mas o Fórum fornece um serviço gratuito de ônibus que circulam em horários fixos entre os hotéis e o Centro de Convenção. Parece caro?

- Parece, mas a oportunidade de debater questões estratégicas e macrotendências de longo prazo com as pessoas que efetivamente definem os rumos das economias compensa muito o investimento - diz Frederico Curado, presidente da Embraer, "parceira" desde 2009.

- O custo é elevado, mas não estamos falando apenas das redes de conhecimento. Ali, as empresas têm acesso a estudos estratégicos e a opinião de autoridades com exclusividade. É investimento - diz o ex-presidente da CVM Roberto Teixeira da Costa, que durante três anos compareceu a Davos como membro do Conselho de Administração da Sul América Seguros.

- É um visão equivocada considerar Davos um mero clube de ricos - diz o escritor Paulo Coelho, membro do conselho da Fundação Schwab e frequentador do Fórum desde 1997. - Já vi grandes negócios e alianças políticas serem fechados ali.

Membros de ONGs, empreendedores, palestrantes e governos não pagam e para esses, estar em Davos é ainda mais importante.

- A experiência de networking, o acesso a informações estratégicas, os debates sobre as grandes tendências, tudo é em nível altíssimo - diz Rodrigo Baggio, fundador do CDI e eleito "jovem liderança" pela Fundação Schwab, destinada a promover o empreendedorismo.

As taxas de adesão das empresas variam de 50 mil francos suíços (US$53,3 mil) a 500 mil francos suíços (US$533 mil, parceiros estratégicos). São taxas anuais e não se referem somente ao encontro anual. Também incluem acesso a encontros e atividades regionais, grupos de trabalho e eventos setoriais.

Apesar do poder de Davos de pautar a agenda econômica do planeta, só seis empresas brasileiras mandarão executivos. Além de Curado (Embraer), vão o presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli; o presidente da Braskem, Carlos Fadigas; o herdeiro e diretor da Suzano Daniel Feffer; o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco; e o herdeiro e executivo responsável pela América Latina do Itaú Unibanco, Ricardo Villela Marino.