Título: Nas áreas irregulares, taxa de analfabetismo dobra
Autor:
Fonte: O Globo, 22/12/2011, O País, p. 12

Entre pessoas de 15 anos ou mais de idade, o indicador chega a 8,4%; nas demais regiões, é 4,2%

RECIFE e RIO. Aos 61 anos, Josefa Aleixo da Conceição engrossa as estatísticas dos que não sabem ler nas favelas brasileiras, onde, segundo pesquisa divulgada ontem pelo IBGE, a taxa de analfabetismo no grupo de 60 anos ou mais é de 31,2%, muito mais elevada do que os 12,9% registrados entre os moradores das áreas urbanas regulares.

Ela nasceu no município de Lagoa do Carro, na Zona da Mata. Chegou a frequentar a escola quando menina, mas nunca aprendeu, sequer, a assinar o nome:

- Fui muitos anos à escola, mas nunca aprendi nada. Então, desisti. Hoje não saio só de casa, porque não sei ler o letreiro dos ônibus, tenho medo de me perder.

Josefa mora na favela Caranguejo Tabaiares, no bairro de Afogados, que foi erguida no mangue do Rio Capibaribe, onde as condições de vida são precárias. Ela tem água encanada, luz elétrica, mas esgoto não existe. Para usar a latrina, no fundo do quintal, é tão difícil não sujar os pés nos dejetos que ela prefere atravessar a rua e usar o banheiro da cada de uma de suas filhas.

- Aqui está horrível. Estou juntando um dinheiro para poder usar o banheiro com mais conforto - diz.

Segundo o IBGE, a taxa de analfabetismo de pessoas de 15 anos ou mais de idade que moram em aglomerados subnormais é de 8,4%, o dobro da registrada em áreas urbanas regulares (4,2%). Doutora em Educação e professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Bertha do Valle avalia que a disparidade do indicador em relação ao lugar de moradia aponta para a falta de investimento no setor.

- Os dados mostras uma desigualdade grande no acesso à educação. A gente luta há muitos anos e continua querendo 10% do PIB em educação, mas o Novo Plano Nacional de Educação prevê 7%. Se não melhorar a aplicação desses recursos nessas áreas subdesenvolvidas, esse quadro não vai mudar. Além disso, os professores não estão preparados para trabalhar nessas áreas, geralmente conflagradas, em lugares muito difíceis de trabalhar. Também há prédios caindo aos pedaços, professores recém-formados, pouco envolvimento com a comunidade .

O perfil da população em assentamentos irregulares, segundo o IBGE, revela também que apenas 4,6% desses habitantes têm o rendimento nominal mensal domiciliar per capita de mais de dois salários mínimos, percentual bem menor do que os 27,1% dos registrados nas demais áreas urbanas. E que, nesses locais, há predominância de pessoas identificadas como pretas e pardas (68,4%). Além disso, a população é mais jovem do que a encontrada em áreas urbanas regulares. A faixa de zero a 14 anos, por exemplo, representa 28,3% do total encontrado nos aglomerados subnormais, ante 21,5% das demais regiões da cidade.

COLABORARAM: Karine Rodrigues e Rafael Galdo)