Título: Copa: o êxito depende dos brasileiros
Autor:
Fonte: O Globo, 23/12/2011, Opinião, p. 7
RICH MKHONDO
No Brasil, assim como na África do Sul, o futebol é uma paixão nacional. Investe-se muito capital emocional nesse esporte. Em minhas visitas tenho visto que, como na África do Sul, o futebol é o ópio das massas.
Como os brasileiros se preparam para sediar a próxima Copa do Mundo da Fifa daqui a três anos, existem semelhanças importantes nos desafios enfrentados pela nação sul-americana com aqueles que a África do Sul enfrentou.
Como a África do Sul antes da Copa do Mundo, o Brasil enfrenta percepções negativas sobre sua taxa de criminalidade, especialmente se estendendo aos bairros pobres; dúvidas se os estádios estarão concluídos a tempo e se o país deveria esperar uma arrecadação financeira de sediar o torneio esportivo mais popular do mundo.
Três anos antes do torneio já surgem notícias sobre os elevados custos esperados de viagens e hotéis, preços exorbitantes de alimentação e bebidas.
Isto não é surpresa. Como uma religião secular global, o futebol pode separar e unir; ele lembra o mais democrático e acessível dos esportes — há poucos pré-requisitos físicos e tudo o que se precisa é de um objeto redondo que possa ser chutado.
No entanto, há uma expectativa sobre aeroportos que ainda precisam ser remodelados, hotéis construídos, linhas ferroviárias previstas, estádios ambiciosos construídos em diferentes cidades e se os fãs de futebol estarão seguros para assistir às partidas.
A segurança é uma questão vital antes e durante qualquer grande evento esportivo. Como foi mostrado na África do Sul, o governo não pode vencer a guerra contra o crime sozinho. A luta contra o crime é responsabilidade de cada brasileiro também.
No entanto, antes do torneio o governo na África tomou uma decisão consciente para se certificar que o policiamento seria intensificado e que o crime seria anulado durante a Copa do Mundo. Em 2004, a polícia da África do Sul lançou uma campanha de recrutamento que conseguiu 55 mil novos membros até 2010. Como resultado direto não houve crimes graves ou violentos relatados contra os visitantes durante o campeonato. Aqueles policiais ainda estão uniformizados e seu legado foi duradouro. A taxa de crimes graves caiu para 5% no último ano. Todos precisam ser cidadãos responsáveis e trabalhar juntos. A sociedade civil também deve se envolver.
Por exemplo, dois anos antes do pontapé inicial, a África do Sul se tornou um dos primeiros países a introduzir SMS (mensagens de texto) para denunciar crimes. A experiência foi seguida por outros países. Também introduzimos tribunais 24 horas, muito eficazes para lidar com crimes relacionados à Copa do Mundo.
A experiência nos ensinou que os grandes eventos muitas vezes se mostram uma tentação para os criminosos cometerem crimes ou terroristas realizarem seus atos perversos. Estávamos firmes em nossos planos de segurança e eles jamais foram distraídos em nossa causa. Qualquer tipo de comportamento desviante, seja a criminalidade ou conversas de terrorismo, era tratado com rapidez e sem misericórdia.
No entanto, seria loucura para qualquer país subir em um palanque e proclamar que está imune à criminalidade.
Nós nunca tivemos o hábito de responder a relatórios e comentários sem fundamento feitos por pessoas sem rosto. No entanto, poucas horas depois de receber qualquer ameaça de rumores, trabalhávamos com a polícia para imediatamente pôr em ação nossa inteligência de modo a identificar a credibilidade de tais relatórios.
Nossos preparativos eram proativamente e reativamente empreendidos para superar quaisquer ameaças potenciais.
Em termos de apresentações espetaculares, estádios ultramodernos, aeroportos e infraestrutura, os brasileiros devem se lembrar que os custos de construção nunca podem ser estáticos. Por exemplo, no final, a África do Sul teve um custo total de US$10,77 bilhões para a construção de cinco novos estádios e a reforma de outros cinco para fazer a Copa do Mundo 2010.
O custo foi três vezes e meio maior do que a estimativa feita em 2004, quando o país conquistou a chance de se tornar o primeiro anfitrião africano da Copa do Mundo. No entanto, todos os estádios estavam prontos e receberam a aprovação da Fifa a tempo. Agora eles estão entre os melhores do mundo — o Soccer City é o maior da África e possui cadeiras para 94 mil pessoas.
Os desafios de recursos e infraestrutura vão continuar a surgir nas manchetes.
Como nós, o Brasil deve abrandar as críticas com respostas objetivas e trabalhar duro para melhorar a sua infraestrutura de transporte, alojamento, segurança e comunicação, já que estas são necessidades básicas para sediar uma Copa Mundo.
Como aprendemos na África do Sul em 2010, os medos, cinismo e ceticismo poderiam ser provados infundados em 2014. Na África do Sul, com mais de 5 bilhões de dólares gastos em preparativos, as instalações foram mais do que adequadas.
Transporte e hospedagem eram abundantes e as melhorias aqui mais uma vez deixaram um legado importante. A maior cidade da África do Sul agora possui pontos de transporte funcional multiuso, onde ferrovias e rodovias se encontram. Dois dos nossos aeroportos internacionais agora possuem novas classes mundiais e a cidade de Durban possui um novo aeroporto internacional ultramoderno. E a nossa autoestrada Gautrain — concluída semanas antes do início do torneio — agora liga o centro econômico de Sandton ao OR Aeroporto Internacional de Tambo, bem como as cidades de Joanesburgo e Pretória.
A Copa-2014 será sem dúvida o maior evento de marketing já feito no Brasil. Todo o país precisa garantir que as obras continuarão por muitos anos após o apito final ter soprado. É do interesse de todos os brasileiros fazer da Copa do Mundo um sucesso.
RICH MKHONDO foi diretor de Comunicações do Comitê Organizador da Copa do Mundo da Fifa de 2010 na África do Sul. E-mail: richmkhondo@aol.com.