Título: No comando do BC, Tombini vence desconfiança de analistas
Autor: Valente, Gabriela
Fonte: O Globo, 01/01/2012, Economia, p. 31

Para mercado, porém, diretoria do órgão precisa melhorar comunicação este ano

BRASÍLIA. O presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, está completando um ano no cargo. Nesta travessia, foi alvo de uma enxurrada de ataques ao arrocho na política monetária no início de 2011 - considerado brando diante da inflação galopante e do superaquecimento econômico -, à guinada nos juros, reduzidos a partir de agosto, e à sua suposta suscetibilidade aos desejos do Palácio do Planalto. Mas chega ao fim de dezembro "absolvido" pela maioria dos economistas e analistas do mercado, muitos dos quais consideram que ele mudou a cara do BC. Só não passará incólume porque uma crítica permanece: a diretoria do órgão falhou na comunicação de suas intenções e precisa melhorar esta habilidade em 2012.

Não foi uma cadeira fácil de se ocupar em um ano de turbulência causada pelos desdobramentos da maior crise desde a Grande Depressão dos anos 30. Mas foi a capacidade de antevê-los - e de percebê-los como um freio à escalada da inflação - que levou os economistas a fazerem um mea culpa e reconhecerem o mérito de Tombini como banqueiro central.

Tombini foi acusado de se submeter à pressão de Dilma

No ápice dos ruídos entre BC e economistas, ele foi acusado de sucumbir à pressão da presidente Dilma Rousseff pela manutenção do crescimento, quando surpreendeu até os movimentos sindicais e empresariais em agosto ao cortar os juros em 0,5 ponto percentual após aumentar a Taxa Selic em todas as reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) entre janeiro e julho.

Poucos dias antes dessa controversa decisão, ele discursou sobre possíveis impactos severos da crise financeira no Brasil, em meio já à desaceleração significativa do Produto Interno Bruto (PIB). Mas não foi contundente o bastante para fazer com que os analistas mudassem sua aposta em manutenção dos juros.

Porém, quem aplica no mercado futuro já apostava que o Copom inverteria todo o movimento de alta e com um corte maior que o usual. Isso geralmente não acontece porque o BC tende a manter a taxa por um tempo antes de inverter o movimento de política monetária.

- Este foi um ano atípico e bem desafiador. Não houve manutenção dos juros em nenhum momento - lembra o ex-secretário do Tesouro Carlos Kawall.

Ele aprova os passos de Tombini:

- Eu acho que o BC foi muito bem no geral e se antecipou a um quadro internacional muito complicado. Se tivesse aumentado mais os juros no início do ano, a gente estaria sofrendo uma retração muito maior agora e o crescimento não seria apenas zero como a gente viu no terceiro trimestre.

Kawall concorda que o pecado do BC foi a comunicação. Assim como Alex Agostini, da Austin Rating. Mas o economista diz que Tombini tem um mérito incontestável: deixou de olhar apenas para o controle da inflação e passou a mirar num "alinhamento da política econômica".

Ou seja, passou a sofisticar a análise do futuro ao levar em consideração não apenas o trabalho do BC, mas também o do Ministério da Fazenda e do restante do governo, com os consequentes impactos no bolso do brasileiro. Um dos resultados deste novo olhar é a insistência na adoção de medidas de restrição do crédito conhecidas como macroprudenciais.

- Ele mudou a cara do Banco Central na forma da condução da política monetária desde a criação do sistema de metas (em 1999) - disse Agostini.

Mesmo entre os aplausos, o gaúcho Alexandre Tombini ainda é alvo de contestação. O professor da PUC-Rio José Márcio Camargo, sócio da Opus Investimento, concorda que o presidente do BC trouxe novidades na condução da política monetária. Mas torce o nariz para o aumento de depósitos compulsórios (parte do dinheiro dos clientes que os bancos são obrigados a deixar parada no BC) e de exigência de capital para controlar a inflação.

Para Camargo, o mais correto para combater a alta dos preços seria usar somente juros e não crédito. No entanto, ele admite que não é possível dizer ainda o resultado desta opção:

- Uma coisa é tomar a decisão quando se está sentado na cadeira da presidência do Banco Central. Sentado aqui na minha cadeira, eu teria feito diferente, mas isso não significa que estaria certo.

Para BC, mercado não percebeu "claro discurso"

Armando Castelar, professor da UFRJ, concorda com as ações da autoridade monetária, mas faz coro com os críticos da comunicação. Já o ex-diretor do BC Alexandre Schwartsman diz que o foco mudou e não é mais inflação. O crescimento do país virou a meta do órgão. Ele diz que, com isso, não existe mais a segurança na projeção do nível de preços nos próximos anos como antes.

- Em defesa do Tombini, tenho de dizer que já em 2010 não estava essa Coca-Cola toda (a condução da política monetária) e por coincidência às vésperas da eleição houve corte de juros - afirmou Schwartsman.

No BC, a avaliação é que o mercado não percebeu "o claro discurso do presidente", que alerta para o perigo da crise desde a posse. "As crises financeiras surgem de forma lenta, e por vezes silenciosa. Muitas vezes, só são percebidas quando já se encontram em estágios avançados. Os mercados são dinâmicos e inovadores", disse Tombini ao assumir o cargo, lembrou um interlocutor.

Entre os elogios e reclamações, Tombini encerra o ano com as preocupações do que pode se tornar a crise em 2012, mas com a sensação de dever cumprido, como demonstrou em um de seus últimos discursos públicos: "À medida que novas informações são divulgadas, observa-se a confirmação do cenário antecipado por esta casa (BC)."