Título: Um período de pressões eleitoreiras
Autor:
Fonte: O Globo, 31/12/2011, Opinião, p. 6
O primeiro ano de governo de Dilma Rousseff não trouxe maiores surpresas no campo econômico, mas compensou a relativa monotonia com a política, candidata a continuar a ser destaque nestas eleições municipais. Se, no campo econômico, só houve algum frisson quando o Banco Central, mesmo com a inflação acima do limite superior da meta (6,5%), iniciou uma fase de corte de juros, o mundo da política produziu abalos sucessivos com a saída quase em série de ministros.
Do ministro da Casa Civil Antônio Palocci, em junho, a Carlos Lupi, do Trabalho, no início de dezembro, foram sete. Há o caso de Palocci, autoimolado porque preferiu sair a dar detalhes de consultorias faturadas mesmo quando já era virtual ministro, e o de Nelson Jobim, da Defesa, expelido em agosto por dessintonias pessoais com a chefe. Os demais não conseguiram explicar "malfeitos", jargão dilmista, com o dinheiro público.
O BC alegou que a crise mundial receberia forte impulso pela deterioração da Europa, e o Brasil precisava se precaver. Estava certo. Mas o ministério de Dilma não parou de gerar notícias sobre escândalos. E 2012 começará com Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, amigo da presidente, em dívida com a sociedade, a que deve explicações convincentes sobre consultorias prestadas depois da saída da prefeitura de Belo Horizonte e quando já era cotado para ser peça influente em Brasília, caso a amiga vencesse nas urnas de 2010.
Ponto a favor de Dilma foi ter resistido a pressões da base para, de forma autista, se comprometer com elevados gastos adicionais, enquanto o mundo bordeja o precipício da recessão. Não foi fácil, devido à cultura do fisiologismo inoculada na base pelo estilo lulopetista de governar, mas o Planalto conseguiu reter descabidos reajustes salariais do funcionalismo, na Justiça em particular, e não concedeu aumento real aos aposentados, outro contrassenso econômico.
Mas 2012, em função das eleições, reserva novas e mais fortes pressões para o Planalto abrir os cofres. Por esperta precaução, o Palácio se valeu da desatenção quase generalizada que toma conta do país nesta época do ano e baixou decreto, antes dos fogos de réveillon, para estender "restos a pagar" - dinheiro orçado que passa de um ano para outro - até 30 de junho, quando, pela legislação eleitoral, suspende-se a assinatura de convênios com prefeituras.
Haverá, portanto, algum dinheiro para o clientelismo eleitoreiro, outra das pragas da vida pública brasileira. O decreto só não vale para obras do PAC. Mas estas têm irrigação própria, e o que candidato a prefeito quer é obra, não necessariamente grande, em cima da terra, ao lado da qual possa instalar o palanque. Manilha de projetos de saneamento - séria deficiência nacional - não faz muito o gosto desses candidatos.
Além, portanto, da questão ainda não resolvida de Pimentel - a explicação de que as consultorias são questão privada não vale, por óbvio -, a presidente herda de 2011 uma base parlamentar ainda mais sequiosa de dinheiro público, excitada pelas urnas. Dilma terá de levar a sério as próprias palavras quando faz profissão de fé na defesa da estabilidade econômica.