Título: Haiti ainda de joelhos dois anos após terremoto
Autor: Ribeiro, Marcelle
Fonte: O Globo, 12/01/2012, O Mundo, p. 31
Com reconstrução lenta, país tem 500 mil pessoas vivendo em abrigos e falta comida para metade da população
SÃO PAULO. Dois anos depois do terremoto que matou 200 mil pessoas no Haiti, em 12 de janeiro de 2010, houve progressos na vida dos haitianos, mas ainda há muitos problemas, e a reconstrução segue mais devagar do que o desejado. De acordo com a ONU, cerca de 500 mil pessoas ainda vivem em abrigos. O desemprego atinge 60% da força de trabalho do país, fazendo com que multidões vaguem nas ruas. Um a cada dois haitianos enfrenta algum tipo de escassez de alimentos, e quatro milhões de crianças e adolescentes são afetados pela pobreza crônica.
Segundo o governo do Haiti, mais de oito milhões de pessoas vivem sem energia elétrica, cinco milhões são analfabetas e 80% da população vivem com menos de US$2 por dia.
- Já se passaram dois anos e eu ainda estou morando num acampamento - lamenta o haitiano Jerome Mezil, de 28 anos, que vive em Porto Príncipe.
Muitos haitianos acreditam que as medidas tomadas para criar empregos são insuficientes.
- O mais importante para mim agora é conseguir trabalho - afirma Margalie Theano, 40 anos, num acampamento .
Nas ruas, poucos prédios novos ou reformados podem ser vistos e ainda há destroços provocados pelo terremoto. O Palácio Nacional, sede do governo, ainda não foi restaurado. Preocupados com a necessidade de recursos, órgãos da ONU conclamam a comunidade internacional a fazer doações e afirmam que precisam de US$54 milhões para programas imediatos e de longo prazo voltados para crianças e mais US$230 milhões para projetos de alimentos.
ONU aponta avanços, mas cobra mais ajuda
O diretor do Centro de Informação da ONU no Brasil, Giancarlo Summa, diz que gostaria que a ajuda ao Haiti fosse mais rápida, apesar de apontar avanços. Ele teme que a crise econômica na Europa afete a ajuda internacional e diz que indústrias voltaram atrás na intenção de se instalar no Haiti.
- Nós gostaríamos que tudo fosse mais rápido, porque centenas de milhares de pessoas vivem em abrigos. O clima não está bom, o orçamento da ONU foi reduzido pela segunda vez na história da organização. Vários países entendem que, em tempos de crise, têm de reduzir contribuições a organismos internacionais - lamenta Summa.
Para o governo do Haiti, a ajuda internacional existente precisa ser melhorada.
- A ajuda é muito dispersa, falta coordenação. E não é suficientemente relacionada às prioridades do governo ou da comunidade internacional - afirmou recentemente o premier haitiano, Gary Conille.
O cólera, doença que atingiu cerca de 520 mil pessoas e matou quase 7 mil no país, ainda preocupa. Teme-se que na próxima temporada de chuvas, em maio e junho, uma nova epidemia ocorra.
- A saúde pública no Haiti é péssima. Não há um sistema público de atendimento organizado. O governo não colocou a saúde como uma das primeiras preocupações de agenda. Faltam hospitais e postos de saúde - disse ao GLOBO Gérard Bedock, chefe de missão da organização não governamental Médicos Sem Fronteiras no Haiti.
Segundo ele, 200 casos de cólera são registrados por dia.
Tentando ajudar a reerguer o país, cerca de 1.600 engenheiros da força de Paz da ONU no Haiti trabalham na construção de prédios e asfaltando ruas. Eles são as "meninas dos olhos" do comandante da Força de Paz das Nações Unidas, o general brasileiro Luiz Eduardo Ramos. Segundo ele, o fornecimento de energia elétrica já foi melhorado em algumas regiões. Por outro lado, o militar afirma que a polícia haitiana ainda não está preparada para assumir a segurança sozinha.
- A polícia haitiana tem 10 mil homens e não tem condições de nos substituir em todo o país. Não há gente suficiente - afirmou o general ao GLOBO.
Segundo ele, em março cerca de 1.600 dos 8.900 militares de várias nacionalidades que integram a força de paz deixarão o país por determinação da ONU - entre eles, 288 brasileiros. Mesmo assim, ficarão 400 homens a mais do que havia antes do terremoto.
Com agências internacionais