Título: Ainda em pauta
Autor:
Fonte: O Globo, 09/01/2012, Opinião, p. 6

TEMA EM DISCUSSÃO: Reformas sindical e trabalhista

Por ter aprovado uma Constituição contemporânea no que se refere à democracia e direitos civis, porém defasada no tempo em questões econômicas e sociais, o país mantém uma agenda eterna de reformas.

No campo econômico, muito se conseguiu na gestão de Fernando Henrique Cardoso, com a quebra de monopólios estatais, conectada a um programa de privatizações. Poderia ter ido além, mas a modernização das telecomunicações já foi um ganho histórico, por exemplo. Como as bases para a responsabilidade fiscal. Na Era Lula, quando grupos organizados contrários ao fim de vários privilégios existentes na Carta também chegaram ao poder, pouco se avançou. No primeiro mandato, foi iniciada a imprescindível reforma da previdência dos servidores públicos - 900 mil aposentados produzem um déficit maior que os 28 milhões do INSS. Mas, apenas agora, retoma-se a aprovação do fundo complementar de aposentadoria do funcionalismo federal, peça-chave das mudanças.

Reformas não deixaram de ser prometidas. Como reza a cultura de negociações do sindicalismo do ABC paulista, criou-se até um fórum em que entidades representativas de patrões e empregados se sentaram frente à frente para rever a legislação trabalhista e a sindical, normas herdadas do varguismo da década de 40, com grande influência do fascismo italiano de Mussolini. No vértice das normas e regras encontra-se o Estado, a que se subordinam os sindicatos, patronais e de trabalhadores. Cabe a ele cobrar o imposto sindical e distribuí-lo entre todos. Já na legislação trabalhista (CLT), é missão do Estado proteger o empregado, garantindo-lhe direitos. Também é função do poder público supervisionar todo este sistema.

Não espanta que o Brasil seja um dos países que mais produzam demandas para a Justiça do Trabalho. Já foi mais rígido no passado, mas, em princípio, ao contrário de países desenvolvidos, mesmo que patrão e empregado façam um acordo, ele não é aceito se o juiz entender que há algum conflito com a CLT.

O argumento em defesa da intocabilidade da CLT costuma ser a "defesa de direitos". Ora, como estes "direitos" têm um custo - para cada R$100 pagos ao funcionário, o empregador pode ter de destinar outros tantos para os cofres públicos -, a Consolidação das Leis Trabalhistas é grande incentivadora da verdadeira precarização do emprego, a informalidade. Nos últimos anos, houve razoável criação de empregos formais. Porém, mesmo assim, cerca de 40% do mercado de trabalho continuam na informalidade, devido aos entraves celetistas.

Houve uma frustração especial no governo Lula. Afinal, ele e outros políticos vindos do movimento sindical surgido a partir do final da década de 70, na ditadura militar, defenderam propostas de desmonte da arquitetura sindical varguista.

Eram contra o imposto sindical - cada categoria que contribua de forma espontânea para sua representação - e outros pilares desta legislação. Ao chegarem ao poder, no entanto, esquecerem as bandeiras do passado e atuaram para fortalecer o varguismo. Até as centrais, legalmente à margem do Estado, foram atreladas a ele, para que possam receber o dinheiro público do imposto sindical. Registre-se que a CUT continua a criticar o imposto, embora não se saiba se tem rejeitado dinheiro do Tesouro.

O mundo a partir de 2009 é diferente daquele do qual Lula se beneficiou durante quase toda a gestão. A torcida é que as dificuldades estimulem a sociedade a abrir novo ciclo de modernização institucional.