Título: Órgão federal faz propaganda de empresa
Autor: Carvalho, Jailton de
Fonte: O Globo, 15/01/2012, O País, p. 16

Em texto a estados, Departamento Penitenciário sugere que companhia seja contratada sem licitação para obras em presídios

BRASÍLIA. O Departamento Penitenciário Nacional (Depen) fez propaganda e orientou secretários estaduais de Administração Penitenciária a contratar a empresa Verdi Construções para construir presídios no país financiados com recursos federais. Sob o comando do diretor Augusto Rossini, o Depen produziu relatório com elogios ao sistema de construção por módulos da Verdi, destacando que empresa poderia ser contratada "sem licitação". O GLOBO teve acesso ao documento, de 24 páginas, em formato Power Point, que traz o nome de Rossini.

O Depen será o responsável pela aplicação do fundo de R$1 bilhão criado pela presidente Dilma Rousseff para financiar construção e reforma de presídios no país a partir deste ano. A Verdi, empresa com sede no Rio Grande do Sul, é uma das mais interessadas nesse novo filão.

No relatório, o Depen exalta o Siscopen, sistema de construção pré-moldada vendido com exclusividade pela Verdi. "Por sua característica única, o Siscopen tem sido adquirido pelas unidades federativas no Brasil através da inexigibilidade de licitação. Os contratos normalmente são firmados com preço global. O projeto executivo é desenvolvido pela Verdi Construções S/A", diz o texto, com timbre do Ministério da Justiça.

- Isso é lobby. Não pode - espanta-se o diretor-executivo da ONG Transparência Brasil, Cláudio Abramo.

O documento também é chancelado pelo ex-diretor de Política Penitenciária Alexandre Cabana de Queiroz Andrade. Cabana foi afastado do cargo, no início do mês passado, por envolvimento em supostas irregularidades na compra de câmeras e microfones de presídios federais. A Verdi deveria ser contratada para construir presídios especiais para jovens detentos, uma das propostas do Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania).

O governo liberou R$240 milhões para 14 estados iniciarem obras. Mas a proposta foi barrada pela decisão de Dilma de construir cadeias e presídios em vez de penitenciárias especiais para presos jovens adultos. Em 10 de maio, Cabana enviou ofício aos estados informando a decisão de suspender a construção dos presídios. O projeto passou a ser considerado "inexequível".

No mesmo documento, deu prazo de um mês para os estados apresentarem projeto alternativo para cadeias públicas. Alguns secretários entenderam que a única saída era recorrer ao projeto original da Verdi. A empresa tratou de resolver entraves sobre direitos autorais e liberou o pagamento.

A proposta de construção pela Verdi foi oferecida a Goiás. Mas a equipe do governador Marconi Perillo a rejeitou.

Em fevereiro do ano passado, o Ministério Público do Rio Grande do Norte ajuizou ação contra projeto de ampliação da penitenciária estadual de Alcaçuz, tocado pela Verdi. O promotor Rafael Silva aponta graves falhas no projeto. A arquiteta Carla Deboni, escalada pela Verdi para falar sobre o assunto, negou qualquer problema no presídio no Rio Grande do Norte.

- Foi pontual. As reclamações foram resolvidas - disse.

Carla disse desconhecer o suposto lobby do Depen. Mas confirmou que a empresa recebeu pedidos de secretarias estaduais para mudar o projeto de construção de presídios para jovens. A Verdi já construiu 49 presídios, 12 no Espírito Santo.

O diretor do Depen negou que tenha apresentado a qualquer estado documento que defende a contratação da Verdi. Afirmou que o relatório foi feito para uma apresentação interna no Depen no início de 2011. "Desconheço qualquer relatório que tenha sido apresentado às unidades federativas. O documento apresentado(pelo jornal) tratava-se de material de uso interno consistente em apresentação do início do ano de 2011, quando o Depen discutia se a própria União faria diretamente as contratações para a construção de presídios, seja pelo método tradicional, seja pelos sistemas pré-fabricados. A opção da União de contratar diretamente empresa para fazer as construções foi totalmente descartada. A proposta do Depen foi repassar os recursos para os estados, a fim de que optem pelo método construtivo, realizando eles próprios as respectivas licitações", disse o diretor, em resposta por e-mail. Rossini anunciou que pedirá ao ministro da Justiça que abra sindicância para verificar se houve uso indevido do material.