Título: Dados irrefutáveis
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Fonte: O Globo, 16/01/2012, Opinião, p. 6

O balanço das operações de fim de ano do Departamento de Polícia Rodoviária Federal reforça o que estatísticas anteriores já evidenciavam: a importância da Lei Seca para ajudar a conter o aumento das tragédias no trânsito do país - e não apenas em períodos de feriados prolongados. O relatório registra uma queda no número de acidentes e mortes nas rodovias federais no período entre o Natal e o réveillon, em relação à mesma época do ano passado. O índice de óbitos, o indicador mais trágico que costuma resultar dessas operações, ficou 18% abaixo do total medido na virada de 2010 para 2011.

A PRF atribui explicitamente a redução a ações específicas adotadas nas estradas a partir da segunda quinzena de dezembro. Entre elas, o reforço de contingente nas vias, a atenção redobrada do órgão a trechos da malha considerados mais perigosos (providências costumeiras nas operações adotadas em períodos de grande movimento de veículos) e o incremento dos testes com bafômetro, que resultaram na autuação de 1.081 pessoas e na detenção de 462 motoristas que dirigiam sob efeito de bebidas alcoólicas.

O combate direto à mistura de álcool e direção pelos testes de alcoolemia, decorrência da aprovação da Lei 11.705, em 2008, que modificou o Código de Trânsito Brasileiro, tornando-o mais inflexível com infrações ao volante, tem reflexo direto na melhoria dos indicadores de óbitos nas estradas. Essa relação imediata pode ser medida pelos resultados obtidos por estados onde a Lei Seca funciona como sistemática política de combate à irresponsabilidade aditivada por bebidas alcoólicas. No Rio de Janeiro, por exemplo, reportagem publicada em setembro de 2011 no GLOBO mostrava que, num período de 12 meses, caíra em 32% o número de atendimentos a vítimas de trânsito no Hospital Lourenço Jorge, na Barra da Tijuca - na rota de uma via expressa (a Linha Amarela) e de dezenas de quilômetros de pistas de alta velocidade. Somados os quatro maiores hospitais da cidade, o índice de redução foi de 13%.

As autoridades da área de Saúde do Rio, um dos estados que mais a sério levam a ideia de inibir irresponsabilidades pela fiscalização direta nas ruas, apontam as blitzes de repressão a motoristas embriagados como o fator determinante para a melhoria desse perfil. Há, ainda, dados subjacentes aos resultados diretamente relacionados à Lei Seca. Segundo o governo fluminense, entre o início da adoção sistemática das blitzes de alcoolemia nas ruas do Rio e o fim do primeiro semestre do ano passado 6 mil vidas haviam sido preservadas no estado. Na área federal, o Ministério da Saúde contabiliza menos demanda no SUS em razão de acidentes de trânsito.

São dados irrefutáveis. Mas os números dizem respeito apenas à redução de danos decorrente da aplicação de um dispositivo que, isoladamente, não tem alcance suficiente para apagar uma nódoa que ainda envergonha o país. É inaceitável o índice de tragédias nas estradas, provocadas não só por motoristas bêbados, mas também por uma série de outras irresponsabilidades ao volante, potencializadas por vias malconservadas e agravadas por uma débil fiscalização dos órgãos de trânsito. Mesmo a adoção da Lei Seca precisa ser aperfeiçoada, de modo a não só torná-la um imperativo nacional, e não só de alguns estados, como também garantir que os flagrantes registrados na ponta onde os testes de bafômetro são realizados se confirmem na extremidade onde a punição deve ser aplicada, o que nem sempre acontece.