Título: Europa sofre um novo golpe da S&P
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Fonte: O Globo, 17/01/2012, Economia, p. 19

Agência tira nota "AAA" do fundo de resgate da zona do euro, o que pode dificultar socorro a países

BRUXELAS, MADRI, BERLIM e RIO

A agência de classificação de risco Standard & Poor"s (S&P) tornou mais difícil ontem a situação da Europa, ao rebaixar a nota do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (Feef), criado para resgatar países em dificuldade, de "AAA" para "AA+". Segundo a S&P, as obrigações do Feef não estariam mais totalmente garantidas depois que França e Áustria perderam suas notas "AAA". A decisão já era temida pelos líderes europeus depois do rebaixamento de nove países da zona do euro pela S&P na sexta-feira. A agência, no entanto, ressaltou que a nota pode ser elevada se forem aumentadas as garantias dadas pelos membros da zona do euro ao Fundo.

O maior problema do rebaixamento é que os bônus emitidos pelo Feef têm de ser garantidos por 780 bilhões em títulos dos países da zona do euro (excluindo os que receberam socorro financeiro). Mas, para emitir bônus "AAA", somente contam garantias "AAA", o que reduz a real capacidade de empréstimo do Fundo a 440 bilhões.

Com o rebaixamento de França e Áustria, o Feef perde cerca de 180 bilhões em garantias "AAA", o que reduz sua capacidade de financiamento a 260 bilhões, segundo cálculos de analistas. Destes, cerca de 40 bilhões já estão comprometidos com os resgates de Irlanda e Portugal, e um novo socorro à Grécia levaria mais 100 bilhões.

As autoridades se apressaram em tranquilizar os investidores. O diretor-executivo do Feef, Klaus Regling, divulgou nota assegurando que a capacidade de empréstimo não ficará abaixo de 440 bilhões. "O Feef tem os meios de cumprir suas obrigações atuais e outras que eventualmente surjam", disse Regling.

França paga juro menor em leilão

A Alemanha adotou discurso semelhante. O porta-voz do governo, Steffen Seibert, assegurou que as atuais garantias são suficientes para que o Feef cumpra suas obrigações. Ele lembrou ainda que a criação do Mecanismo Europeu de Estabilidade, fundo permanente de ajuda aos países, foi antecipada para meados deste ano.

Pela manhã, houve um certo otimismo, com a França pagando juros menores em leilão de títulos, o primeiro após a perda do "AAA". Foi posto no mercado 1,895 bilhão em títulos de um ano, com taxa de retorno (inversamente proporcional à procura) de 0,406%. Há uma semana, em operação similar, a taxa foi de 0,454%. Isso mostra que o rebaixamento não afetou os mercados. O leilão, de 8,59 bilhões, incluiu títulos de três e seis meses.

Além disso, outra agência de rating, a Moody"s, divulgou nota afirmando que o endividamento da França está pressionando a perspectiva da nota "AAA" do país, hoje estável. O governo correu para comemorar "a manutenção da nota do país", mas o jornal "Les Echos" ressaltou que, na nota, a Moody"s avisa que atualizará sua avaliação da França ainda neste trimestre.

Esses dois fatores fizeram com que as principais bolsas europeias fechassem em alta. Frankurt avançou 1,3% e Paris, 0,9%. Londres subiu 0,4%. Wall Street não funcionou devido ao feriado de Martin Luther King.

A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) avançou 1,37%, aos 59.956 pontos pelo Ibovespa, seu principal índice. Sem indicadores externos relevantes, o foco foi a economia brasileira, que registrou crescimento de 1,15% na atividade em novembro pelo IBC-Br, indicador do Banco Central. O dólar comercial recuou 0,11%, a R$1,788.

Segundo analistas, também influenciou o vencimento de opções sobre ações, o que elevou o giro financeiro da Bolsa para R$8,8 bilhões, o maior volume do ano - sem isso, o volume ficaria em cerca de R$4,4 bilhões.

- O dado da atividade, que normalmente é pouco olhado por investidores, ganhou mais projeção na ausência de dados externos - explicou Gustavo Mendonça, da Oren Investimentos.

A maior alta foi OGX Petróleo ON (ordinária, com voto), de 5,79%, que confirmou descobertas de petróleo. Já Petrobras PN (preferencial, sem voto) subiu 2,6%, na expectativa de uma possível liberação da 11º rodada de concessões de petróleo e gás.

Reunião com Monti deve ser adiada

Em Madri, o presidente francês Nicolas Sarkozy, minimizou o rebaixamento pela S&P. E disse que a reunião com o premier italiano, Mario Monti, e a chanceler alemã, Angela Merkel, prevista para sexta-feira, deve ser adiada para fevereiro.

- Enfrentamos uma crise sem precedentes, que nos obriga a reduzir nossos gastos, a reduzir nosso déficit, mas também a encontrar um caminho de um novo crescimento, resolvendo nossos problemas de competitividade - afirmou Sarkozy durante uma entrevista coletiva conjunta com o presidente do governo espanhol, Mariano Rajoy. - Precisamos reagir a essas decisões com sangue-frio, com distanciamento.

Rajoy só vai explicar ao Congresso as medidas de austeridade de seu governo após a reunião de cúpula europeia, no próximo dia 30. Mas respondeu a uma pergunta sobre a recente alta de impostos:

- Estou absolutamente seguro de que (os eleitores) não gostaram. Tomei essa decisão porque estamos numa situação muito complicada. Foi uma decisão que custou muito a mim e a meu governo.

COLABOROU Bruno Villas Bôas, com agências internacionais