Título: ANS vai apurar se houve omissão de socorro de hospitais a secretário
Autor: Souza, André de
Fonte: O Globo, 21/01/2012, O País, p. 4

Servidor do Planejamento morreu após não ser atendido em 2 instituições privadas no DF

BRASÍLIA. Após ordem da presidente Dilma Rousseff, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, acionou ontem a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para investigar a possível omissão de socorro que resultou na morte do secretário de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Duvanier Paiva Ferreira. Há suspeita de que ele teve o atendimento recusado em dois hospitais particulares de Brasília, que não eram credenciados por seu plano de saúde, o Geap. Ferreira conseguiu ser atendido só no terceiro hospital, onde teve parada cardíaca e morreu na madrugada da quinta-feira.

Ainda ontem, o corpo de Duvanier foi enterrado em São Paulo. A ANS já realizou diligências nos hospitais envolvidos e também vai apurar se houve racismo institucional, uma vez que o secretário era negro.

A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) também está investigando o caso, e o Procon do DF deverá abrir processo administrativo na próxima segunda-feira. Vai ser apurado se os hospitais Santa Lúcia e Santa Luzia exigiram cheque-caução para atender Duvanier. O ato é considerado prática abusiva pelo Código de Defesa do Consumidor, mas não é tipificado como crime. Quanto à omissão de socorro, caso se comprove, eles poderão responder por ações cíveis. Já os envolvidos no atendimento poderão responder criminalmente por omissão de socorro qualificada, cuja pena máxima é de 18 meses. A intenção é ouvir na próxima semana todos os funcionários que estavam de plantão nos três hospitais.

Hospital negou que tenha exigido cheque-caução

Tanto o Santa Luzia quanto o Santa Lúcia negaram irregularidades. O Santa Luzia disse, em nota, que "foram checadas as imagens do circuito interno de TV, bem como os registros telefônicos e feitos contatos com funcionários que estavam de plantão", mas "não constatou a entrada de Duvanier Paiva no Pronto Atendimento na madrugada de quinta". Já o diretor jurídico do Santa Lúcia, Gustavo Marinho, diz que em nenhum momento Duvanier pediu atendimento de emergência; negou que tivesse sido exigido cheque-caução; e disse que o hospital quer ajudar na investigação.

- O paciente entrou calmamente andando. Perguntou se o hospital atendia pelo convênio. Foi informado de que não, mas que poderia pagar. Ele e a acompanhante preferiram ir a outro hospital que atendia pelo convênio. Em nenhum momento pediu atendimento de emergência. Se tivesse pedido, seria atendido - afirmou Marinho.

Já o Hospital Planalto, onde o secretário deu entrada, limitou-se a dizer que o paciente foi atendido normalmente.

A investigação está sendo conduzida pela Delegacia do Consumidor (Decon) do DF. A delegada titular, Alessandra Figueiredo, já ouviu Marisa Makiyama, diretora técnica do Santa Luzia. A delegada informou também que já está com a escala de plantão e as imagens da entrada da emergência do hospital. São sete horas de gravação, de 0h até 7h de quinta, que ainda vão ser analisadas pela polícia.

- A gente vai ter que ver a imagem. Não se sabe ainda o que há nela - explicou a delegada Alessandra Figueiredo.

O Hospital Planalto entregou à PCDF apenas a lista dos funcionários de plantão, uma vez que não tem imagens da emergência. Na segunda, vão ser fornecidas as imagens e a escala de plantão do Santa Lúcia. A delegada explicou que as imagens ajudarão a elucidar os fatos, mostrando inclusive o estado do secretário no momento do atendimento. Também já foi deixada uma intimação na casa da mulher dele. Os parentes serão ouvidos apenas na próxima semana, uma vez que se encontravam em São Paulo ontem. Será solicitado ainda um laudo ao Instituto Médico-Legal (IML), que deverá chegar à Polícia Civil em até 15 dias e dirá a causa da morte.

Os hospitais também poderão ser multados. O diretor-geral do Procon-DF, Oswaldo Morais, explicou que as multas variam de R$414 a R$6,2 milhões, e que o valor exato é calculado levando em conta critérios como gravidade, reincidência e potencial econômico. Mas Morais age com cautela ao falar da responsabilidade dos hospitais:

- Não podemos nos precipitar. É bom instaurar o processo administrativo para ouvir os hospitais.

Em nota, o Ministério da Saúde informou que entrou em contato com a PCDF e o Conselho Regional de Medicina do DF. Segundo a nota, o conselho já abriu procedimento de apuração de responsabilidade dos hospitais e seus profissionais.

Ainda na quinta-feira, em nota, a presidente Dilma Rousseff lamentou a morte de Duvanier. No mesmo dia, o Planejamento também soltou nota, afirmando que o secretário "tinha total confiança da ministra Miriam Belchior como condutor das relações de trabalho do governo com os servidores". Ferreira nasceu em São Paulo, em 6 de fevereiro de 1955, e, desde junho de 2007, ocupava o cargo de secretário de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento. No passado, ele já foi dirigente da central sindical CUT.