Título: Trégua a Cristina
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 29/12/2011, O Mundo, p. 28
Argentina reage com preocupação e solidariedade após notícia de que presidente tem câncer
Um ano e dois meses após a morte do ex-presidente Néstor Kirchner (2003-2007), a frase "força Cristina" voltou a dominar as principais redes sociais na Argentina, num clima de preocupação pela cirurgia que deverá realizar Cristina Kirchner no próximo dia 4 para a retirada da glândula tireoide, onde foi detectado um tumor. Na tentativa de transmitir tranquilidade e otimismo à população, ontem a presidente mostrou-se forte e assegurou que continuará trabalhando com o maior dos compromissos.
Segundo informações publicadas pela imprensa local, Cristina ficou chocada ao ser confirmado o diagnóstico de câncer, no último dia 22. A chefe de Estado só teria se acalmado após uma longa conversa com o cirurgião Pedro Saco, chefe da equipe que atenderá Cristina no Hospital Austral, na província de Buenos Aires. Depois de passar o Natal com sua família em Santa Cruz, a presidente retornou à capital do país mais serena e disposta a comunicar oficialmente seu problema de saúde, disseram fontes da Casa Rosada. No discurso de ontem, Cristina chegou até mesmo a fazer brincadeiras sobre a situação. Depois de confirmar que Hugo Chávez foi o primeiro a lhe telefonar na noite de terça-feira, ela disse que disputará a presidência honorária da cúpula de chefes de Estado que venceram o câncer, proposta lançada pelo presidente venezuelano na última reunião do Mercosul, em 20 de dezembro, no Uruguai.
- Eu disse para ele (Chávez): "Você e sua cúpula." Porque ele anda promovendo junto com Lula uma cúpula dos que venceram o câncer - contou Cristina.
Na tarde de ontem, a presidente Dilma Rousseff telefonou para sua colega argentina, e disse ter certeza de que Cristina terá a força necessária para enfrentar este momento difícil. Também se comunicaram com a presidente o paraguaio Fernando Lugo, o chileno Sebastián Piñera, o colombiano Juan Manuel Santos e o equatoriano Rafael Correa, que utilizou o Twitter para enviar uma mensagem pública a Cristina:
"Todos estamos com Cristina. Desejamos uma rápida recuperação. Argentina e nossa América precisam de você."
Em Buenos Aires, a presidente recebeu o apoio de 17 dos 24 governadores e de todos os ministros de seu Gabinete, que ontem participaram de um evento na Casa Rosada. Na saída, vários políticos disseram ter encontrado "uma Cristina forte, que conseguirá superar este novo desafio".
- Ela é um exemplo de força, otimismo e compromisso com sua função - declarou o governador da província de Misiones, Maurice Closs.
Já o governador de Salta, Juan Manuel Urtubey, assegurou que a presidente "está inteira, como sempre esteve em momentos difíceis".
Essa foi exatamente a imagem que Cristina se esforçou em transmitir. Apesar de saber que deverá deixar a Presidência em mãos de seu vice, Amado Boudou, durante quase um mês, ela continua mostrando-se no comando do país. Desde que perdeu seu marido e antecessor, Cristina concentrou todo o poder e as principais decisões do governo. A presidente discute iniciativas com pouquíssimos colaboradores e, principalmente, com seu filho Máximo Kirchner. O governo é ela, costumam dizer analistas políticos locais.
Para médicos, mais de 90% de chances de cura
Com este pano de fundo, o clima na Casa Rosada é de preocupação. Segundo o jornalista Mariano Obarrio, do "La Nación", os kirchneristas estão assustados.
- Mas, como já estão acostumados a fazer, transformarão esta situação numa nova oportunidade de fortalecimento de seu líder. Já estão organizando vigílias para o dia da cirurgia.
Segundo importantes médicos do país, o câncer diagosticado tem mais de 90% de chances de cura.
- Não deve haver preocupação, não está acontecendo nada grave - disse ao GLOBO Jorge Falcón, diretor médico da clínica Suíço Argentina, uma das mais importantes do país.
Segundo ele, após o tratamento, o quadro não deveria alterar a atividade da presidente. Cristina permanecerá de licença até o próximo dia 24 e, após a cirurgia, numa data ainda a ser definida, fará um tratamento com iodo radioativo que a obrigará a ficar alguns dias isolada.
Depois de algumas semanas complicadas - além do câncer, Cristina sofreu a inesperada morte do subsecretário de Comércio Exterior, Ivan Heyn, durante a cúpula do Mercosul - a presidente receberá o ano de 2012 na Patagônia, acompanhada de familiares.
COLABOROU Luiza Damé