Título: Remessas recordes
Autor: Valente, Gabriela
Fonte: O Globo, 25/01/2012, Economia, p. 21

Múltis enviaram US$38 bi para as suas matrizes em 2011, 25% a mais que em 2010

Em um ano marcado pela crise financeira internacional, a remessa de lucros de empresas estrangeiras instaladas no Brasil para o exterior quebrou todos os recordes e foi a maior em 64 anos. As filiais das multinacionais remeteram US$38,1 bilhões para suas matrizes, 25% a mais que no ano anterior. Essa despesa corresponde à maior parte do déficit das contas externas do país (que correspondem a nossas transações com o resto do mundo), que fecharam o ano passado no vermelho em US$52,6 bilhões. A expectativa é que essas remessas cresçam ainda mais neste ano e que o investimento estrangeiro - que vem cobrindo esse rombo há quatro anos seguidos - não tenha mais tanta força.

- É razoável as remessas de lucro crescerem, porque estamos falando de uma economia que cresce mais do que o resto do mundo - disse a economista-chefe do Banco RBS, Zeina Latif.

Esse crescimento descolado da maior parte do mundo faz com que o país importe mais não apenas produtos finais como também matérias-primas, e ainda gaste mais em seguros e serviços como frete para as exportações. Nunca o Brasil gastou tanto com aluguel de equipamentos, por exemplo. O setor de mineração foi o grande responsável nessa categoria em particular.

BC: remessa de US$39,6 bi em 2012

Para Johnny Kneese, economista da corretora Levycam, 2011 foi o ano do socorro de companhias europeias por suas filiais brasileiras. Esse movimento diminuiu nos últimos dias do ano, porque as empresas resolveram segurar mais os recursos no Brasil - campeão mundial de juros - para melhorar seus rendimentos e, consequentemente, o balanço da empresa. Mas se o dólar cair mais, a tendência é a remessa de lucro continuar crescendo. Para 2012, a previsão do BC é que as remessas ao exterior alcancem US$39,6 bilhões.

Ao contrário do que dizem os economistas do mercado financeiro, para o BC as remessas para socorrer empresas em crise foram eventos isolados.

- As remessas em função de crise, para enviar liquidez para matrizes, foram pontuais. As remessas tiveram o comportamento esperado. Não houve surpresa - afirmou o chefe do Departamento Econômico do BC, Túlio Maciel.

No entanto, no fim de 2010, previa-se que as empresas instaladas no país remetessem apenas US$33 bilhões para o exterior. Maciel alegou que são comuns essas remessas, por causa dos investimentos recordes que chegam ao país e - um dia - precisam retornar aos países de origem.

Investimento direto deve cair este ano

Pelo quarto ano seguido, foram esses investimentos estrangeiros que cobriram o rombo das contas externas. Elas fecharam no vermelho devido ao aumento da importação; aos gastos com serviços, como frete; ao pagamento de juros e remessa de lucros; além da despesa recorde de turistas brasileiros no exterior. Os investimentos superaram as expectativas do governo e chegaram a US$66,6 bilhões.

Para o governo, esse é o melhor jeito de financiar o resultado negativo, porque é um dinheiro de qualidade que entra para aumentar a capacidade produtiva do país. Entretanto, isso não deve se repetir neste ano. As projeções do BC indicam investimentos de US$50 bilhões, volume inferior ao do déficit em transações correntes, projetado em US$65 bilhões.