Título: BC surpreende e indica que juros devem cair a um dígito ainda este ano
Autor: Valente, Gabriela
Fonte: O Globo, 27/01/2012, Economia, p. 22

Para autoridade monetária, piora do cenário externo ajudará a conter a inflação

BRASÍLIA. O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) inovou e colocou na ata da reunião da semana passada - em que a taxa básica (Selic) foi cortada em 0,5 ponto percentual para 10,5% ao ano - que os juros devem continuar a cair e chegar a um dígito neste ano. O Copom destacou que a situação internacional piorou e que há "possibilidade de que ocorram eventos extremos".

A ata diz que a desaceleração da economia brasileira no segundo semestre do ano passado "foi maior do que se antecipava e que eventos recentes indicam postergação de uma solução definitiva para a crise financeira europeia" e que, assim, "o Copom atribui elevada probabilidade à concretização de um cenário que contempla a Taxa Selic se deslocando para patamares de um dígito".

Esse foi um dos documentos considerados mais claros pelos analistas do mercado financeiro. Até então, o tamanho dos cortes era a grande dúvida dos economistas: até onde a instituição chegaria para estimular a economia, sem deixar de garantir a convergência da inflação para a meta de 4,5% ao fim deste ano. Depois da divulgação, os juros no mercado futuro caíram e alguns especialistas revisaram suas projeções para baixo.

- Já tinham inovado (na semana passada, ao anunciar o resultado da reunião), quando usaram o mesmo comunicado da reunião anterior, deixando muito claro que iriam fazer mais um corte de 0,5 ponto percentual. Agora inovaram de novo, meio que se comprometendo com uma taxa de juros ainda menor - disse André Perfeito, da Gradual Investimentos.

O economista Eduardo Velho, da corretora Prosper, diminuiu sua projeção da Selic de 9,5% para 9,25% ao ano em 2012. Segundo ele, o mercado esperava uma ata menos alarmista em relação ao cenário externo, que se deteriorou desde a penúltima reunião do Copom, há um mês e meio. No texto, o BC diz que essa "substancial e persistente" piora da situação ajudará a manter o aumento de preços sob controle.

"Taxas de desemprego elevadas por longo período, aliadas às necessidades de ajustes fiscais bem como ao limitado espaço para ações de política monetária e à incerteza política, têm contribuído para redução nas projeções de crescimento das economias maduras", disse o Banco Central, acreditando que haverá muita volatilidade.

Velho ressaltou a afirmação do Copom que o aumento de crédito externo e o seu menor custo para o Brasil (porque o país cumpriu a meta de inflação pelo oitavo ano), a estabilidade macroeconômica e avanços institucionais contribuem para que os preços não subam como antes pelo lado da oferta, ou seja, as empresas teriam mais condições de se financiar com facilidade.

Brasil pode ter nova fase de financiamento externo

Economistas ouvidos pelo GLOBO destacaram uma palavra usada para qualificar modificações no sistema financeiro: "perene". Ou seja, o Brasil estaria entrando numa fase nova de financiamento externo. A política fiscal e o impacto dos superávits primários e a tendência decrescente para a relação entre dívida pública e o Produto Interno Bruto (PIB) teriam uma força ainda maior, segundo os analistas.

- Ficou claro que um corte substancioso no orçamento será anunciado em breve - afirma Eduardo Velho.

O Copom avalia que o consumo do brasileiro segue forte, em grande parte devido ao crescimento da renda e do crédito. Esse ambiente tende a prevalecer neste e nos próximos trimestres, por causa da redução dos juros feita desde agosto.

Já o economista da SulAmérica Investimento, Newton Rosa, manteve sua aposta de 9,5% ao ano para a reunião de abril. Ou seja, espera mais dois cortes de 0,5 ponto percentual:

- Creio que o BC irá nessa direção porque, em abril, já estaremos vivendo um aquecimento da economia e o Copom tem de ser mais moderado. Mas posso estar errado, pois o BC pode chegar a 9% ao ano, se as condições permitirem.