Título: Trilhões de crédito
Autor: Valente, Gabriela
Fonte: O Globo, 28/01/2012, Economia, p. 29

No Brasil, volume de empréstimos chegou a 49,1% do PIB em 2011, alta de 19%

Mesmo com o aumento dos juros no primeiro semestre e as medidas tomadas para conter a expansão dos financiamentos, o crédito no Brasil cresceu mais do que esperava o próprio governo. Ultrapassou, no ano passado, a marca de R$2 trilhões, um crescimento de 19% em relação a 2010, fortemente puxado pelo financiamento habitacional. Esse tipo de empréstimo bateu recorde no ano passado. As concessões aumentaram 128%. No fim de dezembro, R$200 bilhões em bancos públicos e privados financiavam a compra da casa própria. O volume de crédito alcançou 49,1% do Produto Interno Bruto (PIB), contra 46,7% em 2010.

- O ano passado foi o ano do crédito habitacional e ainda há espaço para crescer acima da média em 2012. Ainda é bastante modesto - analisou Maciel.

Ele admitiu que o mercado de crédito imobiliário ainda não se desenvolveu no Brasil, por causa da taxa de juros e da renda historicamente baixa do brasileiro.

A alta do crédito foi maior do que esperava o próprio Banco Central (BC). A expectativa era de alta de 17,5%, já acima do que a própria autoridade monetária classificava como adequado para o crescimento sustentável do país, que seria 17%. O cenário para este ano é diferente: os bancos estão mais cautelosos na hora de liberar empréstimo.

- A margem acima do esperado não é nada de extraordinário. Ficou ligeiramente acima do previsto. O importante é olhar para dentro dos números - disse o chefe do Departamento Econômico do BC, Túlio Maciel.

Na sua visão, o crescimento do crédito visto no ano passado não traz risco para a inflação, por ter sido mais direcionado para a atividade produtiva do que para o consumo. Maciel lembrou que, por causa das medidas do governo, o fechamento de novos contratos para financiamento de veículos caiu 15% no ano passado.

Juros estão em 37,1% ao ano

Com os cortes promovidos pelo BC na taxa básica de juros (Selic) desde agosto, os bancos diminuíram, na média, as taxas cobradas aos clientes em 1,4 ponto percentual para 37,1% ao ano em dezembro. No entanto, essa média é 2,1 ponto percentual maior em comparação ao que as instituições cobravam no fim do ano passado. Essas quedas recentes foram sentidas, principalmente, pelas empresas que conseguiram crédito mais barato.

Segundo o Banco Central, o crédito para as famílias encareceu mais do que o para pessoas jurídicas em 2011 por um motivo: a inadimplência. A da pessoa física iniciou 2011 em 5,7% e encerrou o ano passado em 7,3%. Já a das empresas saiu de 3,6% em janeiro para 3,9% em dezembro.

Esse é um dos motivos que levaram as instituições financeiras a ficarem mais exigentes na hora de emprestar, o que, na visão do BC, deve ter efeitos positivos sobre a inadimplência.

- É um dos fatores que vai fazer a inadimplência arrefecer daqui para frente.

Para analistas, o crescimento foi puxado, também, por operações do BNDES. De acordo com os dados do BC, do total de recursos direcionados (R$726 bilhões), o BNDES respondeu por 58,2%. Em seguida aparecem crédito imobiliário, com 25,7%, e rural, com 14%. Enquanto os recursos de crédito do BNDES cresceram 33,3% somente no mês de dezembro, na comparação com mesmo mês de 2010 o crédito do setor imobiliário aumentou 13,5%. A analista da Tendências Mariana Oliveira explicou que a taxa de crédito da habitação só começou a subir no fim de 2005 e, por isso, o crescimento é superior.

Na comparação internacional, o Brasil fica acima de membros dos Brics, como Rússia e Índia, mas ainda abaixo de outros do mesmo grupo, como China e África do Sul. Pela metodologia do Banco Mundial, que difere dos cálculos feitos pelo Banco Central brasileiro, o crédito interno ao setor privado no Brasil equivalia a 57% do PIB em 2010, acima dos 54% registrados em 2009. Na Rússia, essa parcela era de 45% em 2010, e na Índia, de 49%. Já a China expandiu o crédito, a ponto de já estar a 130% do PIB. E na África do Sul este é ainda maior: 145%.

Entre os países do G-8, a proporção do crédito ao setor privado é ainda maior. Chega a 204% no Reino Unido, a 202% nos Estados Unidos e a 169% no Japão. Na Itália, país com alto endividamento público, o crédito ao setor privado respondia por 123% do PIB em 2010. Na França, essa parcela era de 114% e na Alemanha, de 108%, segundo o Banco Mundial.

COLABORARAM Wagner Gomes e Paulo Justus