Título: Propostas para mudar rendimento da poupança já estão na mesa de Dilma
Autor: Beck, Martha;Valente, Gabriela
Fonte: O Globo, 29/01/2012, Economia, p. 46

Remuneração fixa é desafio à redução da taxa básica de juros no país

BRASÍLIA. A equipe econômica resolveu voltar a mexer num vespeiro e está analisando propostas para mudar a remuneração da poupança. O objetivo do governo é resolver o problema da remuneração fixa da caderneta, um tipo de indexação que vem dificultando a estratégia de corte de juros para estimular a economia. O martelo, porém, ainda não foi batido pela presidente Dilma Rousseff. Segundo técnicos do governo, entre as propostas em discussão está a retomada de uma tributação de contas de poupança com valores elevados, mas essa opção não resolve o problema da remuneração fixa da poupança. Outra opção seria atrelar a remuneração à taxa de juros.

Apesar de ter eliminado o fantasma da hiperinflação, o Brasil permanece amarrado a velhos instrumentos que eram usados para blindar contratos e aplicações de elevações excessivas de preços. A equação usada para calcular a remuneração da caderneta de poupança é um deles. Ela é considerada hoje o primeiro entrave para que o Banco Central (BC) reduza a Taxa Selic para um dígito.

A poupança tem um retorno fixo baseado na Taxa Referencial (TR) mais 6% ao ano. Já os fundos de renda fixa, por exemplo, ofertam um ganho que flutua segundo as taxas do mercado. Ou seja, se a Selic cai, a remuneração do fundo também recua. E o temor do governo é que os juros baixos provoquem uma forte migração de recursos para a poupança em busca de um retorno que já está garantido por lei. Isso gera desequilíbrios no mercado financeiro.

Segundo o vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel Ribeiro, uma entrada muito elevada de dinheiro na poupança poderia gerar problemas aos bancos, que são obrigados a aplicar 65% dos recursos da caderneta em habitação. Eles não teriam como cumprir a exigência sem afetar suas operações. Além disso, a saída de recursos dos fundos afetaria a gestão da dívida pública, já que boa parte deles é formado por títulos do governo.

- O importante é que haja um equilíbrio de forças entre a caderneta e os fundos de renda fixa. Os dois têm que ser atraentes - diz Ribeiro.

Tentativa anterior enfrentou forte reação em 2009

Em 2009, quando os juros estavam em 10,25%, o governo chegou a ficar preocupado e apresentou uma proposta que previa a cobrança de Imposto de Renda (IR) para depósitos acima de R$50 mil. A ideia provocou forte reação, e a equipe econômica foi acusada de tentar prejudicar os pequenos poupadores. Com a volta das pressões inflacionárias e da alta de juros, o assunto acabou esquecido temporariamente. Mas o fantasma reaparece com a Selic a 10,5%, com tendência de queda.

- A melhor saída seria mexer na poupança sem a pressão do tempo - diz Ribeiro. - A equipe econômica será criticada se falar em reduzir a remuneração da poupança quando ela estiver atraente.

Alessandra Ribeiro, economista da consultoria Tendências, concorda:

- Mexer quando os juros estiverem abaixo de 9% pode trazer forte resistência.

Os técnicos sabem disso e acham que a situação da poupança pode ser administrada com os juros até 9%. Mas o momento político acaba ficando cada vez mais complicado.