Título: Viagem a Cuba põe política de Dilma em xeque
Autor: Lage, Janaina
Fonte: O Globo, 02/02/2012, O Mundo, p. 33

Imprensa internacional questiona compromisso do governo com direitos humanos; especialistas criticam a visita

Adalberto Roque/AFP

A primeira visita de Dilma Rousseff como presidente a Cuba se converteu em um teste da política de direitos humanos do governo. A ausência do tema e os comentários sobre Guantánamo motivaram reportagens e questionamentos na imprensa internacional. Especialistas ouvidos pelo GLOBO argumentam que, ao concentrar a visita somente no estreitamento de laços econômicos e comerciais e em medidas de estímulo ao desenvolvimento da ilha, a presidente se colocou em uma saia justa por silenciar sobre os abusos no regime dos irmãos Castro.

A história pessoal de Dilma e o fato de Cuba ter testemunhado 12 dias antes da chegada da presidente a morte de mais um dissidente político - Wilman Villar Mendoza - aumentaram as expectativas de alguma menção ao tema.

- A viagem foi um erro. O objetivo era reforçar laços econômicos. É claro que você não pode deixar o empresariado desamparado, mas para isso o governo tem ministros. Uma líder política não pode se expor dessa maneira, o que ela talvez não se dê conta é que representa uma das maiores democracias do mundo - disse Marcos Azambuja, membro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais.

No seu entender, Dilma deve ter tratado de assuntos como liberdade de entrada e saída do país durante o encontro fechado com o presidente Raúl Castro. Ele avalia, no entanto, que as menções a Guantánamo, embora representem uma crítica válida, seriam mais adequadas em uma visita aos Estados Unidos.

Para Maurício Santoro, do CPDOC/FGV, a ausência de comentários sobre as violações de direitos humanos em Cuba desagrada parte da sociedade, que cobra atuação mais assertiva da política externa brasileira sobre o tema.

- Os comentários sobre Guantánamo reforçam um padrão de dois pesos e duas medidas. Existem alguns países que o Brasil critica na questão de direitos humanos, como EUA e Irã. Outros não sofrem esse tipo de crítica, e normalmente são governos de esquerda da América Latina, como Cuba e Venezuela. Se o país quer ter um papel de líder internacional, vai precisar de uma estratégia de direitos humanos e democracia mais sólida em sua política externa.

Ao mesmo tempo, Santoro avalia que, do ponto de vista econômico, Cuba desempenhará papel fundamental para o Brasil na próxima década, quando ocorrer de fato a transição no país.

É justamente esse o foco da reportagem do "Wall Street Journal" sobre a visita. Para o jornal, a viagem marca a maior tentativa do Brasil de transformar sua economia em expansão em liderança diplomática na América Latina. O jornal destaca, no entanto, que ainda não está claro o quanto Dilma está disposta a empurrar Cuba rumo a uma sociedade democrática e lembra que ela se recusou a encontrar dissidentes.

Já o argentino "La Nación" escreve: "Em Cuba, Dilma evita o assunto mais sensível", exaltando a decepção dentro e fora da ilha com a presidente.

No site do "El País", a área de debates trazia a pergunta: "Por que a presidente do Brasil ignora os direitos humanos em sua visita a Cuba?" As respostas incluíam desde o caráter romântico que o regime cubano tem para a esquerda como cobranças de que Dilma mantenha a promessa de ser sempre intransigente na defesa dos direitos humanos.