Título: Romaria a Brasília para proteção contra importados
Autor: Bôas, Bruno Villas
Fonte: O Globo, 03/02/2012, Economia, p. 27

Calçadistas já planejam fábrica na Argentina, diante da dificuldade na exportação. Acordo com o México ameaçado

Eliane Oliveira, Mônica Tavarese Paulo Justus

BRASÍLIA e SÃO PAULO. A possibilidade de o Brasil aumentar em cem itens os produtos que podem ter a tarifa de importação elevada em até 55% no comércio fora do Mercosul já provoca uma romaria de representantes de diversos setores a Brasília para pedir proteção. São exemplos os segmentos de eletroeletrônicos, carne suína, vinhos, arroz, leite, achocolatados, doces e tratores.

O presidente da Associação Brasileira da Indústria Eletrônica (Abinee), Humberto Barbato, reuniu-se ontem com o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, para reivindicar a elevação, de 14% para 35%, das tarifas de importação de equipamentos de geração, transmissão e distribuição de energia. Segundo ele, os chineses que estão investindo no Brasil estão dando preferência a importados. Como consequência, as compras externas desses produtos subiram 56%.

- É um sinal claro de desindustrialização da indústria nacional - afirmou Barbato.

Semana passada, produtores de diversas áreas procuraram o Ministério da Agricultura com o mesmo objetivo, só que contra os vizinhos sul-americanos.

O presidente da Comissão Nacional de Pecuária de Leite da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Rodrigo Alvim, disse que há problemas no comércio do setor com o Uruguai. Em dezembro, foram importadas do país vizinho mais de cinco mil toneladas de leite em pó.

Os produtores brasileiros de arroz sofrem concorrência da Argentina, do Uruguai e do Paraguai, disse o presidente da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Arroz, Francisco Lineu Shardong. Em 2011, o setor chegou a exportar dois milhões de toneladas de arroz beneficiado para 55 países. Mas este resultado só foi possível por causa de mecanismos de incentivo brasileiros.

- Temos de começar a responder, impor restrições - disse Shardong, acrescentando que o arroz importado é até 45% mais barato do que o nacional.

Exportadores defendem retaliação brasileira

O presidente da Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (Abipecs), Pedro Camargo Neto, reclamou da regra argentina de pré-autorização de importações.

- Todo o comércio está parado no Mercosul. Por quanto tempo? - perguntou, defendendo a retaliação.

De acordo com Benedito Rosa, da Secretaria de Relações Internacionais do Ministério da Agricultura, a lista de cem produtos foi aprovada pelo Mercosul. Ele explicou que assim que cada país fechar a relação de seus itens, as listas serão analisadas pelo conselho de ministros do bloco.

O governo brasileiro estuda uma resposta à mais nova medida protecionista argentina. A ideia é impor restrições às importações de produtos vendidos ao Brasil.

- Vamos nos reunir para ver se vamos ter de produzir sapatos lá (Argentina) para poder continuar exportando. Nós e outras empresas estamos pensando nisso. Algumas já estão em estágio avançado, alugando prédios. São empregos que poderiam ser gerados no Brasil - disse Paulo Grings, diretor-presidente da Piccadilly.

Já a Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit) procura negociar com a Federação da Indústria Têxtil Argentina para que a nova medida não seja cobrada de parceiros comerciais do Mercosul. A entidade também pressiona o governo brasileiro para que atue energicamente contra as barreiras do país vizinho.

O Brasil também ameaça romper o acordo automotivo com o México, em vigor desde 2002, para forçar o país a ampliar o tratado e abrir seu mercado a todas as categorias de produtos. A medida faz parte da estratégia brasileira de pressionar os mexicanos a importarem, principalmente, químicos e produtos agropecuários e, ao mesmo tempo, demonstrar insatisfação com o andamento do tratado.

Sempre houve resistência do México em expandir o acordo, embora, desde o início, houvesse um entendimento de que o comércio bilateral passaria por um processo de abertura para, ao menos, mil itens. Com a exclusão do México do aumento do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre carros importados, há um déficit do lado brasileiro de US$ 1,5 bilhão somente no comércio de veículos.

- A negociações para ampliar o acordo não foram suspensas, mas não estamos nem um pouco satisfeitos com a situação - disse uma fonte do governo.