Título: Ministros crescem os olhos
Autor: Pariz, Tiago
Fonte: Correio Braziliense, 08/09/2009, Política, p. 4

Titulares de pastas que não seriam beneficiadas com a extração do petróleo em águas superprofundas articulam para ter acesso aos recursos por vias indiretas.

Para Márcio Fortes, o combate à pobreza, previsto no Fundo Social, pode incluir obras de saneamento

Não são apenas os deputados os interessados em pinçar fatias do pré-sal. Ministros que ficaram de fora da partilha dos recursos difundem a tese de que a expressão ¿combate à pobreza¿ permite abarcar todo tipo de investimento. Titular da pasta das Cidades, Márcio Fortes (PP-RJ) entende que programas de habitação e saneamento básico, por exemplo, poderiam ser financiados com o lucro que emergir da exploração de petróleo em águas profundas. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva estabeleceu, ao prever um Fundo Social, cinco áreas para aplicar os lucros do petróleo da camada pré-sal: educação, ciência e tecnologia, cultura, defesa do meio ambiente e combate à pobreza.

No entendimento do ministro, a expressão combate à pobreza foi colocada justamente para atender demandas de outras pastas. Fortes sustenta que uma das maneiras de reduzir os índices de pobreza é garantir habitação e proporcionar rede adequada de coleta e tratamento de esgoto. ¿Consta do pré-sal que o dinheiro será usado também para atacar a pobreza, e o combate à pobreza passa por habitação e saneamento¿, argumentou.

Enquanto uns estão ansiosos por sua parte de um recurso que começará a irrigar o tesouro da União somente em médio prazo, outros, contemplados explicitamente pela proposta, estão mais comedidos. O ministro da Educação, Fernando Haddad, disse que ainda não fez o cálculo de qual parcela terá a seu dispor. ¿Não fiz a conta¿, limitou-se a dizer.

A nova riqueza localizada numa profundidade de até 7 mil metros no fundo do mar é vista como uma das justificativas para a compra de 50 helicópteros, 36 aeronaves e cinco submarinos da França. ¿É preciso equipar as Forças Armadas porque proteger o pré-sal é importante¿, sustentou Celso Amorim, ministro das Relações Exteriores. Os ministros fizeram os comentários depois do desfile da Independência, na Esplanada dos Ministérios. A comemoração teve como convidado especial o presidente da França, Nicolas Sarkozy. Ele veio ao Brasil para assinar os acordos militares.

Aposentados Os deputados também estão ávidos pelos recursos da futura produção petrolífera. Emendas apresentadas aos quatro projetos que tratam do novo marco regulatório destinam o dinheiro para programas de saúde, esportes, segurança e até para aumento aos aposentados. O governo, ao que tudo indica, não tem intenção de aumentar o escopo dos programas contemplados pelo Fundo Social. Na avaliação de um ministro, permitir essa discussão poderia criar um novo impasse para as votações dos projetos. Até agora, a discussão sobre a partilha dos royalties ¿ gratificação paga aos estados e municípios produtores pela extração do petróleo ¿ tem causado estresse suficiente para Lula.

O líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), que deve ser o relator do projeto de lei do novo marco regulatório, disse que a questão dos royalties ficará para um segundo momento. ¿Vamos deixar como está agora, para voltar a debater em outro momento. Esse dinheiro só sairá daqui 6 ou 8 anos, não há razão para fazer a discussão agora¿, disse o peemedebista. Ele negocia uma reunião com os governadores Sérgio Cabral (Rio de Janeiro), Paulo Hartung (Espírito Santo) e José Serra (São Paulo) para aparar arestas. O esforço é voltado para ganhar o apoio das bancadas de parlamentares dos três estados na votação dos projetos.

Dívida social O Fundo Social será vinculado à Presidência da República e receberá parte dos recursos gerados com a produção do petróleo da camada pré-sal. A poupança será abastecida com recursos de três frentes. Primeiro, o dinheiro pago pelas empresas que ganharem licitações. Segundo, uma porcentagem dos royalties. E, por último, uma parcela dos lucros. O fundo foi concebido para financiar projetos sociais. O presidente Lula diz que a poupança tem o papel de resgatar a dívida social que o governo tem com a população.