Título: Cai um dogma na licitação de aeroportos
Autor:
Fonte: O Globo, 04/02/2012, Opinião, p. 6

Salvo impedimentos de última hora, o leilão de concessão de três grandes aeroportos (Guarulhos, Campinas e Brasília), programado para esta segunda- feira, deverá ser um grande sucesso.

Onze consórcios entregaram à Bovespa envelopes com suas propostas, acreditando-se que, com isso, haverá uma acirrada disputa.

Os consórcios englobam grandes companhias brasileiras dos ramos da construção pesada e da engenharia, que já acumulam boa experiência na administração de rodovias e terminais portuários. Integram esses consórcios grupos que operam aeroportos no exterior, com grande eficiência.

Depois do leilão, certamente ficará no ar a pergunta: por que não fizemos isso antes? Diante do enorme crescimento da demanda por transporte aéreo no Brasil e dos problemas enfrentados nos últimos anos, estava mais do que evidente que o antigo modelo de infraestrutura aeroportuária, baseado em uma única companhia 100% estatal, havia caducado.

O modelo foi concebido com a premissa que os aeroportos mais rentáveis poderiam financiar investimentos e manutenção de outros com menos movimento, sem receitas suficientes para se autossustentar.

A longa crise nas finanças públicas impedia que o Tesouro fizesse aportes de capital substanciais na empresa estatal, a Infraero, de modo que o próprio sistema de infraestrutura aeroportuário teria que gerar nele mesmo as receitas para se viabilizar.

Esse modelo funcionou aos trancos e barrancos, pois exigia um grau de agilidade gerencial impossível de ser alcançado por uma estatal como a Infraero, sujeita a procedimentos demorados e burocráticos, além de influências políticas repulsivas.

Por outro lado, o regime de concessões se mostrava mais eficaz em uma série de serviços públicos, especialmente nas áreas de transportes terrestres (rodovias e ferrovias) e terminais portuários.

No entanto, o regime de concessões não pode ser desatrelado do rol das privatizações, alvo da ira do PT e de seus aliados por muito tempo.

Nos setores de infraestrutura (como energia elétrica, telecomunicações, rodovias e ferrovias), o governo Lula até deu continuidade às concessões de serviços públicos, mas sempre procurando enfatizar que o modelo tinha sido "aprimorado" — o que também seria óbvio, pois houve um aprendizado com o passar dos anos, e a experiência indicava falhas e necessidades de aperfeiçoamento.

Mas, no caso dos aeroportos, a insistência em se manter o modelo estatal corporativista até destoava na matriz de transportes, chegando às raias do absurdo. O risco de um vexame internacional nos grandes eventos que serão realizados no país nos próximos anos parece ter quebrado essa resistência. O país testará agora um novo modelo, híbrido, com participação minoritária da Infraero. São muitos os exemplos de aeroportos sob concessão bem administrados ao redor do mundo, de modo que não estaremos reinventando a roda.

Para a Copa do Mundo de 2014, talvez já não seja possível que a mudança de modelo produza os resultados esperados. Mas certamente com ele será mais fácil pôr em prática ajustes emergenciais que evitem o vexame.