Título: Petrobras tomba na Bolsa após teleconferência atrapalhada
Autor: Bôas, Bruno Villas
Fonte: O Globo, 15/02/2012, Economia, p. 24

Ações caem quase 5% depois de empresa reconhecer possível erro no balanço

ALMIR BARBASSA: "Estamos revendo informações porque de fato os dados não estão consistentes"

MUDANÇAS NA ESTATAL

Menos de uma semana após registrar sua maior queda em mais de três anos na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), as ações da Petrobras voltaram a apresentar fortes perdas ontem, por causa de uma teleconferência de executivos da Petrobras com analistas financeiros, considerada pelo mercado "atrapalhada". Sem convencer seus investidores sobre as razões que levaram ao decepcionante balanço de quinta-feira passada, quando divulgou um lucro líquido de R$ 5,049 bilhões no quarto trimestre de 2011, bem abaixo das expectativa do mercado (de R$ 9 bilhões a R$ 10 bilhões), a Petrobras viu seus papéis preferenciais (PN, sem voto) recuarem 4,72%, a R$ 23,21. Já as ações ordinárias (ON, com voto) tombaram 4,23%, a R$ 24,89. Investidores estrangeiros bateram em fuga dos papéis da estatal, que lideraram as perdas da Bolsa.

Na teleconferência, realizada pela manhã, o diretor Financeiro da Petrobras, Almir Barbassa, reconheceu que a companhia pode ter cometido um erro em seu balanço trimestral (ITR). A empresa suspeita ter trocado números específicos relacionados a serviços e custos de estoque nos três últimos meses do ano passado. Esse erro havia sido cogitado em um relatório do banco BTG Pactual.

- Não tem lógica o custo de serviços chegar a R$ 22 bilhões, saindo de R$ 4 bilhões no início do ano, enquanto caiu significativamente o custo do estoque, de uma média de R$ 20 bilhões para R$ 10 bilhões apresentados no quarto trimestre - reconheceu Barbassa. - Estamos revendo a informação de onde saíram aqueles números (de custo de serviços), porque de fato os dados não estão consistentes.

O diretor acrescentou que a companhia está fazendo "uma degustação melhor" do possível erro do balanço e que "vai esclarecer a questão quanto tivermos o número correto".

Companhia planeja venda de ativos no semestre

Segundo Erick Scott, analista da SLW Corretora, o impacto que o erro de cálculo provocou no resultado trimestral da companhia permanece incerto.

- Vamos ter que aguardar uma possível correção. Mas chama atenção uma empresa do porte dela errar conta em balanço - comentou Scott.

Mas o possível erro não foi o único tema da teleconferência a decepcionar o mercado. Os analistas questionaram a falta de detalhamento da companhia sobre um programa de venda de ativos a ser realizado no primeiro semestre deste ano. Na teleconferência, Barbassa afirmou que a Petrobras vai vender ativos "de alto valor" numa tentativa de liberar cerca de US$ 13,6 bilhões para investimentos na exploração de produção de petróleo em águas ultraprofundas. Isso incluiria uma refinaria no Japão e áreas de exploração no Brasil e no exterior.

- Vender ativos não é algo necessariamente ruim. O problema é que não foi dito o que exatamente será vendido, o que foi mais um fator de incertezas para investidores - explica Eduardo Oliveira, operador da Um Investimentos.

Com o inferno astral da Petrobras nos últimos dias, o valor de mercado da companhia encolheu em R$ 32,47 bilhões desde a quinta-feira passada, quando divulgou seu balanço, terminando o pregão de ontem a R$ 315 bilhões. Essa queda equivale ao valor de mercado de uma BRF-Brasil Foods (R$ 30 bilhões).

Para Ricardo Correa, analista da Ativa Corretora, os investidores estrangeiros começam a questionar o que efetivamente muda na gestão da empresa com a saída de José Sergio Gabrielli da presidência da companhia e a posse de Maria das Graças Foster, ex-diretora de Gás e Energia da Petrobras, que assumiu o cargo na segunda-feira passada.

- O que vimos hoje (ontem) foi uma demonstração de que pouca coisa mudou. O mercado tinha comprado até recentemente uma expectativa de que a gestão da companhia melhoraria com uma técnica de carreira na presidência - avalia Correa.

Bovespa cai e dólar sobe em dia de aversão ao risco

O tombo da Petrobras pressionou ontem a Bovespa para uma queda maior, num dia de perdas nos mercados externos. O Ibovespa, índice de referência da Bovespa, recuou 0,99%, aos 65.038 pontos. Somente a Petrobras retirou cerca de 225 pontos do índice.

No mercado internacional o corte da nota de classificação de risco de Espanha, Itália e Portugal na noite de segunda-feira e um resultado decepcionante das vendas do varejo americano pesaram sobre as Bolsas. Na Europa, fecharam em baixa Londres (0,10%), Paris (0,26%), Frankfurt (0,15%) e Madri (0,19%). Em Wall Street, o Dow Jones ficou praticamente estável, em alta de 0,03%. Na mesma linha, o Nasdaq subiu 0,02%

Para Marcio Noronha, analista técnico da Gradual Investimentos, os mercados seguem em tendência de alta a médio e longo prazos. Segundo ele, o Ibovespa pode buscar os 70 mil pontos caso consiga superar uma resistência - patamar em que investidores vendem ações para embolsar os lucros - na faixa de 66.383 pontos.

- O mercado sobe em zigue-zague e não em linha reta - afirmou Noronha.

No mercado cambial, o dólar comercial teve uma leve alta de 0,34%, cotado a R$ 1,721, acompanhando o desempenho das principais moedas no mercado internacional.