Título: Governo usará BB e Caixa para baixar juros
Autor: Valente, Gabriela; Beck, Martha
Fonte: O Globo, 17/02/2012, Economia, p. 27

Objetivo é estimular concorrência entre bancos para reduzir o "spread" cobrado nos empréstimos ao consumidor

BRASÍLIA e SÃO PAULO. O governo federal usará os bancos públicos para forçar uma queda generalizada dos juros no país. O movimento orquestrado pelo Palácio do Planalto será muito mais forte que o ocorrido em 2008, quando o governo estimulou o crédito para blindar o Brasil dos efeitos da crise financeira global. A ordem, que partiu da própria presidente Dilma Rousseff, é usar os bancos públicos para derrubar os spreads - diferença entre o custo de captação do dinheiro e o que as instituições cobram dos clientes - criando uma concorrência no setor nunca vista.

Tanto no Banco do Brasil (BB) quanto na Caixa Econômica Federal, os diretores estudam como fazer isso sem tirar a rentabilidade dos acionistas dessas instituições. Mas já preparam um grande anúncio.

- Será um movimento grande de mercado, e o Banco do Brasil está disposto a entregar o que a presidente pediu - disse uma fonte do BB, acrescentando que a redução das taxas cobradas dos clientes será anunciada em um grande evento, ainda sem data. - Será algo muito forte e de impacto imediato.

Na semana passada, O GLOBO revelou que Dilma encomendara à equipe econômica estudos sobre o alto custo dos empréstimos no Brasil, mesmo num momento em que o Banco Central (BC) reduz a taxa básica (Selic). Esses estudos começaram a ser feitos no mês passado. Uma sinalização do BC de que manterá as taxas em queda, deixando-as mais próximas do padrão internacional, deu ainda mais força ao projeto da presidente Dilma.

O que ainda está sendo fechado pelas instituições públicas é a equação capaz de promover uma redução significativa nos juros sem derrubar a rentabilidade dos acionistas. Uma das alternativas é aumentar a base de clientes por meio da elevação da oferta de crédito. Para isso, a estratégia será injetar mais capital nos bancos públicos, de forma que eles possam agir mais agressivamente no mercado, dentro dos conceitos atuais de segurança, o chamado índice de Basileia (que define que, para cada cem reais emprestados, o banco precisa de uma reserva própria de R$ 11).

Estimativas preliminares dos técnicos indicam que, juntos, BB e Caixa precisariam de, pelo menos, R$ 15 bilhões para emprestar mais e alavancar o crescimento do país. Esse montante é semelhante ao aportado nessas instituições em 2009 e 2010.

Cadastro positivo e redução de tributos em estudo

O BB, por exemplo, pretende atuar fortemente em 2012 para ofertar crédito a oito milhões de consumidores das classes C, D e E, que já são clientes mas tomam financiamentos na concorrência, como empréstimos consignados, por exemplo. O início das operações com o Banco Postal - correspondente bancário que funciona nas agências dos Correios - é um dos canais estudados. Crescer entre a população de renda mais baixa está entre as diretrizes para este ano.

Segundo fontes do governo, o plano é colocar no mercado R$ 52 bilhões, incluindo aumento de limite para cheque especial, CDC, imóveis e veículos, além do desconto em folha de pagamento.

Outras medidas que estão no cardápio: a regulamentação do chamado cadastro positivo (que reúne os bons pagadores e poderia ajudar os bancos a darem tratamento diferenciado a cada cliente) e uma redução de tributos que incidem sobre o crédito, como Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e PIS/Cofins.

Segundo dados do BC, consolidados pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), cerca de 30% do spread cobrado pelos bancos decorrem da inadimplência. Os impostos diretos correspondem a pouco mais de 20%. Já a margem líquida de lucro das instituições financeiras, mais erros e omissões, somam 32% do diferencial de taxa de juros no Brasil.

Em janeiro, as taxas de juros para a pessoa física registraram a segunda queda consecutiva, segundo a Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac). A taxa média para pessoas físicas caiu 0,18 ponto percentual ante dezembro, a 6,4% ao mês ou 110,52% ao ano. É o menor patamar de juros desde o início da série histórica, iniciada em 1995.

A maior queda entre as modalidades de crédito ao consumidor analisadas pela entidade ocorreu nos juros do comércio, que caíram de 5,36% para 5,05% ao mês em janeiro. Segundo a Anefac, essa redução indica que as empresas tiveram de baixar os juros cobrados do consumidor devido às vendas fracas no começo do ano, que concentra despesas como IPTU, IPVA e parcelamento das compras de Natal.

Só juro do cartão de crédito não caiu em janeiro

Das seis linhas de crédito pesquisadas, apenas o cartão de crédito rotativo não recuou, ficando estável em 10,69% ao mês ou 238,3% ao ano em janeiro. Essa modalidade ainda tem os juros mais altos, seguida do empréstimo pessoal das financeiras, de 8,29% ao mês (184,26% ao ano) em janeiro.

Para a pessoa jurídica, a taxa média de juro caiu 0,08 ponto percentual em janeiro, a 3,79% ao mês ou 56,27% ao ano. Para a Anefac, essa queda é reflexo do corte da Selic pelo BC da redução do IOF.

De dezembro de 2010 a janeiro de 2012, a Selic caiu 0,25 ponto percentual, de 10,75% para 10,50% ao ano. No mesmo período, a taxa de juros média para pessoa física recuou 9,45 pontos percentuais, de 119,97% para 110,52% ao ano. Para a pessoa jurídica a queda foi de 0,18 ponto percentual, de 56,45% para 56,27% ao ano.

COLABOROU Paulo Justus