Título: Repórter americana se sentia alvo no front
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Fonte: O Globo, 23/02/2012, O Mundo, p. 29

Marie Colvin já perdera olho no Sri Lanka

LONDRES. "Ela não tinha medo e ia sempre ao coração da notícia, não importa o quão perigoso. Ela sacrificou muitas coisas pelo seu trabalho. Viveu por ele e morreu por ele." Com essas palavras, o editor da seção internacional do jornal britânico "Times", Richard Beeston, definiu a morte da jornalista Marie Colvin.

Marie tinha 55 anos. Nasceu nos Estados Unidos, onde se formou em Yale e iniciou a carreira na agência de notícias UPI, mas desde 1985 trabalhava para o "Times" e o "Sunday Times", especializando-se em Oriente Médio e na cobertura de conflitos armados por todo o planeta.

Num deles, no Sri Lanka, em 2001, atingida por estilhaços de uma granada, Marie perdeu o olho esquerdo, e desde então passou a usar um tapa-olho preto. O acidente, porém, não a impediu de continuar o seu trabalho: na mesma semana, enviou um relato de 3 mil palavras para a edição dominical do "Times" sobre a guerra civil no Sri Lanka.

Ela também cobriu guerras no Zimbábue, no Kosovo, na Chechênia e em diferentes países do Oriente Médio, inclusive na Líbia no ano passado. Mas, numa entrevista dada à CNN horas antes da sua morte, ela qualificou o conflito sírio como o "pior" no qual ela já trabalhara.

- Em boa parte por causa da segurança pessoal. Não há para onde correr: o Exército sírio está controlando todo o perímetro. E há muito mais bombas sendo jogadas nesta cidade e nenhuma maneira de prever onde elas vão cair - disse ela na entrevista.

Colecionadora de prêmios - duas vezes eleita correspondente internacional do ano pela associação britânica de jornalistas - Marie era ciente do risco que ela e seus colegas corriam.

- Nossa missão é reportar os horrores da guerra com precisão e sem preconceitos. Mas sempre temos que nos perguntar se a história que vamos contar vale o risco que corremos. O que é coragem e o que é irresponsabilidade? Nunca foi mais perigoso ser um correspondente de guerra, porque o jornalista numa zona de combate se tornou alvo - afirmou num discurso em 2010, em homenagem a colegas mortos no front.

Na sua última reportagem, Marie relatou como entrou ilegalmente na Síria por uma rota usada por contrabandistas, e como foi recebida com festa em Homs por pessoas ávidas para que um correspondente estrangeiro levasse a verdade do que acontecia no local para fora dali.

"A escala da tragédia humana nesta cidade é imensa. Seus habitantes estão vivendo em terror. Quase todas as famílias parecem ter visto alguém amado ser morto ou ferido", escreveu.

Em entrevistas a rádios e TVs, Marie vinha cobrando uma intervenção da comunidade internacional para deter a matança.

Também morto no bombardeio em Homs, o francês Rémi Ochlik tinha 28 anos e trabalhava como fotógrafo em zonas de conflito desde os 20, quando estreou no Haiti. Recentemente, ganhara o primeiro prêmio na categoria notícias gerais do prestigioso World Press Photo por uma foto feita no ano passado na Líbia. Ele estava na Síria trabalhando para a revista francesa "Paris Match".