Título: Saúde de Chávez traz incerteza ao país
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Fonte: O Globo, 23/02/2012, O Mundo, p. 29
Presidente da Venezuela será operado em Cuba, admite necessidade de radioterapia e diz que precisará repensar a agenda
MULHER LÊ um jornal com a foto de Chávez: para aliados, não é necessário delegar poderes a interino
Fernando Llano/AP
CARACAS. A pouco mais de sete meses da eleição presidencial de 7 de outubro, o anúncio do presidente Hugo Chávez de que terá de se submeter a uma nova cirurgia em Havana trouxe ainda mais incerteza e comoção para um país de atmosfera política carregada. No que se desenha como a campanha mais desafiadora para Chávez desde que chegou ao poder, em 1999, críticos e especialistas já se perguntam se, desta vez, ele delegará poder ao vice-presidente, Elías Jaua, ou a algum outro aliado, interinamente, enquanto estiver sob tratamento. Há dúvidas também sobre sua capacidade de enfrentar a dura rotina de uma campanha presidencial. Na noite de terça-feira, o próprio Chávez admitiu que precisará de mais cuidados depois que os médicos detectaram um novo tumor (ao qual se referiu apenas como lesão) no local onde havia sido tratado de câncer no ano passado. Ele mesmo reconheceu que há uma grande probabilidade de a lesão ser maligna.
- Lamentavelmente digo, e me dá muita dor dizê-lo, não vou poder seguir com o ritmo que estava seguindo e aumentando, principalmente em dezembro, janeiro e fevereiro; não vou poder! Estou obrigado a lidar com esta nova circunstância, a repensar minha agenda pessoal e me cuidar para enfrentar o que tiver que enfrentar - disse.
O presidente informou que se a lesão for maligna precisará de radioterapia. De acordo com médicos, o tratamento mínimo nestes casos requer dez dias de sessões. Chávez se encontrou ontem com aliados e começou a organizar a viagem a Cuba, que deve ocorrer entre amanhã e sábado, segundo um dos políticos mais próximos do mandatário, Diosdado Cabello, presidente da Assembleia Nacional. Cabello negou que Chávez precise passar o poder ao vice-presidente durante sua ausência para se tratar de uma lesão com dois centímetros de diâmetro. Ele indicou que o presidente pedirá a permissão do Parlamento para ficar mais de cinco dias fora do país:
- Temos dado todo o apoio no Partido Socialista para que faça os exames, durante o tempo necessário, sem restrições.
Capriles deseja, no Twitter, vida longa e rápida melhora
O ministro da Informação, Andres Izarra, também foi solidário:
- Nossa mensagem é de unidade e fé que o presidente Chávez triunfará sobre os últimos obstáculos que a vida colocou em seu caminho. Sua conexão com o povo vai ajudá-lo a superar seu problema de saúde - disse o ministro, que havia atribuído os rumores de piora de Chávez à "guerra suja da canalha", em referência à oposição.
A confirmação de que seu estado de saúde é delicado veio no pior momento possível: após a vitória com participação superior ao previsto do governador de Miranda, Henrique Capriles, nas primárias da Mesa de Unidade Democrática. Capriles, que aposta em uma campanha sem confronto direto com Chávez, baseada em bandeiras como educação e empregos, fez um cuidadoso comentário no Twitter. "Ao meu competidor, como filho de Deus que sou, desejo uma operação de sucesso, uma recuperação rápida e uma longa vida".
No mercado financeiro, ávido por uma economia mais pró-mercado, os títulos da Venezuela tiveram leve alta. Um relatório do Barclays Capital ajuda a explicar a alta. "Em nossa opinião, a probabilidade de que Chávez não possa ser candidato aumentou depois do anúncio".
Do ponto de vista político, a doença de Chávez complica ainda mais o cenário, segundo Cynthia Arnson, analista do Woodrow Wilson International Center, em Washington:
- Está agora claro que o câncer de Chávez está longe de ser curado. A doença de Chávez, sua habilidade de fazer campanha, de governar, tudo isso representa um grande fator na disputa. Isso desgasta a aura de invencibilidade e de inevitabilidade que ele sempre tentou criar.
Médicos dizem que é difícil avaliar o prognóstico de Chávez, mas para Javier Cebrian, especialista em câncer colorretal e chefe de cirurgia do Hospital Universitário de Caracas, a lesão no mesmo local não é um bom sinal:
- Uma recorrência local é um mau sintoma porque significa que a enfermidade está crescendo novamente.