Título: Inexiste cenário fácil para a Grécia
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Fonte: O Globo, 23/02/2012, Opinião, p. 6
De tão esperada, podia-se imaginar que a batida de martelo dos ministros de Finanças do bloco do euro em torno de mais um pacote de ajuda à Grécia, crucial para o país não naufragar numa quebra financeira sem controle, num default selvagem, seria recebida com razoável ânimo nos mercados. Não foi o que aconteceu.
Anunciada, na madrugada de terça, em Bruxelas, depois de 13 horas de discussões, a concordância com a liberação de 130 bilhões aos gregos não conseguiria animar os pregões europeus no decorrer do dia. Ao contrário, as bolsas fecharam em queda. Mesmo que, nesta nova rodada de negociações, os gregos tenham conseguido um desconto dos bancos credores de 53,5% no valor de face dos títulos que detêm. Este é, por enquanto, o tamanho do calote.
E faz sentido a precaução, pois a Grécia, um dos primeiros membros da área do euro na União Europeia a, em 2009, emitir sinais preocupantes nas contas externas e internas, há algum tempo passou da fase em que se pode esperar que um pacote desses de ajuda, por si só, resgate o país. A linha de crédito aberta para os gregos é essencial, mas não resolve tudo. Daí a reação fria.
No início de 2010, insolvente, a Grécia conseguiu, junto à UE e ao Fundo Monetário Internacional (FMI), 110 bilhões. Não foram suficientes, e há quem considere o novo pacote fadado ao mesmo destino.
Para se habilitar à ajuda, o país se obriga a entrar em duro regime de contenção de despesas públicas, cuja expansão desmedida e descontrolada levou a Grécia à bancarrota.
Assim como em Portugal, Espanha e Itália, outros dos companheiros de infortúnios fiscais, a Grécia passou por uma reviravolta política. Substituído o governo do socialista Papandreu por uma ampla coalização liderada pelo economista Papademos, os gregos tentam sair da crise com uma equipe mais "tecnocrata", menos "política".
Mesmo assim não será fácil. Os ajustes são proporcionais à farra que os gregos viveram no ciclo do dinheiro fácil: demissão de milhares de funcionários públicos - cerca de 20% da população são de servidores -, corte de salários, incluindo o mínimo, e de aposentadorias. A Grécia é um exemplo retumbante do que pode acontecer com uma "nação cigarra", aquela que não se preocupa com o futuro, esquece de trabalhar no verão para ter como sobreviver no inverno.
Serve de alerta para o Brasil, onde também é possível se aposentar cedo, a máquina pública é cara, emperrada e retribui pouco para a sociedade. E é porque o ajuste, por definição impopular, corta fundo no Estado e contraria enraizados interesses corporativistas que há analistas céticos com a efetiva execução das mudanças, necessárias para que a ajuda aprovada seja liberada, e mesmo assim o será etapa por etapa, à medida que o programa de ajuste seja implementado.
Enquanto transcorre o drama europeu e, dentro dele, a tragédia dos gregos, cresce a discussão em torno da melhor terapia para resgate dos países: incentivos ao crescimento ou austeridade. Na verdade, uma coisa não elimina a outra. Mas é ilusório achar que se sai de uma crise como esta sem sinalizar a possibilidade de um equilíbrio fiscal no futuro.