Título: Serra entra na disputa, e prévias são adiadas
Autor: Amorim, Silvia
Fonte: O Globo, 29/02/2012, O País, p. 9

Executiva tucana aceita candidatura de ex-governador e escolha do nome do partido à prefeitura de SP fica para 25 de março

ELEIÇÕES 2012

SÃO PAULO. Com um conteúdo de forte conotação nacional, o ex-governador José Serra entregou ontem ao PSDB a carta que oficializou a sua entrada na disputa pela vaga de candidato a prefeito da capital paulista. No trecho mais polêmico do texto, Serra diz que a eleição deste ano será uma disputa entre "duas visões distintas de Brasil", transformando o pleito numa espécie de terceiro turno da eleição presidencial.

Numa sala do diretório municipal do PSDB, lotada de vereadores e correligionários, ele defendeu a realização das prévias. A direção do partido se reuniu ontem à noite, e, em reunião tensa, adiou, por 10 votos a favor e oito contra, a escolha do candidato à prefeitura paulistana do dia 4 para o dia 25 de março. Embora dois pré-candidatos tucanos tenham abandonado o páreo, outros dois, o secretário estadual José Aníbal e o deputado Ricardo Tripoli, continuam dispostos a enfrentar o ex-governador.

- São Paulo é a maior cidade do Brasil e é aqui neste ano que se travará uma disputa importante para o futuro do município, do estado e do país. Uma disputa entre duas visões distintas de Brasil, duas visões distintas de administração dos bens coletivos, duas visões distintas de democracia, duas visões distintas de respeito aos valores republicanos - disse Serra, ao ler a carta entregue ontem ao partido.

Na carta, ele conta que, até algumas semanas atrás, a disposição dele era ficar concentrado no "trabalho político" e nas "questões nacionais". Mas, depois de receber diversas manifestações de integrantes do PSDB e até mesmo de dirigentes de outros partidos, aceitou o chamamento político:

- Para mim, a política não é uma atividade privada, objeto apenas de vontade e do desejo pessoal. Aprendi, ao longo da vida, que a ação e os movimentos políticos são também subordinados às circunstâncias, à conjuntura, ao momento.

Motivado pelos "dissabores de uma força política"

Em outra referência ao cenário nacional, Serra disse que o "avanço da hegemonia de uma força política" e os "dissabores" que isso tem causado à democracia também o motivaram a encarar o desafio da eleição municipal.

- Refleti intensamente sobre a situação do país, os dissabores que o processo democrático tem enfrentado diante do avanço da hegemonia de uma força política, o peso e a importância de São Paulo nesse processo.

Na carta, de duas páginas, o tucano não fez qualquer referência a um comprometimento de permanecer quatro anos na prefeitura, caso seja eleito. Por duas vezes, Serra abandonou um cargo para o qual foi eleito para se candidatar a outro: deixou a prefeitura de São Paulo em 2006 para concorrer a governador de São Paulo e, depois de eleito, renunciou em 2010 para disputar, pela segunda vez, a Presidência da República.

Abandono do cargo é alvo preferencial dos adversários

O abandono do cargo é a artilharia preferencial dos adversários contra o tucano. Mesmo assim, dirigentes do PSDB avaliaram ontem que a carta não era um instrumento adequado para fazer esse tipo de debate. No texto, Serra disse apenas que saberá "honrar" o mandato.

- Se escolhido, tenham certeza, saberei honrar a indicação e, posteriormente, o mandato, fazendo uma administração municipal digna dos nossos sonhos. Não fujo à luta, nem fujo às minhas responsabilidades. Com humildade, ofereço meu nome ao PSDB, aos militantes, simpatizantes, apoiadores e eleitores como pré-candidato à eleição de prefeito.

Ele afirmou ainda que gostaria de voltar a ser prefeito porque a cidade "cobra o que de melhor o nosso partido" tem a lhe dar.

Os dois pré-candidatos tucanos que abriram mão do processo interno para ele, Andrea Matarazzo e Bruno Covas, foram ao ato prestar apoio. Serra não deu entrevista e prometeu para hoje conversar com os jornalistas.

O adiamento das prévias para o próximo dia 25 foi decidido em meio a bate-boca, que escancarou a divisão no partido.

- Estamos há sete meses nesse processo e aí vem o Serra, às vésperas, é quer tratorar. Isso é uma provocação um desrespeito à militância - afirmou o primeiro vice-presidente da sigla, João Câmara, apoiador da pré-candidatura de José Aníbal.

- Não foi possível construir um consenso, infelizmente. A explicação para isso é um desgaste no diálogo para tentar construir uma unidade - disse o presidente municipal do PSDB, Julio Semeghini.

Alguns integrantes da Executiva classificaram o episódio como "palhaçada".