Título: Pesca: muito dinheiro e pouco resultado
Autor: Maltchik, Roberto
Fonte: O Globo, 02/03/2012, O País, p. 12

Usado em barganhas, ministério não consegue criar políticas para elevar exportação de pescado

BRASÍLIA. Apesar da criação de uma estrutura governamental voltada exclusivamente à pesca, em 2003, o Brasil perdeu vigor na exportação de pescado e não consegue acompanhar a evolução promissora do mercado mundial da carne. A produção do pescado subiu 25,22%, entre 2003 e 2009, último dado disponibilizado. Já as exportações, nos últimos nove anos, tiveram queda de 205,47%. De acordo com especialistas, a falta de políticas públicas e a dificuldade de licenciamento ambiental dos produtores são considerados os principais entraves.

Nesse período, a Secretaria Especial de Pesca e Aquicultura se estruturou, como órgão da Presidência da República, e ganhou robustez burocrática a partir de 2010, no governo Lula, quando virou ministério autônomo. De 2004, com um ano de vida, até o final do ano passado, o orçamento da pasta cresceu 831,84%. Sete anos atrás, a Pesca recebia do governo R$ 16 milhões. Ano passado, bateu a marca de R$ 154,6 milhões. O maior orçamento foi no ano da criação do ministério, quando levou R$ 210,9 milhões.

Apesar da complexidade para alavancar o setor e dos investimentos progressivamente maiores em pesca e aquicultura, o governo usa a pasta como margem de manobra política para acomodar peças de um xadrez político partidário. Ontem, assumiu o evangélico Marcelo Crivella (PRB-RJ), com o objetivo de blindar o candidato petista ao governo da cidade de São Paulo, Fernando Haddad, que tem a antipatia dos evangélicos. Antes, a pasta serviu para acomodar a ex-senadora Ideli Salvatti, depois de perder a eleição ao governo do estado de Santa Catarina, e o ex-deputado Luiz Sérgio, que ficou por menos de um ano no posto.

A coordenadora de políticas voltadas à pesca na Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Miyuki Hyashida, diz que, apesar da pouca expressão dos ministros no setor, eles não atrapalham o processo de desenvolvimento. Porém, salienta que a pasta enfrenta dificuldades para solucionar um problema: mais da metade dos pescadores do Brasil trabalha sem licença.

- Com licença, não tem crédito. Não tem formalização. Em Tocantins, temos mil produtores, mas só 14 têm licença ambiental. Nem mesmo os números que dispomos sobre a produção retratam a realidade. Precisamos nos adaptar à realidade, que indica o pescado como o maior mercado potencial de carnes do planeta - afirma a especialista.

A criação do ministério, de acordo com Miyuki, concentrou em um órgão a definição de políticas para o setor. Entretanto, os problemas crescem com a expansão do mercado do pescado, especialmente pela dificuldade de licenciamento ambiental.