Título: Merkel diz entender preocupação de Dilma com tsunami de dólares
Autor: Lobo, Thais
Fonte: O Globo, 03/03/2012, Economia, p. 26

Chanceler alemã diz que BCE não voltará a conceder crédito barato a bancos

Thais Lobo, Flávio Tabak e Luiza Damé

TURBULÊNCIA GLOBAL

BRUXELAS, BRASÍLIA e RIO. A chanceler alemã, Angela Merkel, disse ontem que entende a preocupação manifestada pela presidente Dilma Rousseff quanto às políticas monetárias que os países ricos estão adotando para combater a crise global, revelou a agência de notícias Dow Jones. Na quinta-feira, Dilma afirmou que iniciativas como a adotada pelo Banco Central Europeu (BCE) - provendo os bancos da zona do euro com mais de 1 trilhão em capital de baixo custo - provocaram um "tsunami de dólares" nos países emergentes, o que pode gerar bolhas desestabillizadoras.

- É exatamente isso que temos que evitar - disse Merkel à Dow Jones. - De certa maneira, eu entendo as dúvidas dela. É por isso que vou tentar dizer a ela que planejamos perseguir reformas desta vez, que nós certamente não vamos adotar medidas semelhantes de novo.

A chanceler terá na próxima segunda-feira uma reunião com a presidente brasileira, que embarca na noite de hoje para Hannover, onde participa da abertura da CeBIT, a maior feira de tecnologia da informação do mundo. Dilma pretende aproveitar o encontro para criticar a estratégia dos países desenvolvidos.

- As observações que a presidente fez sobre o tsunami monetário, ela já vinha fazendo. Com esse megaempréstimo feito aos bancos, nós queremos saber qual o destino do dinheiro. Vai ser utilizado para o desenvolvimento ou vai ser utilizado pelos bancos, que vão fazer o que vêm fazendo, que é jogar na especulação em países como o Brasil e demais emergentes? - disse o assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia.

A chanceler alemã afirmou à Dow Jones que a injeção do BCE nos bancos não destravou o crédito no mercado bancário da zona do euro e indicou que as autoridades europeias seguirão outro caminho a partir de agora.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, também expressou preocupação com o volume excessivo de capital de curto prazo que chega ao Brasil. Ele afirmou na quinta-feira que é preciso "diminuir o entusiasmo pelo Brasil" lá fora. Em maio de 2009, porém, pouco depois do estouro da crise econômica mundial, a política brasileira era outra: "Existe uma entrada de capitais que é positiva e mostra que o país é mais confiável. Queremos que haja compra de títulos públicos, principalmente por estrangeiros".

Economista sugere corte de juros para reduzir fluxo

Ao lado de EUA, Japão e Inglaterra, os países da zona do euro têm sido a origem de grande parte do capital especulativo que vem para o Brasil, o mesmo que já causou estragos em países asiáticos. Em crise, o BCE concede empréstimos a custos baixos para bancos. Assim, irriga o sistema financeiro para fazer o dinheiro circular na região. Os bancos, porém, preferem investir em países com retorno mais alto, como o Brasil, que tem juros elevados, com a Selic a 10,5%, ante juros de zero a 2% de países europeus e dos Estados Unidos.

O dólar, assim, se desvaloriza. Por isso, o governo anteontem adotou medidas para conter a "tsunami". Decretou que os empréstimos de empresas no exterior com prazo inferior a três anos pagarão IOF de 6% (antes, a taxa era para operações até dois anos). E anunciou restrições ao financiamento de exportações.

Entradas e saídas de capitais especulativos já causaram grandes estragos. Professor do Instituto de Economia da UFRJ, Luiz Carlos Delorme Prado alerta:

- O Brasil não pode receber de maneira ingênua o grande volume de capital financeiro de curto e médio prazos. O processo pode ser rapidamente invertido quando a situação muda. Esses capitais desequilibram a taxa de câmbio na entrada e na saída.

(*) Com agências internacionais