Título: Juros congelados
Autor: Nunes, Vicente
Fonte: Correio Braziliense, 11/09/2009, Economia, p. 10

Avaliação da ata do Copom mostra que taxa básica deve ficar em 8,75% ao ano até que o novo presidente assuma o país, em 2011

Ao divulgar ontem a ata do Comitê de Política Monetária (Copom) referente à reunião da semana passada, na qual manteve os juros em 8,75% ao ano, o Banco Central (BC) praticamente descartou a possibilidade de promover qualquer alteração, para cima ou para baixo, na taxa básica (Selic) até o fim de 2010, ano de eleições presidenciais. Se houver alguma mudança, muito provavelmente ela terá de ser comandada pelo próximo governo. E, pelos riscos sinalizados pelo BC, a tendência dos juros a partir de 2011 será de alta.

O BC é taxativo quanto ao cenário para a inflação neste ano e no próximo: a elevada capacidade ociosa da economia ajudará a manter o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) muito próximo do centro da meta definida pelo governo, de 4,5%. Mas, a médio prazo, quando o futuro presidente da República já terá tomado posse, o BC lidará, de um lado, com os efeitos cumulativos da expressiva queda dos juros entre janeiro e julho deste ano, de cinco pontos percentuais, sobre uma economia em crescimento, e, de outro, com os estímulos fiscais (aumentos dos servidores e dos benefícios da Previdência Social, principalmente) dados pelo governo no auge da crise mundial para tirar o país da recessão.

¿Os efeitos desses estímulos devem ser cuidadosamente monitorados ao longo do tempo e são parte importante do contexto no qual serão tomadas decisões futuras de política monetária, que devem assegurar a manutenção da convergência da inflação para a trajetória das metas ao longo do horizonte relevante¿, ressaltou o documento assinado pelos diretores do BC. O próximo governo também terá de enfrentar a alta dos preços das commodities (alimentos e matérias-primas), puxados pela recuperação da economia mundial. Atualmente, ressaltou o BC, essas mercadorias com cotação internacional, entre elas, o petróleo, estão subindo. Mas, com a atividade global deprimida, não está havendo repasses aos consumidores.

Na avaliação do BC, o sistema financeiro nacional e a economia como um todo passarão por um grande teste nos próximos trimestres. Terão de provar se conseguem sobreviver sem traumas, no caso dos bancos, e sem pressões inflacionárias, no caso da economia, com a Selic no menor patamar da história. ¿Esses alertas são importantes, pois o Brasil está passando por uma mudança estrutural profunda. Por isso, é importante que o governo retome o ajuste fiscal, reduzindo os gastos com a máquina pública. Isso dará um alívio significativo para a política de juros¿, assinalou o economista-chefe da SLW Asset Management, Carlos Thadeu Filho, que, depois de ler a ata do Copom, enterrou as suas previsões de pelo menos dois cortes de 0,25 ponto percentual na Selic até o fim deste ano.

Investimentos

Para o economista-chefe da Concórdia Corretora, Elson Teles, apesar de reforçar os sinais de que a taxa básica ficará estável por um longo período, o BC não fechou as portas para uma possível alta no fim de 2010, depois da eleição do futuro presidente da República. ¿Não é tradição bancos centrais subirem juros no meio de disputas presidenciais, a não ser que surjam pressões inflacionárias muito fortes no meio do caminho, o que não estamos vendo. Pelo contrário, tudo indica que o IPCA ficará ligeiramente abaixo do centro neste e no próximo ano¿, disse.

Tanto para o BC quanto para Thadeu e Teles, não há motivos para alarde. Apesar dos riscos inerentes à economia, o país está combinando um quadro tranquilo de inflação sob controle com crescimento sustentado da atividade. Mas, para que nenhuma surpresa desagradável surja no meio do caminho, um diferencial, segundo a ata do Copom, será a retomada dos investimentos, que, no fim do ano passado e no início de 2009, apresentaram um recuo monstruoso. É importante que as empresas ampliem a capacidade de produção para atender à demanda dos consumidores, que se manteve firme mesmo nos períodos mais agudos da crise global.

E EU COM ISSO A decisão do Banco Central (BC) de suspender o processo de baixa dos juros não impede que os bancos continuem reduzindo as taxas cobradas nos empréstimos a empresas e a consumidores. Os custos dos financiamentos no país estão entre os maiores do mundo. No cheque especial, as taxas passam de 200% ao ano e, nos cartões de crédito, encostam nos 600%. As instituições financeiras alegam que os juros são tão elevados porque o índice de calote no Brasil é alto, o que é desmentido pelo BC. No caso das pessoas físicas, a inadimplência está estacionada em 8,6% há três meses e subiu pouco no momento mais agudo da crise mundial. Para que os juros bancários caiam é preciso que as instituições abram mão de parte de seus lucros, incluídos no spread. Esse indicador está em 35,6 pontos, o segundo maior do mundo, atrás somente do Zimbábue, na África, de 457,5 pontos. (VN)

IPI AFETARÁ A INFLAÇÃO » A decisão do governo de suspender a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) a partir de outubro vai impactar negativamente a inflação. Pelas contas do economista-chefe da Concórdia Corretora, Elson Teles, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que surpreendeu o mercado e cravou alta de apenas 0,15% em agosto, quase a metade do 0,28% computado no mesmo mês de 2008, tenderá a variar entre 0,30% e 0,40% nos últimos três meses do ano. ¿Com certeza, à medida que o IPI for voltando aos patamares vigentes antes da crise mundial, os preços dos eletrodomésticos, dos automóveis e dos materiais de construção vão subir¿, afirmou. Felizmente, segundo ele, há uma folga nas projeções do IPCA para este ano para acomodar o impacto do IPI. ¿Assim, o índice ainda ficará abaixo do centro da meta perseguida pelo BC, de 4,5%¿, ressaltou. Em setembro, o IPCA deve passar de 0,30% por causa da alta dos alimentos. (VN)

No governo, dia de festa

O governo preparou uma superestrutura para alardear os resultados do Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre do ano, que vão decretar, hoje, o fim da recessão na qual o país mergulhou em outubro do ano passado, o momento mais agudo da crise mundial. A ordem é difundir a visão de que o Brasil foi um dos primeiros países a reagir às turbulências. Na avaliação do presidente Lula, a equipe econômica não pode dar espaço para a oposição. O fato de o PIB brasileiro vir com crescimento enquanto as principais economias do planeta continuam no limbo mostra, para o presidente, que o governo soube enfrentar todos os problemas acarretados pelo estouro da bolha imobiliária americana. Pelo que se comentava ontem no governo, entre abril e junho, o PIB cresceu cerca de 2% ante os primeiros três meses do ano.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, foi escalado para, logo pela manhã, dar uma entrevista coletiva por telefone a editores de aproximadamente 15 dos principais jornais do mundo. ¿Esses jornalistas estarão em seus países de origem. A entrevista não será para correspondentes no Brasil¿, explicou o diretor de Assuntos Internacionais da Secretaria de Comunicação da Presidência da República, Rodrigo Baena Soares. Ele destacou que o governo está empenhado em mostrar para o mundo a realidade do país e difundir temas prioritários. ¿Já fizemos esse tipo de coletiva sobre a política industrial brasileira e o pré-sal. O ministro Mantega também falou sobre o PIB do primeiro trimestre, quando o resultado não foi tão bom (queda de 0,8%)¿, assinalou. (VN)