Título: Anistia julga sete brasileiras
Autor: Otavio, Chico
Fonte: O Globo, 09/03/2012, O País, p. 14

Sessão especial da comissão homenageia Dia da Mulher

SÃO PAULO. Gilda foi arrastada pela polícia para fora de casa. Quando entrava na viatura, cruzou o olhar com o atônito Ricardo, seu filho de três anos, que esperava, com uma tia, na fila da matinê do cinema. Grávida de três meses, Maria Angélica foi presa dentro do consultório odontológico onde trabalhava: ela, o dentista, a mulher dele, e até o paciente. A prisão foi feita pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury, do Dops, que a xingava de "negra suja e porca".

Militante do movimento estudantil, Maria Nadja passou quatro meses presa no Dops e outros oito na Torre das Donzelas, no presídio Tiradentes, onde foi companheira de cela da presidente Dilma Rousseff. Sua irmã, Maria Niedja, depois de presa, foi vetada em um concurso para professora da USP. Ida, Hilda e Darci também passaram pela tortura e pela prisão na ditadura. Hoje, as histórias destas sete mulheres se encontram em sessão especial da Comissão de Anistia, em São Paulo, que julga seus processos em homenagem ao Dia Internacional da Mulher, comemorado ontem.

Gilda Fioravante da Silva, de 70 anos, será a única que não participará do julgamento. Foi proibida por seu médico pelas fortes emoções que o tema reacende. Ela foi presa em 1970, uma semana depois do marido, o metalúrgico José Carlos da Silva, que morreu em 1992 sem ter sido reparado pelo Estado. Militante católica, Gilda perdeu também uma filha, há poucos anos. Cuida sozinha da neta pequena. Depois de 35 dias de tortura no porão da Oban (Operação Bandeirantes), Gilda teve de viver com o marido e os filhos no porão cedido por um cunhado.

- Vivíamos de aluguel e nossas famílias desmontaram nossa casa quando fomos presos, acreditando que seríamos mortos mesmo. Dois outros companheiros morreram na tortura - conta ela, que chorou ao lembrar das torturas sofridas na prisão: - Com tantas perdas, estou passando muitas privações.

Maria Angélica Bacellar, de 57 anos, tinha 18 quando foi presa, em 1974. Passou um mês sob tortura, ouvindo desaforos do delegado Fleury, que atacava sua honra por ela estar grávida de três meses e ser solteira. Filha adotiva, ela foi criada por pais comunistas. A mãe é Josephina Bacariça, que também será homenageada hoje.

Maria Niedja e Maria Nadja de Oliveira deixaram a militância estudantil em Fortaleza e foram presas em São Paulo. Nadja conviveu com Dilma na Torre das Donzelas, e ali conheceu o marido, Vicente Roig, com quem se comunicava por cartas clandestinas. Darci Miyaki foi presa em 1971, por ser militante da ALN. Hilda Alencar Gil, então na Polop, foi perseguida em razão de artigos publicados por seu marido. Ida Schrage, da AP, foi presa pela Oban e levada para o Dops.