Título: Mais empregos, menos calotes
Autor: Bancillon, Deco; Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 15/09/2009, Economia, p. 16

Reação positiva do mercado de trabalho e aumento da massa de salários em circulação no país provocam forte queda da inadimplência. Presidente Lula afirma que em agosto foram abertas cerca de 150 mil vagas

A melhora dos indicadores de emprego, renda e crédito interferiu diretamente na capacidade do brasileiro de honrar seus compromissos financeiros. Desde abril deste ano, três dos índices de inadimplência variaram negativamente. Ao mesmo tempo, desemprego e juros recuaram. E, em caminho inverso, seguiu o indicador que mede o comportamento da massa salarial de rendimentos, que já é maior que o registrado em julho do ano passado, quando ainda não havia sinal de crise financeira.

¿A queda da inadimplência afeta em cheio o comércio, pois abre espaço para que o brasileiro reduza o percentual da renda comprometido com dívidas e se torne mais ativo no consumo¿, analisa Mariana Oliveira, economista da consultoria Tendências, que emenda: ¿Mas só foi possível devido à manutenção dos indicadores de emprego, que, mesmo diante da crise, têm se mantido no azul¿. Em julho, o país registrou 138.402 postos novos de trabalho, o melhor resultado para o ano e o quarto maior da série histórica pesquisada pelo Ministério do Trabalho e Emprego.

Empolgado com os bons resultados, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que os números de agosto devem ser ainda mais animadores que os do mês anterior. ¿Certamente, vamos bater outra vez recorde de criação de empregos. Deve ser por volta de 150 mil¿, disse o presidente em entrevista a rádios de Roraima, segundo a Agência Brasil. Lula ressaltou que, em um momento em que há desemprego em todo o mundo, o país vai chegar ¿ao fim do ano com quase um milhão de novas vagas com carteira assinada.¿

O saldo positivo das contratações no mercado de trabalho é também o que de mais importante aconteceu ao mercado doméstico brasileiro, beneficiado pela injeção líquida de R$ 28,450 bilhões da massa salarial real (descontada a inflação) em julho, que é o principal fator de redução de inadimplência em uma economia.

Projeção do Banco Santander mostra que o indicador deve variar positivamente entre 1,5% e 2% em 2009. Mantendo-se esse resultado, a inadimplência à pessoa física deverá permanecer em trajetória decrescente constante, mas menos intensa do que a registrada em agosto, quando o número de maus pagadores recuou 5,1% na comparação ante julho, a maior redução desde maio.

Estudo divulgado ontem pela Serasa Experian indica que a inadimplência no oitavo mês do ano foi menor entre clientes de financeiras e consumidores que utilizam cartões de crédito, modalidade de financiamento que registra os mais altos juros praticados no mercado, que podem chegar a 600% ao ano. ¿Tradicionalmente, quanto maior é a taxa de juros, menor é o apetite do consumidor para tomar o crédito¿, compara Luiza Rodrigues, economista do Santander.

Em 2001, o volume de crédito em circulação na economia correspondia a 24% do Produto Interno Bruto (PIB), a soma das riquezas produzidas no país. Na mesma época, a Selic batia em 20%, o que inviabilizou bastante a concessão de crédito no Brasil. ¿Hoje, com juros mais baixos e a relação crédito/PIB em 45%, esse é um cenário bem diferente¿, completa Luiza.

Juros Desde 2001, a taxa básica de juros(1) praticada no mercado recuou 10,3 pontos percentuais, passando para 8,75% ao ano. O resultado foi que o brasileiro passou a tomar empréstimos a custos menores que os praticados antes.

Em agosto deste ano, a taxa de juros para pessoa física caiu para 7,08%, uma redução de 0,13 ponto percentual frente o resultado de julho. É também o menor patamar dos juros ofertados no mercado brasileiro em 14 anos, início da série histórica pesquisada pela Associação Nacional de Executivos em Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac). Foi também a sétima queda consecutiva, que se deu pela convergência dos indicadores macroeconômicos e o aumento da participação dos bancos estatais no mercado financeiro. ¿É o contrário do que vinha ocorrendo no auge da crise, quando os bancos decidiram fechar a torneira do crédito e aumentar taxas¿, reflete Marcel Solimeo, economista-chefe da Associação Comercial de São Paulo.

Miguel de Oliveira, vice-presidente da Anefac, garante: ¿O pior da crise tendo passado e as reduções da Selic se mantendo deverão levar as instituições financeiras a emprestar mais. Afora isso, houve também um menor risco de inadimplência, o que tende a baratear os juros¿.

1- Boletim Focus Desde dezembro, a taxa básica de juros (Selic) vem caindo mês a mês, fazendo com que o custo dos empréstimos seja barateado. Em nove meses, a Selic recuou cinco pontos percentuais, atingindo o menor nível histórico, em 8,75%. Esse, porém, deve ser o patamar para todo o ano, segundo especialistas em mercado financeiro ouvidos pelo BC na pesquisa Focus. Pela 12ª semana consecutiva, os analistas não mexeram na projeção para juros.