Título: Morte de brasileiro terá investigação paralela
Autor: Benevides, Carolina
Fonte: O Globo, 22/03/2012, O País, p. 13

Família de estudante contratou empresa de advocacia em Sidney e cobrou a punição dos policiais que atiraram no jovem

Carolina Benevides, Juliana Castro e Leonardo Guandeline

SÃO PAULO e RIO. Parentes do brasileiro Roberto Laudisio Curti, de 21 anos, morto no domingo, em Sidney, na Austrália, cobraram ontem punição dos policiais acusados de perseguir e atirar contra o estudante usando pistolas Taser, que disparam choques elétricos para imobilizar suspeitos. As duas irmãs de Roberto, Ana Luisa Laudisio, que vive na Austrália, e Maria Fernanda, que mora em São Paulo e viajou para acompanhar o caso, contrataram uma empresa de advocacia de Sidney para conduzir uma investigação paralela sobre a morte do jovem, cujo corpo já foi reconhecido, mas não liberado.

- Queremos explicações e punições. O que está fazendo, agora, o policial que disparou várias vezes no Roberto? E os outros seis que covardemente o perseguiram como se fosse um monstro a ponto de engolir todos eles? Nada justifica essa atitude. Ele estava desarmado e nunca roubaria qualquer coisa. Esse policial que atirou está de mal com a vida? O que a Justiça vai fazer com ele? Deixá-lo à solta, para que mate outros Robertos? - disse um parente, que pediu para não ser identificado.

Ontem, o cônsul-geral do Brasil na Austrália, embaixador Américo Fontenelle, reuniu-se com o secretário de segurança de Nova Gales do Sul (estado onde fica Sidney), Michael Gallacher. No encontro, Gallacher prestou condolências à família e prometeu agilidade na investigação, mas não estabeleceu prazos. A família do estudante não participou do encontro, no consulado do Brasil em Sidney.

Apesar de cobrado pelas autoridades brasileiras a divulgar as imagens da câmera de segurança da loja onde Roberto teria supostamente entrado e furtado um pacote de biscoitos, como alega a polícia australiana, o secretário não trouxe respostas para essa reivindicação.

- Ele fez um gesto protocolar de boa vontade, (mas o secretário veio) sem esclarecer. Foi apenas para dizer que a investigação vai se dar dessa forma, com a intenção de ser breve, mas sem dar detalhes e sem valorar o que já surgiu sobre o caso - contou André Costa, cônsul-adjunto do Brasil em Sidney.

Segundo Costa, em nenhum momento o secretário levantou a hipótese de o brasileiro ter sido morto por engano:

- O termo usado até o momento é condolência. Não houve posicionamento (sobre um possível engano) - afirmou o cônsul, observando que as autoridades brasileiras não descartam essa possibilidade "até que as dúvidas sejam esclarecidas".

No Brasil, o primeiro-secretário da Embaixada da Austrália, em Brasília, Goran Nuhich, disse que não há ainda informação oficial sobre as investigações ou a liberação do corpo:

- Só podemos confirmar que a polícia de Sidney vai investigar o caso. Em relação ao pedido da família para que haja uma investigação paralela, podemos dizer que a controladoria geral vai investigar. É um órgão do governo, mas não é um órgão da polícia.

De acordo com o cônsul-geral Américo Fontenelle, o corpo de Roberto foi reconhecido por parentes anteontem, mas ainda não foi liberado e, por enquanto, a família não pediu ajuda ao consulado para o traslado.

- Faremos o velório em São Paulo, com a presença de vários amigos. Uma cerimônia digna. Espero que a liberação (do corpo) aconteça o mais rápido possível - disse um parente que pediu para não ser identificado.

Tio de Roberto, João Eduardo Laudisio disse ontem à imprensa australiana que o jovem foi declarado "muito saudável" em exames realizados no Brasil, antes da viagem, e que não tinha qualquer condição preexistente que poderia ter se agravado por conta dos choques da Taser.

Segundo o jornal "The Sydney Morning Herald", menos de 12 horas antes de ser morto, Roberto marcou um gol por seu time de futebol em Sidney, que acabou derrotado em campo.

- Ele tinha habilitades fantásticas e era muito atencioso e comprometido - disse seu treinador e companheiro de equipe Frank Polistina.

Após o jogo, Roberto foi ao "King Cross", parte da cidade que abriga bares, e tomou "alguns drinks", segundo Luana Torres, advogada do consulado brasileiro. Quando deixou o local, permanecia em "bom estado", disseram amigos, mas, às 5h30m, estava no chão, gritando por ajuda e sendo atingido pela Taser, relatou uma testemunha.

O caso reabriu na Austrália o debate sobre o uso de armas de choque. Segundo a BBC Brasil, a comissão de controle de armas, o Partido Verde de Nova Gales do Sul e representantes dos direitos civis devem pedir a interrupção do uso da Taser, pelo menos, até que as investigações de uma comissão independente esclareçam a morte.