Título: Gasto de turista brasileiro no exterior sobe 31%
Autor: Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 24/03/2012, Economia, p. 31

Despesa é o triplo do que os estrangeiros deixaram no país em fevereiro. Déficit externo deve ficar em US$68 bi

BRASÍLIA. Os turistas aproveitaram o dólar barato para gastar mais com viagens internacionais no mês passado, em especial no feriado do Carnaval. Segundo relatório do Banco Central (BC), essas despesas bateram recorde de US$1,746 bilhão em fevereiro, com alta de 31% em relação ao mesmo período de 2011, quando essa despesas ficaram em US$1,333 bilhão. Os gastos com viagens aos exterior no mês passado foram quase três vezes maior que as receitas deixadas pelos turistas estrangeiros no país.

O ator Guilherme Trajano é um desses brasileiros. Passou quatro meses viajando pela Europa. Na bagagem de volta para casa, trouxe roupas e calçadas de grifes como Gucci e Prada. Também comprou eletrônicos como iPod. Custos que não o impediram de sair para jantar em restaurantes e visitar museus e teatros.

- É impressionante como uma roupa lá fora sai bem mais em conta do que aqui - disse.

O aumento expressivo dos gastos de turistas foi um dos motivos que levou o país a registrar em fevereiro déficit de US$1,766 bilhão em transações correntes. São registradas nessa conta todas as operações do Brasil com o resto do mundo, como exportações, importações, receitas e despesas com viagens, aluguéis de maquinários e remessas de lucros e dividendos.

Desempenho mais fraco na balança comercial este ano

Com a piora desses indicadores, o BC anunciou ontem a revisão para cima do déficit em conta corrente para 2012, que deverá ficar em US$68 bilhões - equivalente a 2,57% do Produto Interno Bruto (PIB). A previsão anterior era de US$65 bilhões. O desempenho mais fraco da balança comercial neste início de ano, de um lado, e o avanço nas despesas com serviço, inclusive com viagens internacionais, de outro, foram determinantes na piora das expectativas do BC.

Apesar disso, o chefe do Departamento Econômico do BC, Tulio Maciel, destacou que esse déficit continua sendo coberto com folga pela entrada de recursos estrangeiros no setor produtivo, o chamado IED (investimento estrangeiro direto).

- É sempre bom contrapor que esse déficit segue sendo financiado em condições favoráveis pelo afluxo de IED, que se mantém com volumes expressivos - afirmou Maciel.

Em fevereiro, esses investimentos somaram US$3,648 bilhões, totalizando US$9 bilhões no bimestre. De acordo com dados parciais de março (até o dia 21), o saldo está positivo em US$3,1 bilhões e a projeção do BC para o ano, que se manteve inalterada, é de US$50 bilhões.

Embora a situação do país seja confortável do ponto de vista de financiamento do déficit em conta corrente, economistas alertam que o Brasil está cada vez mais dependente dos recursos externos e sofre as consequências no câmbio, com impactos negativos para indústria. Para o presidente da Associação Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais (Sobeet), Luís Afonso Lima, o governo precisa colocar na agenda as reformas tributária e trabalhista para resolver o problema estrutural do setor.

- As medidas tomadas pelo governo para segurar a queda do dólar, como a taxação do IOF, são paliativos. O que a gente tem que fazer são as reformas para tornar a indústria mais competitiva - disse Lima.

- O governo não tem muito o que fazer diante da alta liquidez mundial. Os recursos estrangeiros vão continuar vindo, porque a economia brasileira oferece uma ótima oportunidade de negócio, enquanto outros países estão estagnados - reforçou o economista-chefe da Sulamérica Investimentos, Nilton Rosa, que acrescentou:

- Mas não vejo uma tsunami monetária, como o governo vem dizendo.

Para Bruno Laviere, economista da Tendências, o governo brasileiro deveria aproveitar esse bom momento e não barrar a entrada de recursos estrangeiros, com aumento de impostos.

Ao divulgar os dados das contas externas de fevereiro, Tulio Maciel destacou que o déficit em transações correntes recuou na comparação com janeiro - que fora superior a US$7 bilhões - com ajuda da balança comercial, que voltou a registrar saldo positivo, e com a queda na remessa de lucro e dividendos de filiais estrangeiras para as matrizes fora do país, num reflexo da diminuição da atividade econômica brasileira.

Ele disse que as medidas tomadas pelo governo para inibir a especulação ainda não surtiram efeito.