Título: Liga Árabe se limita a apoiar Kofi Annan
Autor: Berlinck, Deborah
Fonte: O Globo, 30/03/2012, O Mundo, p. 33

Grupo de países esbarra em entraves internos e falha na tentativa de pressionar Síria

Reuters

BAGDÁ. Com os mesmos impasses entre os países-membros sobre temas-chave, como a saída do presidente Bashar al-Assad e a ajuda armamentista aos rebeldes, a cúpula da Liga Árabe terminou ontem, em Bagdá, sem um avanço claro que pudesse elevar a pressão sobre o regime sírio. De concreto, apenas uma declaração de condenação à violência e de apoio ao plano de paz do enviado especial da ONU, Kofi Annan, o mesmo que Assad diz aceitar, mas que a comunidade internacional critica por ainda não ter sido colocado em prática.

Esvaziada - apenas nove de 22 chefes de Estado compareceram -, a reunião esbarrou em velhos entraves. Do presidente da Tunísia, Moncef Marzouki, veio o apelo mais explícito pela saída de Assad do poder. E dos majoritariamente sunitas Arábia Saudita e Qatar, a maior pressão por armar a oposição e pôr um fim ao regime, além de críticas ao anfitrião Iraque, que, ao lado da Argélia, deixou claro seu temor de que uma mudança de poder poderia alimentar a violência sectária na Síria.

- Nossa experiência no Iraque mostra que armar as duas partes do conflito levará a uma guerra regional e internacional na Síria. Isso abrirá caminho para uma intervenção armada estrangeira que atentaria contra a soberania de um país árabe irmão - advertiu o primeiro-ministro iraquiano, Nouri al-Maliki.

A cúpula foi marcada também por novos apelos a Assad para que aplique as propostas de Kofi Annan, que contam com o endosso do Conselho de Segurança da ONU. Apesar de o plano de paz falar num cessar-fogo e em liberdade de expressão e manifestação, só ontem foram mais de 40 mortes em território sírio, a maioria em Homs e nos subúrbios de Damasco. Também houve confrontos em Aleppo e Hama e mais repressão a manifestações pacíficas de civis.

O chefe da Liga Árabe, Nabil el-Araby, disse que a solução para o conflito está nas mãos do regime sírio, e, também em Bagdá, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, pediu que as palavras de Assad sejam transformadas em ações. Suspensa do grupo desde novembro passado, a Síria deixou claro que ignoraria qualquer decisão tomada em conjunto pelos árabes.

ONU diz que mais de 1 milhão precisam de ajuda humanitária

A reunião acabou mais carregada de simbolismo do que de medidas práticas. O encontro foi o primeiro da Liga Árabe desde o início da Primavera Árabe, sem os nomes que durante décadas centralizavam os debates, como Muamar Kadafi e Hosni Mubarak.

E foi também a primeira vez em mais de 20 anos que Bagdá recebeu uma cúpula desse porte e que um chefe de Estado do Kwait, o emir Sabah Ahmad al-Sabah, visitou o país. O enorme aparato de segurança montado pelas autoridades em Bagdá não impediu, no entanto, que três foguetes atingissem os arredores do local da cúpula, mas sem deixar vítimas.

Ontem, o relatório de uma missão técnica da ONU concluiu que pelo menos um milhão de sírios precisam atualmente de ajuda humanitária. E a Unesco alertou para o risco imposto pelo conflito aos seis locais sírios declarados Patrimônio da Humanidade.