Título: Dilma sai em defesa do Irã
Autor: Berlinck, Deborah
Fonte: O Globo, 30/03/2012, O Mundo, p. 33

Após reunião dos Brics, presidente diz que sanções são perigosas e país tem direito a programa nuclear

A presidente Dilma Rousseff aproveitou ontem a reunião dos Brics, em Nova Délhi, para sair em defesa do Irã e, em suas palavras, do direito legítimo da República Islâmica de usar energia nuclear. Em tom ainda mais elevado que a declaração final dos países-membros - Rússia, Índia, China e África do Sul, além do Brasil - Dilma criticou abertamente as sanções unilaterais adotadas pelas potências ocidentais e alertou para o perigo de bloqueios comerciais a Teerã, como o embargo ao petróleo.

- Acho extremamente perigosas as medidas de bloqueio de compras do Irã, apesar de não termos relações comerciais (ligadas a petróleo) com o país - disse a presidente, em entrevista coletiva ao fim da reunião do grupo.

A presidente deixou claro que as medidas das potências não afetariam o Brasil. Mas Índia e China são os maiores compradores de petróleo iraniano, e rejeitam pressões externas para diminuir suas transações com o país. O primeiro importa do Irã 13% do petróleo que precisa, e o segundo, 22%.

Sem mencionar a suspeita de que o programa nuclear do Irã esteja caminhando para produzir uma bomba, como denunciam as potências ocidentais, Dilma fez questão de reafirmar a posição clássica da diplomacia brasileira: os iranianos têm, assim como o Brasil, o direito de ter um programa atômico pacífico.

- Em vez da retórica agressiva, (que) se use, diante do direito internacional, o direito dos países de usar energia nuclear para fins pacíficos, assim como nós fazemos - afirmou a presidente.

Países afastam a retórica militar

As sanções unilaterais, como o embargo de União Europeia e EUA ao petróleo iraniano, se intensificaram em meio à resistência justamente de China e Rússia em apoiar resoluções mais firmes na ONU. E as dificuldades de avançar de forma conjunta na via diplomática, assim como as recusas do Irã em dar transparência a seu programa nuclear, acabaram levando a retórica bélica à questão iraniana.

Disso, não só Dilma, como os demais líderes presentes na cúpula em Nova Délhi tentaram se afastar. O primeiro-ministro indiano, Manmohan Singh, disse que a única saída para a questão iraniana é o diálogo, e o presidente russo, Dmitri Medvedev, voltou a sugerir que os EUA estariam pressionando outros países a aumentar o cerco contra o Irã.

Questionada sobre a posição do presidente russo, com quem se encontrou ontem, Dilma disse que a sua posição é clara: "o Brasil não concorda com esses processos retóricos de elevação do nível de discussão."

O comunicado final dos Brics dedicou um de seus 50 pontos à questão iraniana. Em tom mais brando que o de Dilma, os cinco emergentes também reconhecem o direito do Irã de usar energia nuclear para fins pacíficos e insistem que o problema com Teerã tem que ser resolvido através do diálogo. "A situação em relação ao Irã não pode escalar para um conflito de consequências desastrosas que não interessa a ninguém", diz o texto.

A declaração dedica um ponto também ao conflito na Síria. No texto, numa rejeição sútil a qualquer intervenção militar, pedem um fim imediato da violência e da violações de direitos humanos e pressionam o presidente Bashar al-Assad a pôr em prática o plano apresentado pelo enviado especial da ONU e da Liga Árabe, Kofi Annan.

- É importante chegar a uma solução aceita por todos, que envolva o diálogo entre governo e oposição e sem qualquer interferência externa - assinalou Medvedev.

Ontem, em carta aos Brics, o líder sírio se comprometeu a não medir esforços para aplicar as medidas. Ao mesmo tempo, porém, cobrou que se interrompa o fornecimento de dinheiro e armas aos rebeldes.