Título: ONU denuncia crimes de guerra
Autor: CRAVEIRO, RODRIGO
Fonte: Correio Braziliense, 16/09/2009, Mundo, p. 19

ONU denuncia crimes de guerra Relatório acusa Israel e palestinos de violações das leis internacionais durante ofensiva FAIXA DE GAZA Suhaib Salem /Reuters - 9/9/09 Agressor de Bush revela tortura LIBERDADE NO IRAQUE Mohammed Ameen/Reuters

¿Oque vi de pior em Gaza foram os restos das crianças nos hospitais¿, afirmou ao Correio, por meio de um software de videoconferência, um jornalista palestino que preferiu não se identificar. ¿Eu estava no carro com meu filho de 3 anos, quando ouvi uma grande explosão e o barulho de um caça F-16; deixei Fouad em casa, voltei e me deparei com três cadáveres¿, relatou à reportagem outro palestino, um engenheiro de 27 anos, também morador da Cidade de Gaza. ¿Dentro do carro, estava metade de um corpo queimado; podia ver os órgãos daquele homem, que ainda estava vivo e chorava¿, acrescentou. Do outro lado da fronteira, ao norte da Faixa de Gaza, as três semanas de ofensiva militar ¿ entre dezembro e janeiro passado ¿ lançaram o medo e a incerteza sobre cidadãos israelenses. Centenas de foguetes palestinos Qassam caíram no território vizinho. Depois de uma exaustiva investigação, que compreendeu 188 entrevistas, 10 mil páginas de documentos e 1.200 fotografias, a Organização das Nações Unidas (ONU) culpou israelenses e palestinos por ¿crimes de guerra¿. De acordo com o relatório elaborado pelo juiz sul-africano Richard Goldstone, ¿há evidências indicando sérias violações dos direitos humanos internacionais e da lei humanitária cometidas por Israel¿. O texto afirma que os militares israelenses praticaram crimes de guerra e, ¿possivelmente¿, crimes contra a humanidade. Também acusa as Forças de Defesa de Israel (IDF) de usarem ¿força desproporcional¿. Após nove meses na prisão, o jornalista iraquiano que jogou seus sapatos contra o então presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, foi libertado ontem em Bagdá. Recebido por dezenas de simpatizantes, amigos e pela família, Muntader Al-Zaidi contou que foi torturado na cadeia. ¿No momento em que o primeiro- ministro, Nuri Al-Maliki, afirmava às redes de TV que não dormiria até que tivesse garantias do meu destino, eu era torturado da pior maneira, agredido com cabos elétricos e barras de ferro¿, revelou o repórter. Ele sustenta que muitos queriam vê-lo morto, inclusive membros da inteligência dos EUA. Zaidi deve deixar o Iraque rumo à Grécia, onde receberá tratamento médico e psicológico. Uday Al- Zaidi afirmou que o irmão teme por sua vida, uma vez que prometeu revelar as identidades de seus torturadores. A libertação coincidiu com uma visita-surpresa do vice-presidente dos EUA, Joe Biden, a Bagdá. Para muitos iraquianos, o gesto de Al-Zaidi fez dele um ícone da sente dos iraquianos; esse é o seu beijo de despedida, seu cachorro¿, gritou o repórter da TV independente Al-Baghdadiya. Em seguida, arremessou o outro par, em nome das ¿viúvas, órfãs e daqueles que foram mortos no Iraque¿. Ele explicou ontem os motivos do gesto. ¿Nos últimos anos da guerra, eu andava pela nossa terra arrasada e via com meus próprios olhos a dor das vítimas e ouvia o choro das mulheres e dos órfãos. A vergonha estava me perseguindo¿, disse. Al-Zaidi prometeu que, se pudesse, se vingaria. ¿Eu vi a chance e aproveitei.¿ O protesto de Al-Zaidi transformou- o em herói, especialmente no mundo árabe. A Líbia concedeu- lhe a Medalha da Liberdade. Estampou cartazes na Síria. Recebeu elogios do presidente venezuelano, Hugo Chávez. Homens ofereceram suas filhas em casamento a Al-Zaidi. A atitude também lhe rendeu uma condenação a três anos de cadeia por agredir um líder estrangeiro. A pena foi reduzida a um ano e, com nove meses cumpridos, ele foi solto por bom comportamento. revolta contra Bush e a invasão norte-americana. Durante uma coletiva de imprensa, em dezembro passado, Zaidi lançou seu sapato contra Bush, que conseguiu desviar por pouco. ¿Esse é um pre- Muntazer Al-Zaidi abraça a irmã, ao chegar à emissora Al-Baghdadiya O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e o enviado especial dos Estados Unidos, George Mitchell, se reuniram ontem em Jerusalém para tentar estabelecer um acordo quanto aos assentamentos judaicos nos territórios palestinos. As decisões são cruciais para a retomada das negociações de paz. Durante três horas, Mitchell pressionou o governo israelense a interromper as construções nas colônias da Cisjordânia e de Jerusalém Oriental. Porém, essa ideia havia sido descartada por Netanyahu no dia anterior. ¿Eu disse aos americanos que poderíamos considerar uma redução nas construções por um período limitado de tempo¿, destacou o premiê na segunda-feira, ao jornal Yedioth Aharanot. Apesar do impasse, o emissário norte-americano para o Oriente Médio mostrou esperança em ¿levar a fase das discussões a uma conclusão rápida, para avançar em nossa busca de uma paz global na região¿. Ele disse, ainda, que tanto o governo norteamericano quanto o israelense ¿compartilham o mesmo sentimento de urgência¿ para a retomada das negociações. O escritório do primeiro-ministro de Israel afirmou que as conversas foram ¿boas¿ e que está previsto um novo encontro ainda hoje. Mitchell também se encontrou à noite com o presidente palestino, Mahmud Abbas, na Cisjordânia. De acordo com o chefe de negociação da Autoridade Palestina, Saeb Erekat, Abbas destacaria ao enviado norte- americano a impossibilidade de retomar o diálogo de paz com Israel sem a garantia de interrupção da expansão das colônias judaicas. Premiê rejeita fim de colônias O documento conclui que grupos armados palestinos foram culpados de crimes de guerra e, ¿possivelmente¿, de crimes contra a humanidade, ao lançarem foguetes. ¿Israel impôs um bloqueio equivalente a uma punição coletiva, dentro de uma política sistemática de isolamento progressivo e privação da Faixa de Gaza¿, acrescenta o documento. Falhas Em entrevista exclusiva ao Correio, por e-mail, o americano Richard Falk ¿ relator especial para a Palestina no Conselho dos Direitos Humanos da ONU ¿ considerou ¿correto¿ o documento ao culpar ambos os lados, mas apontou falhas nas conclusões. ¿Por terem sido lançados de forma deliberada contra civis, os ataques palestinos são crimes de guerra. No entanto, não tiveram a intenção de causar danos sistemáticos e em massa para receberem a denominação de `crimes contra a humanidade¿¿, comentou. Professor de direito internacional da Princeton University, Falk disse ainda que o Relatório Goldston cometeu um lapso, ao apontar que os lançamentos de foguetes palestinos praticamente inexistiram durante o cessar-fogo de 2008 e que o Hamas propôs a extensão indefinida da trégua. ¿Os ataques israelenses em Gaza parecem ter usado a ameaça dos Qassam como pretexto para esconder suas reais motivações, contrárias à lei internacional¿, observou. Um estudo divulgado pela organização não governamental B¿Teselem corrobora a posição da ONU. O documento da ONG revelou que 1.387 palestinos foram mortos na mega-ofensiva. Criança palestina perto dos escombros de sua casa, destruída pelas bombas de Israel: ¿força desproporcional¿ ¿Desse total, 773 não tomaram parte nas hostilidades, incluindo 320 crianças e 109 mulheres¿, disse à reportagem Jessica Montell, diretora da entidade. ¿Como parte da apuração, pedimos ao Exército a lista de baixas, mas eles se recusaram a apresentá-la, o que é uma vergonha¿, emendou. Segundo ela, ¿parece claro que Israel estava muito mais preocupado em proteger seus soldados do que resguardar a integridade física dos civis palestinos¿.