Título: Relação de diálogo, mas pouca ação
Autor: Barbosa, Flávia
Fonte: O Globo, 08/04/2012, Economia, p. 28

Relação de diálogo, mas pouca ação

Para americanos, mesmo com 3 reunião, agenda bilateral pouco avançou

WASHINGTON. Quando o presidente americano, Barack Obama, receber sua colega Dilma Rousseff amanhã, na Casa Branca, será o terceiro encontro oficial entre as duas potências das Américas em apenas 13 meses. Nenhum chefe de Estado teve tantas reuniões com Obama em tão curto espaço de tempo. Mas o que a diplomacia dos dois países vê como a comprovação do interesse mútuo no estabelecimento de uma parceria estratégica de longo prazo é, para muitos analistas americanos, sintoma de um vício nas relações bilaterais: muita conversa e pouca ação. A consequência é o avanço lento em medidas que podem acelerar as parcerias econômica e política, como a formalização de acordos tributário e de comércio e o apoio formal à candidatura do Brasil a uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU.

Na avaliação de quem acompanha de perto as relações entre os dois países, Brasil e EUA estão no estágio de tentar descobrir quais são os pontos comuns na agenda bilateral e como administrar diferenças importantes, como, por exemplo, a política nuclear do Irã e a reação à crise financeira internacional. Além disso, ainda tentam superar os anos de "indiferença benigna", formada por um sentimento antiamericano na diplomacia e na política brasileiras; e uma mentalidade moldada pela Guerra Fria do lado americano, que resiste a compreender que o mundo hoje é multipolar, e o Brasil, neste contexto, precisa ser reconhecido como potência.

- Poucos países falam tanto sobre parceria e relacionamento estratégicos e fazem tão pouco por isso - diz Peter Hakim, do think tank Diálogo Interamericano. - O problema é a forma como os dois países se tratam. O Brasil não leva muito em conta os interesses americanos, e a posição em relação ao Irã é um caso. Não é que tenha que ser feito o que os EUA querem (endossar sanções), mas é como administrar o desentendimento. Mas os EUA também não têm feito muito, como no caso da licitação (cancelada) da Embraer, ou como não dar ao Brasil o apoio que deu à Índia à vaga no Conselho de Segurança. E em não dar à viagem de Dilma o status de visita de Estado. O simbolismo é 95% das relações internacionais, pois representa reconhecimento.

Carl Meacham, assessor da Comissão de Relações Exteriores do Senado dos EUA, acrescenta que é necessário que as relações entre os dois países sejam sacramentadas por arcabouços institucionais que hoje são apenas cartas de intenções, como os acordos tributário, de comércio e de concessão de visto. O diálogo de alto nível entre os dois países - com mais de 20 grupos de trabalho - não pode depender exclusivamente do humor de líderes e chanceleres no poder. São esses arcabouços, diz ele, que vão transformar os temas de interesse em projetos concretos de cooperação e resguardar interesses estratégicos:

- Não creio que o governo Obama tenha devotado a necessária atenção ao Brasil. E como isso não ocorre, os EUA estão perdendo oportunidades nas grandes descobertas de petróleo, no comércio, estamos perdendo mercado para a China.

Julia Sweig, diretora de Estudos Latinoamericanos do think tank Council on Foreign Relations (CRF), reconhece que o ritmo das relações tem sido e continuará sendo lento, mas é menos cética.

- Estamos começando a ver, embora possa parecer insatisfatório, um processo de trabalho em que, com suas posições individuais, os países podem atuar juntos no cenário global. Não é o tipo de aliança que os EUA tinham no passado, com grandes nações na Ásia e na Europa (de alinhamento), é uma nova diplomacia que está sendo construída - avalia Julia.

Sua colega no CFR Shannon O"Neil ressalta que Dilma tem sido um agente catalizador importante nesta reaproximação. Os EUA, diz ela, veem com muito bons olhos mudanças de posição em relação a direitos humanos e ao próprio Irã.