Título: Impasse atrasa início de investigação
Autor: Lima, Maria
Fonte: O Globo, 12/04/2012, O País, p. 3

Governistas querem excluir empresas privadas do foco da CPI, o que oposição não aceita

BRASÍLIA. A base governista trabalhou intensamente ontem para assegurar o comando da já chamada "CPI do Cachoeira" e para impedir que as investigações saiam de controle e atinjam governos e parlamentares aliados da presidente Dilma Rousseff. Para os governistas, o ponto mais sensível é a possibilidade de se investigar ou não agentes privados. Ao longo do dia, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), e líderes partidários, contrariando posição de senadores petistas, defendiam que fosse feita essa exclusão. A oposição, com o PSDB à frente, defende investigação sem limites.

A proposta final do PT da Câmara, um texto genérico apresentado ontem perto das 22h, deixou de fora do objeto de investigação da CPI agentes públicos e da iniciativa privada. O texto, que integra o requerimento de criação da CPI, diz que ela é destinada a investigar, no prazo de 180 dias, "práticas criminosas desvendadas pela Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, com envolvimento do senhor Carlos Augusto Ramos, conhecido vulgarmente como Carlinhos Cachoeira, sem prejuízo de aditamento de fatos que se ligam, intimamente, ao objeto principal, particularmente à existência de um esquema de interceptações e monitoramento de comunicações telefônicas e telemáticas ao arrepio do princípio de reserva de jurisdição".

Para a oposição, a proposta ficou vaga e deixa em aberto a possibilidade de não se investigar os agentes públicos envolvidos, as empresas citadas e, tampouco, investigar as relações antigas de Cachoeira. O ressurgimento do caso Waldomiro Diniz, por exemplo, fica descartado. Diante desse texto, a oposição pode não assinar a CPI.

- Não teve nenhum acordo. Se o Congresso pode ou não investigar empresa privada quem vai decidir é a CPI. Nós mandamos nossa sugestão de texto para a Câmara e estamos aguardando a resposta para começar a coletar assinaturas - disse o líder do PT, Walter Pinheiro (PE), que apresentou uma primeira versão do requerimento não excluindo as empresas privadas.

Para a oposição, o objetivo evidente dos governistas é restringir as investigações sobre a Construtora Delta, que mantém negócios bilionários com o governo federal, sendo uma das principais empreiteiras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), e com vários governos estaduais comandados por PT e PMDB.

- Se começarem a restringir as investigações, isso não é CPI. É preciso apurar tudo - protestou o presidente do PSDB, Sérgio Guerra (PE).

Diante desse impasse, está descartada a possibilidade de instalação da CPMI ainda esta semana, como anunciado na véspera.

- Não podemos fazer uma coisa tão ampla que se perca no conteúdo e no tempo - disse o líder do PT, Jilmar Tatto (SP).

Mesmo com a nova versão do requerimento, Marco Maia afirmou que o texto ainda depende de consenso. Disse, porém, que a CPI irá investigar todos os envolvidos na investigação da Operação Monte Carlo, no âmbito público e no privado .

- Não há condição da CPI ser restrita aos congressistas. Se fosse assim, não precisaríamos fazer CPI. Vamos investigar tudo e todos os envolvidos na Operação Monte Carlo. Não há nenhuma condição disso (a CPI subir no telhado) acontecer. A CPI será criada e irá cumprir sua meta de apurar tudo. Todo mundo quer que se investigue. Nós queremos a investigação, a presidente Dilma quer, o Lula quer - disse Maia.

A maior preocupação com os rumos da CPI tem sido manifestada pelos parlamentares do PMDB. Na noite de segunda-feira, durante passagem por Brasília para participar da festa de aniversário do PMDB, o governador do Rio, Sérgio Cabral, mostrou preocupação, em conversas reservadas, com as investigações sobre a empresa Delta. Mas, de público, evitou opinar sobre a CPI.

Na festa de aniversário do PMDB, anteontem, o vice-presidente Michel Temer também se mostrou preocupado:

- É aquela história: CPI a gente sabe como começa, mas não sabe como termina.

No mesmo jantar, os peemedebistas, de forma reservada, diziam não compreender a atitude do governo, de lavar as mãos.

- Essa vai ser a CPI do Fim do Mundo 2 -, disse um integrante da cúpula do PMDB, referindo-se à extinta CPI dos Bingos, temendo o descontrole da investigação.

Os peemedebistas alertam, principalmente, sobre o risco de se aprofundar as investigações relativas à Delta, e chamaram de "tática suicida o comportamento do PT.

- Isso é que nem o cara dar um tiro no capitão do Titanic -, disse um senador.

A única coisa certa até agora sobre a CPMI do Cachoeira é que ela terá 30 integrantes (15 senadores e 15 deputados), será presidida pelo PMDB e o relator será do PT. (Maria Lima,, Paulo Celso Pereira, Isabel Braga e Fernanda Krakovics)