Título: Código Florestal governo é derrotado em votação
Autor: Souza, Andre de
Fonte: O Globo, 26/04/2012, O País, p. 15

BRASÍLIA. A Câmara dos Deputados impôs ontem uma derrota ao governo Dilma e aprovou o relatório do deputado Paulo Piau (PMDB-MG), com mudanças no texto do Código Florestal. O governo era favorável ao projeto aprovado pelo Senado no ano passado, sem as mudanças de Piau. Entre outros pontos do texto, acaba a obrigatoriedade de reflorestar a margem de rios com mais de 15 metros de largura onde já havia áreas rurais consolidadas antes de 22 de julho de 2008. Foram 274 votos a favor do relatório, 184 contrários e duas abstenções.

Quando o resultado foi anunciado, houve comemoração da bancada ruralista em plenário, mas os deputados ligados aos produtores rurais já falam em apresentar outro projeto de lei para também acabar com a obrigatoriedade de recompor com vegetação nativa a margem de rios com largura de até dez metros.

Resultado foi menos folgado que o do ano passado

A presidente Dilma Rousseff já sinalizou que vai vetar o artigo 62 do Senado, do qual Piau retirou a obrigatoriedade de reflorestar a margem dos rios maiores, e vai editar medida provisória para suprir a lacuna jurídica. O governo avalia que o texto do relator é uma anistia aos desmatadores.

O resultado de ontem foi bem menos folgado que o verificado no ano passado, quando foram 410 votos favoráveis ao projeto original e 63 contra.

No novo texto, apicuns e salgados, áreas de solos salinos adjacentes aos manguezais, não são mais considerados áreas de preservação permanente. Também foi retirada a exigência de 20m² de área verde por habitante, em áreas de expansão urbana. Nas áreas de preservação permanente na zona urbana, o relator deu liberdade para que os conselhos estaduais e municipais de meio ambiente definam sua extensão, sem precisar seguir a metragem estabelecida no código.

Apesar de contrariados na questão da margem de rios até dez metros de largura, os ruralistas aprovaram o relatório de Piau, como explicou o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado Moreira Mendes (PSD-RO):

- Esta é a lei que podemos fazer agora. E tenho certeza de que as gerações futuras, que virão ocupar aqui os nossos lugares, subirão nesta tribuna aqui mais à frente para mudar essa legislação, arrependidos dessa história de reserva legal, de APP, que é só conversa fiada, porque, na verdade, o que importa é a produção de alimentos.

O relator também suprimiu do projeto aprovado pelo Senado trecho determinando que, cinco anos após a publicação da lei, as instituições financeiras só poderão conceder crédito agrícola a propriedades que estejam inscritas no Cadastro Ambiental Rural (CAR). A justificativa de Piau é que o governo pode ser ineficiente para cumprir o prazo, hipótese na qual os produtores serão penalizados mesmo sem culpa.

Segundo ministros, desde anteontem Dilma tinha avisado que preferia a derrota a ceder aos ruralistas. Interlocutores de Dilma admitiram que foi vitória dos ruralistas, mesmo com recuos ao longo do dia, mas destacaram o aumento do número de deputados que votaram com o governo, quando se compara com a votação de maio do ano passado.

O projeto que altera o Código Florestal tramita no Congresso há mais de 12 anos, mas foi aprovado pela Câmara só em 2011, quando o governo sofreu sua mais dura derrota. Em dezembro, o Senado fez alterações, aproximando o texto a uma posição mais próxima do Planalto. Como foi modificado, o projeto precisou voltar à Câmara.

Relator teve de recuar em relação aos rios menores

Piau teve que recuar na questão dos rios menores, após o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS) apontar falha regimental no relatório. Maia decidiu que esse trecho do projeto aprovado no Senado não poderia ser retirado pelo relator, uma vez que também já estava no projeto aprovado pela Câmara no ano passado. Seguindo o regimento da Câmara, Maia afirmou que o relator poderia aceitar ou rejeitar as mudanças feitas pelo Senado, mas não poderia suprimir parte do texto original.

Além de acatar a decisão, Piau pediu a volta de outro parágrafo, que limita a recomposição da mata nativa ao limite da reserva legal. Se esse limite for de 20%, o produtor não precisará reflorestar nada além disso, mesmo que, por exemplo, 30% da propriedade sejam compostos de APPs.

Em destaque votado em separado depois, os ruralistas conseguiram nova vitória: foi eliminado o dispositivo que obriga a disposição dos dados do CAR para acesso público na internet.