Título: Com Reino Unido são 4 em recessão na UE
Autor: D'Ercole, Ronaldo
Fonte: O Globo, 26/04/2012, Economia, p. 27

LONDRES, BERLIM e SÃO PAULO. A entrada do Reino Unido - e da Espanha - em um novo ciclo de recessão confirma o recrudescimento da crise na União Europeia, iniciado com o estresse financeiro em torno da renegociação da dívida grega no fim de 2011. Portugal e Itália, que como a Espanha enfrentam séria crise fiscal decorrente do excesso de endividamento do setor público, já estão em recessão técnica (dois trimestres seguidos com o PIB negativo) desde o ano passado, e o resultado do primeiro trimestre deve mostrar novas quedas na atividade.

Ontem, o Escritório Nacional de Estatísticas do Reino Unido anunciou ontem que seu Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país) recuou 0,2% no primeiro trimestre de 2012, configurando a segunda recessão britânica desde a crise financeira. O resultado surpreendeu as projeções, que em média apontavam para um crescimento de 0,1%. No último trimestre de 2011, a atividade do país já havia recuado 0,3%

Alemanha prevê menos crescimento este ano

A expectativa entre os economistas é de que os indicadores negativos predominem neste período e só comecem a se estabilizar ao longo do segundo semestre, com alguma recuperação em grandes economias do bloco, como Alemanha e França. O Ministério da Economia da Alemanha anunciou ontem que sua economia vai crescer somente 0,7% este ano e só retomará um ritmo mais consistente de crescimento em 2013, quando deverá ter expansão de 1,6%. Já as perspectivas para os países em pior situação fiscal (Itália, Espanha e Portugal, entre outros) é de que fechem o ano com desempenho negativo do PIB.

- Os dados de Espanha e Reino Unido mostram que estamos no auge da segunda fase da crise na região, e que a recuperação da Europa vai ser muito longa - diz o economista Antonio Corrêa de Lacerda, da PUC de São Paulo.

As projeções mais recentes do Fundo Monetário Internacional (FMI) para os PIBs de Itália, Portugal e Espanha apontam para quedas de 1,9%, 3,3% e 1,8% respectivamente este ano. Alemanha (0,6%) e França (0,5%) ainda terão alguma expansão nas suas economias, mas no conjunto a economia da zona do euro deve encolher 0,3% em 2012, diz o FMI.

- Todo o estresse financeiro do fim do ano passado agora se materializa na economia real. Os agentes gradualmente perdem a confiança, ninguém investe e as pessoas relutam em consumir, o que acaba derrubando a atividade - diz Raphael Martello, economista da consultoria Tendências. - Essa primeira metade de 2012 vai ser ruim de maneira geral no bloco e as economias mais problemáticas serão as que mais sofrerão.

As injeções de liquidez promovidas pelo Banco Central Europeu (BCE) no início do ano, diz Martello, ajudou a regular a liquidez no setor bancário da região, mantendo o crédito fluindo. Isso não significa que se verá grande melhora no quadro econômico do bloco. Apenas estanca um pouco a queda na atividade.

- Ao longo do segundo semestre devemos ter a Europa mais estável, mas com algum crescimento só em 2013 - diz o economista da Tendências.

Felipe Queiroz, analista da Austin Rating, porém, vê limitações na capacidade do BCE estimular a economia do bloco.

- Com a demanda retraída e os déficits muito elevados não há como os governos estimularem suas economias. E a ação do BCE não é garantia de estímulo porque, sem confiança entre consumidores e agentes econômicos, pode haver um "empoçamento" de recursos, como já aconteceu antes - afirma Queiroz.

Lacerda, da PUC-SP, lembra que as políticas de austeridade adotadas pelos países mais afetados, como cortar salários, aposentadorias e investimentos, além de demissões em massa de funcionários públicos, são "mecanismos autofágicos":

- Essas ações ajudam a recuperar certa confiança dos mercados, mas cobram seu preço do ponto de vista da atividade. É uma situação em que a Europa patina e é difícil isolar os países, o que torna a retomada mais complicada - diz Lacerda.

Para analistas, crise não deve rachar zona do euro

A continuidade do crescimento das economias emergentes, especialmente da China, combinada com a recuperação moderada dos Estados Unidos devem contribuir para a recuperação gradual da Europa, na avaliação de Martello, da Tendências, com a demanda de exportações da região.

- A Alemanha vai continuar crescendo, mas teremos vários anos de baixo crescimento no bloco, até que os países façam suas reformas para recuperar a estabilidade fiscal e a competitividade - prevê.

Apesar da fragilidade de alguns membros e da complexidade do processo de superação deste novo ciclo da crise na região, os economistas acham pouco provável que haja rupturas com a saída de membros da zona do euro.

- O preço de sair da zona do euro é mais caro e o bloco deve permanecer, mesmo com essas dificuldades - diz Lacerda, da PUC-SP.

(*) Com agências internacionais