Título: Ideal é julgar antes de 6 de julho
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 15/04/2012, O País, p. 3

BRASÍLIA. Sergipano de Propriá, o ministro Carlos Ayres Britto, de 69 anos, vai assumir a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) na próxima quinta-feira. Será dele a tarefa de presidir o julgamento do mensalão, evento que ele quer marcar para antes do processo eleitoral, que começa em 6 de julho. Mas avisou que, se isso não for possível, ainda assim marcará o julgamento. Ao GLOBO, disse que os partidos políticos no Brasil ainda não têm "consistência ideológica" e, por isso, prefere votar em candidatos, não na legenda. Revelou que, por três vezes, percebeu que votou errado após um julgamento, mas já não havia mais nada a ser feito.

O GLOBO: O STF está para julgar o mensalão e, dependendo do resultado, o PT pode sair enfraquecido em ano eleitoral.

CARLOS AYRES BRITTO: Para nós julgadores, o mensalão impressiona pela quantidade de réus, pelo número de páginas do processo, pelo número de testemunhas. Mas, quanto ao nosso ânimo de fazer justiça, ele é um processo igual aos outros. O que nos cabe é perseverar na isenção, na imparcialidade, na análise objetiva das peças do processo, sem prejulgamentos.

O senhor, como presidente do STF, vai pautar o julgamento para breve?

AYRES BRITTO: Seja quem for o presidente do Supremo, um processo dessa envergadura, no campo quantitativo pelo menos, e em ano eleitoral, ele fará o possível para que não corram concomitantemente esse tipo de processo avultado, complexo, e o processo eleitoral. O ideal é que um não corra paralelo com o outro. Se for possível julgar o mensalão antes do dia 6 de julho, quando começa o processo eleitoral, é o ideal.

AYRES BRITTO: Paciência.

AYRES BRITTO: Sim. O ideal é o número 11, ímpar. Mas, se só tiver dez, qual o presidente que vai esperar nomear o substituto do ministro Peluso, que você não sabe quando vai acontecer, e deixar o processo sem julgamento?

AYRES BRITTO: Sim, ela é uma das mais belas novidades transformadoras do país, porque tem o potencial de qualificar a nossa vida política, e o Brasil precisa de qualidade de vida política mais que tudo.

AYRES BRITTO: Eu fico entristecido, mas não desalentado, porque jamais devemos desertar da luta por um Brasil passado a limpo. Eu fico triste, mas eu não jogo a toalha nunca.

Na hora de votar, o senhor tem dificuldade para escolher os seus candidatos?

AYRES BRITTO: Não, eu faço logo a minha triagem, a minha seleção. Eu sou muito seletivo na escolha dos meus candidatos e nunca experimentei dificuldade maior.

AYRES BRITTO: Hoje, eu não tenho partido. Hoje, o meu partido se chama Constituição, a minha militância é exclusivamente constitucional. Ultimamente, tenho votado mais em candidatos do que em partidos.

AYRES BRITTO: O ideal seria que você votasse em uma legenda.

AYRES BRITTO: É preciso aguardar mais uns anos para que os partidos obtenham um pouco mais de consistência ideológica. Por enquanto, nos últimos anos, eu tenho votado mais, confesso, em candidatos.

AYRES BRITTO: Eu tive tantos dias bons... O melhor eu acho que foi quando consegui emplacar a tese de que o gozo do direito à aposentadoria voluntária, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição, não implica a ruptura automática do vínculo de emprego. Foi uma decisão que deu a uma massa de milhões de trabalhadores uma duplicidade de renda. Significou uma injeção de recursos financeiros na musculatura econômica do trabalho como valor. O poder aquisitivo da classe trabalhadora foi densamente encorpado. Isso me deu uma alegria muito grande, porque isso encurta a distância social.

AYRES BRITTO: Umas três vezes eu experimentei tristeza quando proferi votos, e ,dois, três dias depois, eu encontrei um equacionamento diferente do que eu havia encontrado na ocasião de votar. Ou seja: votei de um jeito e dois, três dias depois, foi que me bateu a inspiração para um equacionamento diferente.

AYRES BRITTO: Eu tenho um exemplo, mas não quero citar nesse momento, porque vou reabrir feridas. Esse caso até foi pior: eu votei de um jeito, em cima de uma informação, e, depois, vim a saber que a informação não era procedente.

AYRES BRITTO: É. Eu encontrei um equacionamento melhor para a causa só alguns dias depois.

AYRES BRITTO: Não tinha como. A matéria já estava vencida.

O presidente do STF, Cezar Peluso, baixou norma estabelecendo que processos e inquéritos cheguem ao tribunal apenas com as iniciais dos investigados, sem o nome deles. Depois, o relator decide se abre o sigilo ou não. O senhor pretende revogar esse ato?

AYRES BRITTO: Não vou mudar solitariamente métodos de trabalho do ministro Peluso, conversarei com os outros ministros. Mas, pessoalmente, sou pela interpretação ultrarrestritiva das normas que sinalizam segredo de justiça. Acho que os processos devem chegar com os nomes. Claro que, em se tratando de menores, ou de casos de família, aí a regra é o sigilo. Fora dessas hipóteses, só casos excepcionalíssimos me levariam a imprimir segredo de justiça à tramitação de um processo.

Como presidente do CNJ, o senhor pretende propor a unificação dos critérios de acesso às informações de processos que tramitam nos tribunais?

AYRES BRITTO: O que eu puder desburocratizar, facilitar, desinibir o acesso, no âmbito do CNJ, eu farei. Já atendendo à Lei de Acesso à Informação, que é uma lei importante.

AYRES BRITTO: É minha intenção colocar à frente das tratativas o CNJ, e não o Supremo. O CNJ lida com números e pode fazer comparações de sistemas de remuneração entre os poderes. Eu vou propor a formação de uma comissão tripartite, com Executivo, Legislativo e Judiciário, para trabalhar em cima de estatísticas, de comparação entre cargos em termos remuneratórios. À medida que se confirme defasagem em desfavor do Judiciário, aí batalharemos pela equiparação.

AYRES BRITTO: Eu, pessoalmente, entendo que na casa onde trabalha o ministro ou desembargador não deva trabalhar o filho.