Título: Apesar de lucros recordes, bancos privados do país seguram o crédito
Autor: Oswald, Vivian
Fonte: O Globo, 15/04/2012, Economia, p. 32

BRASÍLIA. Na contramão do que deseja o governo, os bancos privados estão mais cautelosos na hora de emprestar e o crédito não flui com facilidade. Com lucros recordes e sem repassar ao consumidor a queda dos juros básicos, a freada na concessão de financiamentos fica evidente nos balanços mais recentes do setor. De acordo com o Banco Central (BC), enquanto os bancos públicos emprestaram 4,8% a mais em fevereiro, os privados nacionais aumentaram apenas 0,3% o número de financiamentos em relação ao mês anterior. E ainda registraram queda no volume de recursos destinados à indústria, financiamento rural e comércio.

- Agora, tudo se inverteu: primeiro, a gente aprova a ficha do cliente. Só depois ele escolhe o carro - afirma Flávio Barbosa, gerente de uma revenda de automóveis de Brasília.

Ele estima que as vendas de veículos - tanto novos quanto usados - caíram entre 30% e 40% somente no mês passado devido à reticência das instituições com o crédito, inclusive das próprias montadoras, que se retraíram alegando aumento da inadimplência. O calote no setor alcançou seu ponto máximo no mês passado. Atualmente, são raros os cadastros aprovados com zero de entrada. A reclamação de Barbosa faz coro com a de outros setores sensíveis a financiamentos.

- Houve um aumento da inadimplência, e o crédito ficou mais caro - diz o economista-chefe da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castello Branco.

Para o ex-diretor do BC Carlos Thadeu de Freitas, estava na hora de essas instituições começarem a correr mais riscos, aumentando a circulação dos seus recursos, que estão num nível recorde.

- Hoje, os bancos no Brasil ganham de qualquer jeito, com ou sem inflação, por causa das altas tarifas - aponta.

Para Febraban, há uma retração moderada

Segundo ele, mesmo com a "choradeira" para que o governo tome medidas antes de uma redução dos juros ao consumidor, essas instituições terão de derrubar suas taxas. Ele comemora o fato de Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal voltarem a agir como bancos oficiais, forçando uma redução do custo dos empréstimos no país. E diz que as outras instituições seguirão no mesmo caminho, porque a inadimplência deve cair no segundo semestre, e atividade e consumo crescerão com mais força. Quem não se adaptar perderá mercado.

Para o professor da Trevisan Alcides Leite, esse movimento de retração é pontual. Começou no início do ano por causa das notícias de que os bancos públicos cortariam suas taxas. Os bancos privados estariam esperando o pacote para redefinir suas ações, e o momento atual, segundo Leite, seria então de redimensionamento do mercado brasileiro.

- É uma justificativa mais política do que econômica - afirma ele.

Os bancos públicos aumentaram em 22% os empréstimos nos últimos 12 meses. É a mesma taxa de um ano atrás. Já os privados nacionais expandiram suas carteiras 12% nesse período. Há cerca de um ano, a taxa era de 22%.

Hoje, o volume de crédito das instituições públicas representa 21,4% do PIB, enquanto o dos bancos privados nacionais corresponde a 19%. Já o que as instituições estrangeiras emprestam por aqui equivale a 8,4% de tudo o que a economia produz.

A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) não comenta a queda no financiamento dos bancos privados nacionais nem a dificuldade de aprovação no cadastro. Se limita a informar que o crédito total continua a crescer, porém mais lentamente.

Segundo a entidade, "observa-se uma moderação no segmento. Os resultados da nossa última Pesquisa de Projeções e Expectativas do Mercado antecipam uma expansão do crédito na faixa de 15% a 16% (saldos, em termos nominais). É um resultado razoável, mas que não parece contemplar uma forte aceleração ao longo do ano, como era quase consensual até um tempo atrás".