Título: No papel apoio quase total
Autor: Braga, Isabel; Pereira, Paulo Celso
Fonte: O Globo, 20/04/2012, O País, p. 3

Com a adesão de 90% dos senadores e de 75% dos deputados, a Comissão Parlamentar Mista de Investigação (CPMI) do Cachoeira foi criada ontem no Congresso Nacional. O tamanho do apoio é proporcional à atenção que os partidos estão dando à comissão neste momento. Os líderes da base aliada resolveram seguir o que já havia sido feito pela oposição e estão indicando alguns de seus parlamentares mais experientes para integrar a comissão de investigação sobre as suspeitas relações do bicheiro Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, com políticos e empresários - por enquanto, a empreiteira Delta figura no inquérito da Polícia Federal como parceira do esquema. A CPI mista será instalada na próxima terça-feira, e deve começar a funcionar já na semana que vem.

Até o PMDB, que no início não queria se envolver no caso, pode rever nos próximos dias as indicações que havia feito na Câmara. O PMDB já decidiu que o senador Vital do Rêgo , da Paraíba, será o presidente da comissão. A sensação disseminada é que os rumos que a comissão tomará são imprevisíveis e que, portanto, é bom todos estarem preparados.

- O número de assinaturas inédito e o volume de acusações com fatos documentados colocam o Congresso diante de uma tarefa decisiva. Uma CPI que acabe em pizza vai ser a maior desmoralização da nossa história - disse o líder do PSOL, Chico Alencar, ao discursar na sessão do Congresso que criou a comissão.

Na última parcial divulgada ontem à noite pela Secretaria Geral do Senado, 385 deputados e 72 senadores haviam assinado o requerimento da CPI mista. Mas esse número poderia ser alterado até meia-noite. Segundo líderes dos partidos, no PT, 80 dos 85 deputados da bancada assinaram. No PMDB, 60 dos 79. No PSDB 50 dos 53 e todos os 27 do DEM.

Assinatura enviada até pelo correio

A preocupação em figurar entre os que assinaram levou o deputado Otávio Leite (PSDB-RJ), que estava fora de Brasília, a mandar sua assinatura por Sedex. O líder do PSDB, Bruno Araújo (PE), pregou transparência e efetividade nas apurações:

- Esperamos que essa CPMI possa dividir com o país, em pleno processo eleitoral, as entranhas do crime organizado, as entranhas das empresas que participam de forma nada republicana, de forma absolutamente abusiva e invasiva nas relações com o poder público.

Palavras semelhantes foram usadas pelo líder do PT, Jilmar Tatto (SP), que defendeu serenidade e profundidade na condução da CPMI, lembrando o poder de quebra de sigilos fiscal e telefônico de empresas e pessoas. Ele afirmou que o PT está disposto a investigar tudo, sem prejulgar e dando direito de defesa.

- Não se preocupe a oposição. Aqui não há caça às bruxas. E não vai ter pizza! Não vamos aceitar condenar o PT. Não vamos aceitar condenar o governo. Não vamos aceitar condenar ninguém. Vamos trabalhar com prudência, muita seriedade, e aqueles que estiverem ligados a esse crime organizado vão ter que pagar. De nossa parte, não se preocupem, vamos apurar e, doa a quem doer, vamos ter de passar a limpo este país - disse Tatto.

O tom de Tatto é bem diferente do adotado pelos petistas mais afinados com o Palácio do Planalto. Mas esse desencontro no próprio PT, somado à distância e ao silêncio adotados pela presidente Dilma Rousseff sobre a CPI mista, vem deixando desorientados os parlamentares mais experientes da base aliada. Muitos não sabem que tipo de requerimento deverá ser evitado e se há interesse real de pôr a oposição na mira.

- Ninguém sabe o que a Dilma quer, cada um diz uma coisa - reclamou um senador aliado.

PT e PMDB, os dois maiores partidos do Congresso, vêm enfrentando o mesmo problema. Até agora nenhum deles definiu quais serão seus representantes na CPI mista. Mesmo o PMDB da Câmara, que já anunciara seus nomes, deve fazer mudanças.

O fato de a oposição ter indicado seus nomes mais experientes levou os caciques do PMDB a se movimentarem para que o líder Henrique Eduardo Alves(RN) reveja as nomeações de Íris de Araújo (GO) e Luiz Pittman (DF). Os dois são considerados inexperientes. A saída de Pittman já é quase certa, pois os peemedebistas temem que sua presença dê a entender que o partido está trabalhando para derrubar o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT). O vice de Agnelo é Tadeu Filipelli, do PMDB.

O deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), que integrará a CPI mista, lembrou sua participação em duas CPIs: do Collor e dos Anões do Orçamento. Para ele, essa CPI mista de agora se diferencia por já começar com inquéritos prontos e o Ministério Público pedindo ao Supremo Tribunal Federal (STF) a abertura de processo.

- Estamos empenhados na verdade do que se passa no Brasil. Não estamos empenhados em jogos de perseguição, jogos partidários, jogos eleitorais - disse Miro.