Título: Entre o Direito e a poesia
Autor: Souza, André de
Fonte: O Globo, 20/04/2012, O País, p. 14

BRASÍLIA. Em 1993, quando completou 50 anos, Carlos Ayres Britto escreveu uma poesia chamada "Cinquentão": "Fiz cinquenta anos/Só preciso de mais uns dez/Para me sentir completamente/jovem". Pelas suas contas, hoje, aos 69 anos, o ministro está no auge da juventude. Ayres é repentista, que olha uma situação e logo produz um verso. Dia desses, disse para os assessores em seu gabinete: "Advogado de porta de cadeia acaba entrando".

A produção poética e os trocadilhos não se limitam à vida privada. Nos julgamentos no plenário do STF, o ministro gosta de improvisar, de citar autores ou a si mesmo. Já recitou em plenário algumas vezes uma poesia chamada "Liberdade", de sua autoria, de 1964: "A liberdade de expressão/em verdade/é a maior expressão/ da liberdade".

Apesar de estar sempre às voltas com processos do tribunal, Ayres Britto gosta de espairecer. Acorda todos os dias antes do nascer do sol para meditar. Não come carne e faz caminhadas diárias. Sempre arranja um tempo de encontrar amigos poetas, nos cafés de Brasília ou mesmo nas casas deles. Semana passada, teve um encontro com Manoel de Barros, poeta cuiabano de 94 anos - que, inclusive, foi convidado para a cerimônia de posse.

Ayres Britto nasceu em Propriá, no interior de Sergipe, e mantém até hoje o mesmo sotaque, como se tivesse saído de lá ontem. Formou-se em Direito pela Universidade Federal de Sergipe em 1966 e fez curso de pós-graduação para Aperfeiçoamento em Direito Público e Privado na mesma instituição. Na Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, cursou mestrado em Direito do Estado e doutorado em Direito Constitucional.

Publicou cinco livros jurídicos e seis de poesia. Está com mais um para ser editado - de poesia, não de Direito. É casado com Rita, uma mulher que faz seus olhos brilharem de orgulho sempre que mencionada, e tem cinco filhos.

Foi nomeado para o STF em 2003, pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No plenário, quando há discussões, é o primeiro a tentar pacificar os ânimos. E, apesar de não cultivar inimizades, pelo menos publicamente, tem na ponta da língua uma tirada para referir-se a eventuais algozes: "Não interrompa o inimigo enquanto ele estiver errando". (Carolina Brígido)