Título: Plano para cana exclui pantanal e Amazônia
Autor: Santos, Danielle
Fonte: Correio Braziliense, 18/09/2009, Brasil, p. 10

Governo delimita áreas de plantio e desagrada a governadores de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, que esperam compensação

Plantação de cana: o Brasil é o primeiro em exportação e pretende expandir as áreas de cultivo em 7%

Após um ano de embates internos envolvendo a disponibilização de novas áreas para o plantio da cana-de-açúcar, os ministros da Agricultura, Reinhold Stephanes, e do Meio Ambiente, Carlos Minc, conseguiram lançar, na presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, um plano para o setor. Uma das maiores polêmicas entre as duas alas governistas girava em torno do uso de terras da Bacia do Alto Paraguai para o cultivo. A pressão partiu, em princípio, dos governadores de Mato Grosso, Blairo Maggi, e Mato Grosso do Sul, André Puccinelli, que já têm investimentos naquela região. Prova do desacordo com a decisão do governo federal foi a ausência dos dois no anúncio do plano, apesar de estarem em Brasília.

Um assessor próximo de Maggi informou que, para acalmar os ânimos, o presidente teria prometido compensar o estado pela perda dos empreendimentos no Alto Paraguai ¿ Mato grosso tem oito usinas de álcool na região e será obrigado a desativá-las por falta de licenciamento. Do outro lado da defesa, Minc disse que ajudou a ¿apagar o fogo¿ perante os governadores ruralistas ao explicar que, no fim das contas, ninguém sairia perdendo. ¿Só nos dois estados teremos, de acordo com a nossa proposta, 12 milhões de hectares de terras boas, planas e que cumprem todos os quesitos para o plantio, então, conseguiremos mostrar de que forma eles (os estados) não serão prejudicados¿, ressaltou o ministro.

O novo plano, que será encaminhado ao Congresso por meio de Projeto de Lei (PL), prevê a liberação de 64 milhões de hectares para o cultivo da cana-de-açúcar com objetivo de avançar na política da produção de etanol e açúcar. Hoje, o Brasil é o primeiro no mundo em produção e exportação, além de ocupar a segunda posição na produção do etanol, e ocupa para isso apenas 1% da área agricultável no país, o que representa 8,89 milhões de hectares. A previsão é de que, com as novas regras, a expansão ocorra em 7,5% do território nacional. O governo, por sua vez, excluiu, além da Bacia do Alto Paraguai, áreas de vegetação nativa, da Amazônia e do pantanal para essa finalidade. Ainda assim, o ministro Stephanes acredita que o PL não sofrerá resistência da bancada ruralista.

Preocupação maior com o desemprego

Além da delimitação das áreas para cultivo da cana, o PL prevê também a extinção do corte manual das lavouras, que utilizam a prática da queimada, favorecendo a emissão de gases do efeito estufa. Para isso, o setor deverá ser mecanizado até 2017. Apesar da medida acabar com o trabalho insalubre dos cortadores de cana, ela preocupa os representantes dos trabalhadores porque, segundo dados do próprio governo, impactará diretamente no desemprego de 500 mil pessoas ligadas ao setor.

O presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, Alberto Broch, disse temer a falta de agilidade de uma política específica para atender essa demanda e se reunirá com o governo para tratar da questão. ¿O ministro da Agricultura não anunciou agora que haverá uma quantidade de terras disponíveis para o plantio da cana? Pois vamos sentar com o ministro do Trabalho para propor duas coisas que atendam o trabalhador desempregado em decorrência da mecanização: um forte trabalho de requalificação profissional e a disponibilização de terras para reforma agrária como alternativa deles sobreviverem¿, afirma.

Segundo o governo, a quantidade de gases que serão evitados com a ausência da queima da palha da cana, como ocorre atualmente no processo da pré-collheita, equivale, aproximadamente, à mesma quantidade emitida por 2 milhões de veículos a gasolina.

¿Essa será uma tarefa difícil, penosa, mas por outro lado a questão da queimada é fundamental porque é ali que está grande parte da emissão do dióxido de carbono. Então, queremos trabalhar num espaço cinco anos para treinar essa mão de obra e absorvê-la pelo próprio setor em atividades mais importantes e menos desgastantes¿, rebateu o ministro Reinhold Stephanes.

Além do projeto de lei, o presidente Lula assinou um decreto que permitirá para essas novas áreas condições de crédito rural e agroindústrial, estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional.

Preservação Os governadores da Amazônia Legal que estiveram reunidos com o presidente Lula antes do anúncio da expansão de áreas para o plantio da cana conseguiram avançar nas exigências quanto ao pagamento pela preservação da região. Depois do assunto ter criado uma saia-justa com o Itamaraty, que acreditava que a entrada de dinheiro estrangeiro poderia ferir a soberania nacional, os nove representantes da floresta levaram vantagem e ainda discutiram uma forma de criar um fundo público com dinheiro dos países desenvolvidos para essa finalidade. ¿O Brasil vai defender na COP 15 que esse fundo seja U$ 400 bilhões ao ano para os que defendem a floresta de pé¿, destacou Carlos Minc, que também participou do encontro.

Além do fundo, a aplicação do REDD, que era a briga entre governo e governadores, foi consensual, de modo a não prejudicar a Região Amazônica. (DS)