Título: FMI garante US$ 430 bi, mas Brics racha
Autor: Barbosa, Flavia
Fonte: O Globo, 21/04/2012, Economia, p. 28

China e Rússia fixam valor para reforçar caixa do Fundo contra crise. Brasil e Índia querem anúncio só em junho

WASHINGTON. O Fundo Monetário Internacional (FMI), após reuniões do G-20 (grupo das 20 maiores economias) e do Comitê Monetário e Financeiro Internacional (órgão ministerial máximo da instituição), conseguiu assegurar um reforço de caixa de pelo menos US$ 430 bilhões para futuras ações de contenção de efeitos da crise financeira - como o socorro a sócios. O Brics (sem África do Sul) rachou, com China e Rússia definindo apoio e valor da contribuição, enquanto Brasil e Índia defenderam que o aporte do grupo só seja anunciado em junho, na reunião de cúpula do G-20. Houve uma saída intermediária, negociada, para transparecer união de posição.

China e Rússia informaram seus valores ao FMI, mas não os tornaram públicos. Brasil e Índia anunciaram aos demais sócios no Fundo apenas compromisso em participar do esforço. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, porém, negou que tenha havido divergências. O cacife estimado do Brics é de cerca de US$ 80 bilhões.

O racha ficou evidente no primeiro comunicado do FMI após o fim do encontro do G-20. No texto, assinado pela diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, revela-se que China e Rússia estão no grupo de países que assumiram para Lagarde "compromissos firmes e específicos", e coloca o Brasil e a Índia entre as nações que "indicaram que estarão entre os contribuidores".

Específico é o termo usado por Lagarde para descrever, na mesma nota, o compromisso dos países que divulgaram valores. E, no quadro dos aportes, US$ 72 bilhões são atribuídos a China, Rússia e outros países que firmaram compromisso. O aporte dos dois Brics é estimado em cerca de US$ 50 bilhões e US$ 10 bilhões, respectivamente.

Comunicado tem 2 versões

e Fundo tenta minimizar

Uma segunda versão do comunicado, quase imediata, coloca os quatro Brics na categoria dos que indicaram que contribuirão, conforme discurso de Mantega e Lagarde em entrevistas. China e Rússia desaparecem do quadro de aportes, mas o valor do colchão anticrise é mantido em US$ 430 bilhões.

- Vocês verão que há um pequeno grupo, mas de países consideravelmente grandes, que estão participando, mas cujo valor (da contribuição) não foi especificado, porque ainda têm que comunicar a decisão em casa e então consolidar (o apoio). Esses países incluem Rússia, Índia, China e Brasil - disse Lagarde.

Segundo o FMI, a divulgação do primeiro comunicado "foi nada mais que um erro administrativo" e a primeira versão não estava finalizada. O Fundo não comentou, mas a explicação sugere que o texto foi negociado para que a versão final contivesse posição conjunta do Brics.

Lagarde cumprimentou os países que decidiram contribuir para a construção da "muralha ou guarda-chuva global" superior a US$ 430 bilhões, que praticamente dobra o poder de fogo do FMI, segundo ela:

- Este foi um esforço gigantesco, mas foi uma dinâmica de trabalho extraordinária nos últimos dias.

Ela agradeceu especialmente à zona do euro, que deu o aporte inicial de US$ 200 bilhões, e ao Japão, que seguiu o anúncio e comprometeu US$ 60 bilhões. Perguntada se estava decepcionada com o Brics, Lagarde sorriu e disse:

- Sabe de uma coisa? Um trilhão de dólares, nós conseguimos. Nós dissemos que queríamos e... - afirmou a diretora-gerente, em referência à combinação do reforço ao Fundo com a elevação dos fundos europeus de contenção, anunciada no fim de março.

Indagada se a contribuição do Brics, quando vier, não será tardia, Lagarde minimizou:

- Mas eles vão contribuir. Indicaram que vão participar.

Mantega garantiu que os quatro países concordaram em fazer aporte adicional ao FMI, mas vão definir os valores posteriormente, para aguardar avanços na reforma de cotas da instituição. A contribuição do Brics será anunciada, segundo ele, na reunião de chefes de Estado e governo do G-20, no México, em junho.

O ministro, que deu entrevista enquanto os comunicados eram divulgados, assegurou que o Brics está unido:

- Não foi uma reunião difícil - disse Mantega. - A posição do Brics, que foi unânime, foi a de apoiar o pacote de ajuda adicional ao Fundo Monetário. Porém, não divulgamos os valores que vamos colocar. Nós condicionamos esta ajuda a que eles completem as reformas de cotas para que nós, os países emergentes, tenhamos uma representação maior.

Ele disse que o objetivo começou a ser alcançado com a reafirmação, no comunicado final do G-20, de que "a distribuição de cotas deve refletir melhor o peso relativo dos membros do FMI na economia mundial, que mudou substancialmente tendo em vista o forte crescimento dos dinâmicos mercados emergentes e países em desenvolvimento".

A declaração dos ministros e presidentes de bancos centrais expressa compromisso com o encerramento da reforma atual, iniciada em 2010, até o encontro anual do FMI e do Banco Mundial, em outubro.