Título: Fôlego para a caderneta
Autor: Valente, Gabriela
Fonte: O Globo, 27/04/2012, Economia, p. 23

Após BC indicar juro abaixo de 9%, Caixa lança fundos populares e governo ganha tempo para rever ganho da poupança

BRASÍLIA

O Banco Central (BC) indicou ontem na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que os juros básicos da economia - a taxa Selic - podem cair ainda mais, rompendo o piso de 9% ao ano, sinalizado na reunião anterior. A Caixa Econômica Federal, por sua vez, anunciou um pacote com redução de taxas e lançamento de novos produtos para tornar seus fundos de investimento tão atraentes e populares quanto a caderneta de poupança. Com os dois movimentos, o governo ganha tempo e espaço para uma queda maior nos juros, sem a necessidade de mexer imediatamente na regra de rendimentos da poupança.

O pacote da Caixa tem como objetivo desestimular a fuga de recursos dos fundos de renda fixa - compostos basicamente por títulos federais - para a poupança, o que poderia prejudicar a rolagem da dívida pública. Os dois movimentos reforçam a determinação da presidente Dilma Rousseff de assegurar ao Brasil juros de primeiro mundo.

O próprio vice-presidente de Ativos de Teceiros da Caixa, Marcos Vasconcelos, afirmou que, com as novas taxas de administração e redução drástica no valor mínimo de aplicação no fundos - que pode ser de R$ 10 -, o banco manterá os fundos com boa rentabilidade, sem risco de migração para a caderneta, mesmo que a Selic fique entre 8% e 8,5% ao ano.

- O objetivo é tornar os fundos de investimentos tão populares quanto a poupança. Quando a Caixa reduz a aplicação inicial e consegue ter uma taxa de administração mais baixa, melhora a rentabilidade do cliente. Com as nossas taxas, a Selic pode chegar a um patamar entre 8% e 8,5% ao ano - disse Vasconcelos.

Cortes serão

feitos aos poucos

Entre as vantagens que tornam a poupança popular estão: a facilidade de investimento (não é preciso ter conta no banco), a remuneração garantida de Taxa Referencial mais 6% ao ano e a isenção de Imposto de Renda, além de não ter cobrança de taxa de administração, como nos fundos.

O governo teme mexer na poupança em um ano eleitoral. Por isso, alterações significativas na forma de remuneração, como atrelar o rendimento ao comportamento da Selic, estão sendo adiadas. Esta semana, a presidente Dilma Rousseff, inclusive, disse que questões como a mexida na caderneta seriam avaliadas "com muita calma e tranquilidade".

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, mantém o entendimento de que a Selic em 9% ou mesmo a 8,75% ao ano não resultaria em migração em massa dos fundos para a poupança.

Na ata, o Copom diz que a economia não retomou o crescimento da forma esperada e que a crise internacional pode se agravar ainda mais. No entanto, os diretores avisaram que os próximos cortes serão feitos aos poucos.

"Mesmo considerando que a recuperação da atividade vem ocorrendo mais lentamente do que se antecipava, o Copom entende que, dados os efeitos cumulativos e defasados das ações de política implementadas até o momento, qualquer movimento de flexibilização monetária adicional deve ser conduzido com parcimônia", diz o comunicado.

Segundo fontes de governo, a incerteza sobre quais serão os próximos passos da economia europeia é que balizou a decisão do Copom. O novo discurso das autoridades preocupado com o crescimento econômico deixou o comitê em alerta e à espera das medidas que serão tomadas. Dependendo do que será feito na Europa, o Banco Central decidirá se segue com os cortes.

Caixa cria fundos para a classe C

No pacote para fomentar os fundos de investimento, a Caixa criou duas modalidades voltadas para pequenos poupadores. Com apenas R$ 10, será possível aplicar num fundo de renda fixa, a uma taxa de administração de 1,3% ao ano ou num de renda variável, destinado à compra de ações de grandes empresas na Bolsa, ao custo de 1,6% ao ano.

- Isso é inédito. Nenhuma corretora aceita um valor mínimo de aplicação de R$ 10 - destacou Vasconcelos, acrescentando que os produtos estarão disponíveis a partir de hoje para todos os interessados, inclusive quem não é cliente da Caixa.

Além disso, a Caixa voltou a reduzir o custo dos fundos de investimentos existentes, como é o caso dos fundos DI. Num deles, a taxa caiu de 2% ao ano para 1,5% e , em outro, de 1,20% para 1% ao ano. O valor inicial da aplicação nessas duas modalidades também caiu 50%, de R$ 100 para R$ 50 e de R$ 5 mil para R$ 2,5 mil.

Em outros dois tipos de fundos, até então voltados para renda mais alta, o valor mínimo da aplicação, que era de R$ 2 mil e R$ 3 mil, caiu para R$ 50. Neste caso, a taxa de administração de 1,5% ao ano foi mantida.

Na última sexta-feira, o banco já tinha cortado a tarifa de administração de outros dois fundos, bem como o valor mínimo da aplicação. A expectativa da Caixa é captar mais de R$ 500 milhões com os novos fundos até o fim do ano.

A Caixa foi o primeiro banco a mostrar essa estratégia, uma vez que reduziu as taxas de seus fundos para ganhar competitividade. Os técnicos alertam, no entanto, que a instituição tem pouco peso no mercado de fundos e, portanto, outras instituições precisam seguir o mesmo caminho para que haja um equilíbrio de forças entre os diferentes tipos de investimento.